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Sinopse

Ally sempre deu mais atenção ao trabalho do que à própria vida. De volta à sua cidade Natal, ela conhece um sujeito que a faz repensar suas prioridades. E, mais adiante, Ally encontra alguém que a lembra de como era no passado.

Crítica

É curioso perceber como o andar do tempo – e a realidade das relações contemporâneas – pode se manifestar até mesmo nos mais pequenos detalhes. Até alguns anos atrás, era comum presenciar personagens masculinos galanteadores dispostos a tudo para conquistarem as mulheres dos seus sonhos, seja por uma noite ou por toda uma vida. Quando um longa como O Casamento do Meu Melhor Amigo (1997) foi lançado, há mais de duas décadas (quase três, na verdade), causou espanto presenciar uma protagonista feminina que invertia essa situação: era ela que tomava a iniciativa de ter para si o companheiro que acreditava desejar. Naquele filme, quando a personagem de Julia Roberts se dava conta que o plano de estragar as bodas de uma antiga paixão (Dermot Mulroney) com a atual noiva (Cameron Diaz) não era, necessariamente, garantia de tê-lo de volta, a solução para que não ficasse sozinha foi a entrada de um novo melhor amigo, no caso o rapaz gay vivido por Rupert Everett (que roubava o filme a cada aparição). Pois é nesse desfecho em que se encontra o diferencial desse sucesso dos anos 1990 com o recente Alguém que eu costumava conhecer, uma vez que, na maior parte do tempo, o novo se mostra não mais do que uma refilmagem claudicante do anterior.

O ator Dave Franco teve sua primeira experiência como realizador em um curta-metragem de apenas três minutos chamado Dream Girl (2013) que era estrelado por ele e pela colega Alison Brie. Sua estreia no comando de um longa, com o thriller Vigiados (2020), também contava com a atriz à frente do elenco. Não causa espanto que tamanha proximidade tenha resultado em algo oficial: os dois são casados desde 2017. E é na parceira de todas as horas que recai mais uma vez para guiar o espectador pelos desenlaces românticos vistos em Alguém que eu costumava conhecer. A diferença, no entanto, é que dessa vez a convidou para não apenas marcar presença em frente às câmeras, mas para participar também da concepção do projeto, atuando como co-roteirista – função que já havia desempenhado em Entre Realidades (2020) e Um Amor na Itália (2022). Isso não apenas garantiu uma maior fidelidade em relação às motivações femininas vistas na trama, como também espaço para que sua personagem pudesse se desenvolver além da mera conquista amorosa. Assim como Julianne Potter (uma das figuras definidoras da carreira de Roberts), Ally (Brie) continua trabalhando com gastronomia. Não mais como crítica de restaurantes (uma posição de poder, ainda que solitária), mas agora assumindo-se como produtora de programas televisivos (uma mudança pequena, mas ainda assim relevante, pois se mostra suscetível não apenas ao próprio gosto, mas principalmente aos humores da plateia – e aos números da audiência).

Tanto o reencontro dos ex-namorados (talvez nem isso, pois está mais para um flerte antigo que nunca deu certo) não está em primeiro plano que a “volta para casa” promovida por Ally se dá, num primeiro momento, por outros motivos – o show que comandava acabou de ter sua nova temporada cancelada, e sem saber qual o próximo passo a ser dado, decide ficar sob às asas da mãe – a quem não vê há alguns meses – até descobrir o que fazer. Se por um lado esse movimento cria uma expectativa nunca cumprida – a incrível Julie Hagerty (Apertem os cintos, o piloto sumiu, 1980) surge como essa figura materna apenas para intervenções pontuais, mostrando-se como a participação mais subestimada dentre todos os nomes reunidos – ao mesmo tempo permite a possibilidade dessa retomada de contato com aquele que sempre foi uma possibilidade, mas nunca algo concreto: Sean (Jay Ellis, sem muito o que fazer além de impor uma postura atraente, o que torna mais difícil entender o porquê dos dois nunca terem ficado juntos antes), o rapaz que conhece desde quando eram jovens. A atração entre eles é evidente. Porém, há um problema: timing. Se anos antes ela o deixou para buscar uma vida profissional longe dali, agora é ele que se mostra indisponível por estar noivo e prestes a se casar com Cassidy (Kiersey Clemons, de O Mistério da Ilha, 2019).

Uma vez que esse cenário está montado, os passos seguintes serão bastante previsíveis, ainda mais para os familiarizados com o gênero – e com os títulos que se mostram referências decisivas por aqui. Enquanto Ally estará ocupada em tentar desfazer o romance entre Sean e Cassidy, dois elementos se mostrarão impositivos para uma mudança de rumo. Primeiro, ela estará sozinha nessa jornada: ao invés de contar com um parceiro de artimanhas (como Everett era para Roberts), o melhor amigo da vez (papel de Danny Pudi, promovendo uma mini-reunião Community, 2009-2015), deixa claro desde o princípio o quão errada ela está e que não irá apoiá-la nessas intenções. Essa postura sólida dele é suficiente para provocar o espectador: afinal, quem está certo? Com quem criar empatia? O que esperar dela, enfim? Estes questionamentos levam a uma outra conclusão: ao se ocupar deste antigo crush, ela acaba deixando de lado o que a levou até sua cidade-natal: reorganizar sua vida profissional. Se reencontrar, portanto, deve ser a prioridade, e este é o caminho que deve buscar por conta própria.

Assim que isso fica claro não apenas a quem acompanha o filme, mas a ela mesma, o título Alguém que eu costumava conhecer ganha, finalmente, sentido. Perdida de si, precisa mais uma vez elencar uma ordem de ações a cumprir, focada em deixar para trás esse momento de confusão – não apenas quanto ao trabalho, mas também íntimo – para que consiga se permitir compartilhar esse momento com outro (seja Sean ou não). Quase como uma releitura moderna, portanto, de uma comédia romântica que chegou a marcar uma geração, essa não é uma obra que deverá deixar sua marca no cenário cultural como sua antecessora, mas de forma alguma tal percepção deve indicar uma condição de descartabilidade. Há um interessante discurso em cena, não apenas feminista, mas, acima de tudo, de autoestima e amor-próprio. Poderia facilmente recair em um blábláblá genérico de autoajuda repleto de clichês, mas está na condução segura de Franco (pelo jeito, se mostrando um cineasta mais hábil do que enquanto intérprete), na performance delicada de Brie (dona de um carisma insuspeito e digno de atenção) e nas soluções apresentadas sem pressa ou didatismo que o conjunto se mostra eficiente em validar sua proposta.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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Grade crítica

CríticoNota
Robledo Milani
6
Maria Caú
5
MÉDIA
5.5

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