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Crítica


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Sinopse

Um mergulho apaixonado na música regional da Amazônia, especialmente a característica do Pará, através das histórias dos músicos tradicionais da região – responsáveis pelo Boi Bumbá e por ritmos tradicionais das localidades, por exemplo – e a invasão da tecnologia que, recentemente, possibilitou o desenvolvimento de novos gêneros, como o tecnobrega.

Crítica

A missão de apresentar sonoridades características da beira do rio Amazonas é cumprida em Amazônia Groove. O documentário começa com um belíssimo plano-sequência, por meio do qual se percebe a relação umbilical entre a musicalidade da região e o fluxo que começa com outro nome no Peru e vai desembocar, já em solo brasileiro, na vastidão do mar. A câmera perscruta o espaço como que na tentativa de desvendar seus insondáveis segredos, reverentemente, isso até encontrar a procissão de fé embalada pelas cantigas de louvor à santa. Aliás, a religiosidade é acessada em outros fragmentos pelo cineasta Bruno Murtinho, compreendida como elemento indiscernível da engenhosidade de alguns compositores, em casos bastante específicos. Há, também, a perceptível busca pela beleza que emana da rica paisagem, num itinerário audiovisual caracterizado pela celebração. Todavia, apesar das qualidades, o retrato soa desconjuntado ocasionalmente.

Amazônia Groove se detém na musicalidade do Pará, deflagrando a heterogeneidade sonora ao mostrar casos completamente diferentes, como os sujeitos que compõem a partir dos cânticos de pássaros locais, fazendo assim da natureza uma fonte vital, e o rapaz que representa a vertente technobrega, verdadeiro sucesso nas noites paraenses. As particularidades dos testemunhos são conservadas, mas o que deles se pretende extrair é a contribuição para uma imagem ampla, repleta de distinções e similitudes. Personagens falam acerca das influências estrangeiras, da pegada espanhola, das canções norte-americanas legadas pelos militares que cá estiveram durante a Segunda Guerra Mundial, da contribuição dos povos africanos para as batidas locais, mas sem muita profundidade, com privilégio a cenas curtas e exibições de virtuosismo. O documentário passa de uma linha a outra tentando garantir-lhes as peculiaridades, mas mantendo-as insuficientemente interligadas.

Amazônia Groove, a despeito da sucessão de motes que eventualmente assume caráter de sobreposição, gera uma cartografia rica das harmonias que se entrelaçam no Pará, seja na capital, Belém, ou nos territórios vizinhos, dos quais se intenta colher, inclusive, a ancestralidade. As toadas marajoaras, desse modo, rimam insuspeitamente com as canções claramente bregas de uma artista orgulhosa da venda de CD’s no famoso mercado Ver-o-Peso. Bruno Murtinho vai entrelaçando tendências e variáveis, criando um mosaico de sons, sem com isso descuidar do dado puramente visual. Contudo, seus enquadramentos, às vezes, se aproximam com demasia de uma ideia puramente cosmético-turística. Uma das exceções é a supracitada tomada de abertura que, despida de vaidades, conjuga como poucas subsequentes os temas em jogo. Outro dado frequente é a aceitação da música local em solo estrangeiro, com artistas citando turnês de sucesso lá fora.

O realizador pega emprestado o carisma de figuras como Dona Onete além de cerzir famosos e anônimos. Questões frequentes, tais como a interferência do rio Amazonas na criatividade de homens e mulheres, então inspirados pelo ritmo incessante das águas que adiante encontram o mar, não são tão bem aproveitadas em Amazônia Groove, senão como apontamentos recorrentes, mas não estendidos a boa parte da amostragem. Exaltando a mística amazonense, mas geralmente restringindo seu foco ao Pará e às suas idiossincrasias (e elas são muitas), Bruno Murtinho tem à disposição nomes de peso, com os quais efetua uma bonita operação que mescla memória afetiva e virtude musical, demonstrando com isso a transcendência dos acordes oriundos das tradições por ali vigentes. Nesse sentido, é bem-vinda a orgulhosa a mirada desvelando talentos que guardam em seus âmagos o elo profundo com a Amazônia, ainda que nem sempre a estrutura dê conta dos relevos.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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