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Sinopse

A francesa Alice Guy-Blaché foi uma pioneira sem igual no cinema. Inventora da ficção na Sétima Arte, ela foi brutalmente sendo apagada da História ao longo dos anos.

Crítica

Há uma compreensível afobação permeando Alice Guy-Blaché: A História Não Contada da Primeira Cineasta do Mundo. Afinal de contas, existe urgência nas coisas a serem ditas sobre essa pioneira do cinema sistematicamente excluída ao longo da construção dos enunciados historiográficos competentes à Sétima Arte. Partindo de uma genealogia simples, mas que dá conta de apresentar as circunstâncias motivadoras à francesa Alice Guy estudar estenografia e candidatar-se a um emprego na Gaumont, a cineasta Pamela B. Green faz um longa-metragem que frequentemente acaba dividido entre a personagem e o processo arqueológico como seu objeto principal de estudo. Na tentativa de entremear tais possibilidades, às vezes acaba se passando inadvertidamente por cima de determinadas potencialidades, reduzindo singularidades em prol do resgate e de parte do processo deste. Os pontos de abordagem são vários. Poderia se fazer um filme somente sobre a trajetória brilhante de Alice. Também seria perfeitamente cabível um apenas acerca da investigação. Igualmente seria possível estudar o apagamento dessa figura recuperada. A cineasta tenta um pouco de tudo.

Portanto, Alice Guy-Blaché: A História Não Contada da Primeira Cineasta do Mundo comporta, ao menos, três exemplares acontecendo simultaneamente. Essa interlocução é eventualmente poderosa, mas ocasionalmente descamba ao meramente burocrático, pois solapada pela necessidade autoimposta de abrangência que sabota potenciais enormes. Todavia, o saldo é positivo, principalmente se levado em consideração como engrenagem dos esforços necessários para atribuir a Alice Guy-Blaché o lugar na História que lhe é devido. Diretora do primeiro filme ficcional dessa novidade surgida em meio à disputa de empresários numa nova era de equipamentos fotográficos – A Fada do Repolho (1896) –, ela foi fundamental ao rápido desenvolvimento da traquitana como geradora de discurso. Pamela B. Green lança luz sobre vanguardas por ela assinadas, como experimentos sonoros, colorização, utilização de temas controversos no início do século passado e a atuação como dirigente de estúdio. Proeminência artística e nos negócios.

No que diz respeito ao percurso histórico, Alice Guy-Blaché: A História Não Contada da Primeira Cineasta do Mundo cria uma linha do tempo eficiente ao ponto de permitir o entendimento dessa vida marcada por ímpetos inovadores e finalizada em meio à luta para ter seu nome reconhecido com o apropriado destaque. Diversas personalidades e estudiosos dão pequenos depoimentos sobre Alice Guy-Blaché, demonstrando espanto pela ignorância quanto a ela e/ou louvando feitos. Pode-se dizer que nessa estrutura adotada tais testemunhos são simples ilustrações, indícios que desempenham uma função mais curiosa do que qualquer outra coisa. No que tange à investigação empreendida pela própria Pamela, ela ganha contornos de expedição excitante em momentos parciais, como quando fitas de formato atualmente descontinuado são resgatadas do limbo para inserir uma nova peça nesse quebra-cabeça cuja imagem é uma jornada despedaçada ao longo do tempo. Todavia, é frágil o encaixe do empenho dentro de uma perspectiva de descobertas passadas e presentes.

Já quanto ao entendimento desse apagamento sofrido por Alice Guy-Blaché, Pamela B. Green sofre para dar conta dos meandros, comprimindo complexidades em sinalizações superficiais. Porém, ainda assim suas colocações são suficientes ao entendimento de uma operação orientada pelo gênero daquela que contribuiu enormemente para o cinema se tornar uma arte com múltiplas facetas e nuances. Em Alice Guy-Blaché: A História Não Contada da Primeira Cineasta do Mundo observa-se rapidamente a atribuição de filmes a assistentes e operadores de câmera, a negligência do nome de Alice em livros supostamente relevadores e as dificuldades para reconduzir a francesa ao posto que lhe é de direito. A ansiedade apaixonada de Pamela B. Green é perfeitamente justificável porque realmente é para ontem conferir a Alice o que compete a ela. E o filme tem o mérito de, ao menos, colocar em pratos limpos esse legado que ainda hoje encontra resistências para ser iluminado, isto exatamente pelos motivos que obliteraram os merecidos holofotes dessa gigante.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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