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Crítica


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Onde Assistir

Sinopse

Uma caça-talentos paulistana recruta um diretor de arte de Salvador para um emprego em São Paulo. O que começa como amizade rapidamente se torna um acordo de sexo sem compromisso.

Crítica

Sem qualquer tipo de alarde, o streaming Max simplesmente disponibilizou em seu catálogo a comédia romântica brasileira Amigos Sem Compromisso. Remake do hollywoodiano Amizade Colorida (2011), ele certamente não é o tipo de produção capaz de marcar gerações. O seu principal mérito é ser um “feijão com arroz” bem temperadinho. Trata-se de um equivalente daquela comidinha caseira que não excitaria o paladar dos chefs e gourmets mais exigentes do mundo, mas à qual sempre é possível voltar em busca de um sabor conhecido e confortável. Os protagonistas são Julia (Maria Bopp) e Daniel (Ícaro Silva), dois solteiros convictos com dificuldades para manter relacionamentos sérios. Aliás, no começo da história ambos levam foras simultaneamente. Uma coincidência meio quadrada demais, encarregada de dar a entender que os protagonistas, agora livres, têm tudo para ficar juntos no fim das contas. O cineasta Rafael Gomes não tenta subverter a ordem das comédias românticas ou mesmo surpreender a plateia com algum gesto menos presumível. Aparentemente, ele se contenta em reproduzir de maneira meio óbvia tudo o que esperamos de uma história dessas: a aproximação inicial, a sugestão de sexo sem compromisso, sentimentos complicando tudo e o encerramento feliz. Mas, a despeito dessa previsibilidade, o filme não chega a comprometer como adaptação.

Julia é responsável por seduzir Daniel para ele trocar os cenários paradisíacos da Bahia pelo charme cinzento da cidade de São Paulo. Apesar dos contrastes de origem, os protagonistas são muito mais parecidos do que poderiam imaginar, principalmente nesse sentido de terem severas dificuldades para assumir namoros e afins. Rafael desenha bem a curva de evolução do relacionamento entre eles, partindo da amizade repleta de sintonias (resumida por meio de um clipe com diversos instantes deles sendo uma companhia valiosa ao outro), passando pelo acordo visando a diminuição da carência sexual de ambos até eles estarem, como era de se esperar, envolvidos emocionalmente. Julia é uma executiva de passado familiar borrado. O fato de que ela nunca teve a família ortodoxa, e sequer sabe ao certo a identidade do pai, é atribuído à porralouquice da mãe interpretada por Gisele Fróes. Já Daniel é filho de um grande precursor do design. Seguidor dos passos do pai, ele tem uma conexão harmoniosa com a irmã e o homem doente de quem puxou a vocação profissional. O roteiro utiliza uma psicologia muito rasa para explicar de maneira esquemática os motivos da aversão de Julia e Daniel aos relacionamentos. Ela busca uma figura paterna nos candidatos a namorado. Ele foge da responsabilidade para evitar o abandono do qual seu pai foi vítima. E essa bagagem afetiva é tratada com certa leveza.

Amigos Sem Compromisso falha ao tentar agregar coadjuvantes interessantes. Da parte de Daniel, o colega gay vivido por Tuca Andrada serve apenas para apontar os tais “tempos atuais” de relacionamentos e sexualidade fluida. No entanto, nada que seja realmente importante. Da parte de Julia, a mãe irresponsável serve somente como exemplo de comportamento negativo e trapalhadas afetivas às quais escapar o mais rápido possível. Assim como não há profundidade nos protagonistas que reproduzem diversos clichês das comédias românticas, esses personagens secundários existem estritamente para trazer determinados assuntos à tona. Um dos grandes méritos do filme é conseguir nos fazer torcer pelo encerramento feliz, resultado obtido pela construção das afinidades prévias entre Daniel e Julia. Como não está tratando da crueza dos amores, de como a realidade nem sempre opera de acordo com os contos de fadas, Rafael Gomes se permite passar por cima dos marcadores mais realistas e nadar de braçada nos lugares-comuns dos filmes açucarados hollywoodianos aos quais fomos acostumados a assistir desde sempre. Nesse sentido, a ruptura tem pouca relevância, especialmente porque sabemos que ela existe no filme fundamentalmente para dar razão à máxima “depois da tempestade vem a bonança”. Portanto, o conflito e a crise são como as últimas provações que legitimam o amor.

É realmente de se estranhar que Amigos Sem Compromisso não tenha ganhado um espacinho nas salas de cinema e sequer estreado com algum barulho no streaming. Semanalmente, filmes (brasileiros e estrangeiros) com menos qualidades têm a visibilidade que esse remake comandado por Rafael Gomes não ganhou. Coisas de um mercado maluco se reconfigurando à medida que surgem novas demandas e tendências. Sobre as interpretações, Maria Bopp demora um pouco a entrar na personagem, parecendo levemente desconfortável quando é necessário expressar uma fragilidade emocional importante à personalidade desconfiada de Julia. Já Ícaro Silva está um pouco mais solto e à vontade na pele do soteropolitano que escapa da doença paterna e das histórias de abandono materno para começar uma rotina nova na capital economicamente mais efervescente do Brasil. Sem se aprofundar muito na vida profissional dos protagonistas, o realizador parece absolutamente contente em garantir que essa história de amores e desamores cumpra bem os protocolos principais das comédias românticas, ou seja, que mocinhos e mocinhas relutantes estejam obviamente destinados a ficarem juntos. Com a expectativa adequada, a de que veremos uma história batida sem espaços para surpresas, é possível tirar proveito dos 110 minutos em que o homem e a mulher são arrastados pela paixão.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
6
Carissa Vieira
3
MÉDIA
4.5

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