Crítica
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Sinopse
Peter e Alice deixaram sua imaginação correr solta num veraneio antes do País das Maravilhas e da viagem à Terra do Nunca. Uma tragédia modifica a família e os dois embarcam numa aventura fantástica e desafiadora.
Crítica
Ainda que inusitada, é impossível afirmar que a ideia não desperte curiosidade – por mais que essa seja passageira. Afinal, em uma realidade como a atual, na qual crossovers e universos compartilhados parecem ser a ordem da vez no entretenimento voltado às massas (cinema, literatura, histórias em quadrinhos), como seria se dois dos maiores clássicos da fantasia não apenas se encontrassem, mas fossem irmãos, tendo sido criados na mesma casa? Quais seriam as experiências, os traumas e as vivências que teriam atravessado lado a lado, suficientes para gerarem mundos fantásticos e figuras insuspeitas? Pois é mais ou menos o que propõe Alice e Peter: Onde Nascem os Sonhos, que, como o título em português já adianta – o original é apenas Come Away, ou seja, algo como Vem Embora, ou similar – exerce um olhar sobre as infâncias dos irmãos Alice e Peter, que não apenas dariam origem, mas seriam, eles próprios, a menina que visitaria o País das Maravilhas e o garoto que acabaria na Terra do Nunca. Com uma proposta como essa, que de imediato joga as expectativas às alturas, não é de se surpreender, portanto, que o resultado seja apenas morno – longe de um desastre, mas, ainda assim, aquém do potencial anunciado.
Os problemas talvez tenham começado a partir dos talentos envolvidos. Esse é o primeiro projeto em live action da diretora Brenda Chapman, conhecida até então pelo seu envolvimento nas animações O Príncipe do Egito (1998) e Valente (2012) – pelo último, foi premiada com o Oscar. Ao desbravar esse novo campo de possibilidades, ao invés de se aliar a uma roteirista experiente, optou por adaptar o texto da estreante Marissa Kate Goodhill – bastante audaciosa para quem está apenas começando na área. Além disso, nomes como Angelina Jolie, David Oyelowo e Michael Caine no elenco certamente são mais do que suficientes para garantirem um mínimo de atenção. Porém, estes são meros coadjuvantes, se tanto – Caine estaria mais para uma participação especial. O foco das realizadoras está nas crianças vividas por Jordan Nash (Aladdin, 2019), como Peter, e Keira Chansa (Os Irregulares de Baker Street, 2021), no papel de Alice. Filhos do casal formado por Jack (Oyelowo) e Rose (Jolie), serão as histórias que cuidarão de acumular quando suas maiores preocupações deveriam ser apenas as próximas brincadeiras a fonte para os lugares onde acabarão se refugiando.
Ao desperdiçar as presenças de atores consagrados e voltar seu olhar quase que inteiramente às crianças, seria de se esperar, portanto, que ao menos o conjunto oferecesse os artifícios necessários para tornar tal passeio mais lúdico, como a combinação de efeitos visuais envolventes, uma trilha sonora que soubesse os momentos certos para apelar à emoção e uma direção de arte que servisse de estímulo à imaginação. Porém, não é bem esse o cenário com o qual o espectador irá se deparar. Alice e Peter sofrem pela perda do irmão mais velho, vítima de um tolo acidente. Com a morte do primogênito, os adultos reagem cada um à sua maneira: o pai volta ao jogo, colocando o próprio destino da família em risco, enquanto a mãe mergulha numa lamúria interna, abrindo pouco espaço para os demais. Restam aos pequenos, portanto, assumir as rédeas da situação. Decisões que só aumentarão o ciclo de equívocos que parece se abater sobre os Littleton.
Se por um lado a estrutura se apoia em demasia ao conjunto provocado por causa e efeito – ou seja, cada ação empreendida parece ser apenas resultado de um ato exposto imediatamente antes – fazendo dessa lógica não apenas previsível, mas também maçante, há ainda um psicologismo raso, que tenta investigar sem muito ânimo ou esforço os efeitos de cada um desses episódios, como se peças de um quebra-cabeças que teria como objetivo apenas se encaixar nas já conhecidas histórias de Alice no País das Maravilhas e Peter Pan. Não basta, por exemplo, a menina ter um coelho de pelúcia – o mesmo precisa ter um tique-taque do relógio por perto. Ou além de um jacaré de madeira em tamanho natural na parede, esse ainda tem que ganhar vida e se mexer como num sonho após a passagem dos personagens. A intenção está mais voltada a agradar aos fãs das duas fábulas do que oferecer uma abordagem original sobre as mesmas, como se a magia estivesse nos elementos, e não na conjunção desses.
David Oyelowo mantém sua postura segura habitual, enquanto Jolie parece mais à vontade quando abraça a fantasia – como nas suas incorporações da Rainha de Copas ou da Rainha Branca – do que como a esposa submissa e cordata. Assim, fica fácil para Anna Chancellor (Quatro Casamentos e um Funeral, 1994) roubar a cena a cada aparição como a tia “malvada” e dissimulada. E se nem mesmo as crianças parecem estar à vontade como o que lhes é exigido – soam mais engessadas do que como parte de um mistério em formação – o destino que lhes é designado termina por se apresentar de forma quase arbitrária. É bonito quando o real e o imaginário se confundem, embaralhando os limites de um e de outro, mas para que isso aconteça com efeito são necessárias uma condução habilidosa e uma certeza do que se almeja alcançar. Dois requisitos escassos em Alice e Peter: Onde Nascem os Sonhos, filme que promete mais do que lhe compete por acreditar estar com o jogo ganho ainda antes do primeiro passo. E é justamente essa pretensão mal planejada a garantia das eventuais frustrações aqui reunidas.
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