Crítica
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Sinopse
Georges e Anne formam há anos um casal apaixonado por arte. Mesmo quando um deles começa a dar sinais violentos de declínio físico, o amor permanece. A enfermidade afeta a forma como ambos se relacionam com a filha.
Crítica
Há quem ame e quem odeie na mesma proporção o cinema de Michael Haneke. Personagens pétreos, hipocrisia social, o fóbico homem contemporâneo e a rigidez nos enquadramentos, são algumas das constantes que sintetizam uma visão genuinamente autoral. De toda forma, é importante constatar: seus filmes não permitem apatia, pois ocasionam movimentos que convidam o expectador ao deslocamento de ideias. Por isso já valem, mesmo que deles não se goste. O mais recente desses exemplares é Amor, sua segunda Palma de Ouro no prestigiado Festival de Cannes (a primeira foi A Fita Branca, 2009).
Tudo começa com a invasão policial a um apartamento, onde os homens da lei encontram uma mulher em estado de decomposição. O tempo volta, e então somos convidados a partilhar a situação extremamente dolorosa vivida pelo casal Georges e Annes, quando ela adoece e tem a saúde complicada ainda mais após cirurgia malsucedida e dois acidentes vasculares cerebrais. Das pequenas adaptações iniciais à crescente presença velada da morte, os octogenários se viram como podem. Imbuído do que parece sentimento incondicional, Georges refaz a vida em função da amada cujos dias resumem-se a cuidados.
Há de se esperar lágrimas e mais lágrimas no desenrolar da trama, afinal não é apenas a falência do corpo (a ela) e a iminente perda do amor (a ele) que se anunciam, e sim a própria finitude, lenta e sorrateira. Todavia, Haneke conduz tudo com muita sobriedade, longe de rompantes chorosos e contendo níveis emocionais. Mesmo na interação com a filha (Isabelle Huppert, em participação especial), Georges transmite serenidade. Homem de artes – gosta de música e livros – ele entende seu papel de amortizar ligeiramente a frustração constante da esposa e para isso se precisa forte. Aliás, em Amor, os intérpretes principais, Jean-Louis Trintignant e Emmanuelle Riva, surgem co-autores de um trabalho muito dependente deles.
Pela primeira vez, Haneke volta lentes a algo mais privado que público. Seus filmes anteriores partiam de situações pontuais para sublinhar criticamente conjunturas maiores, complicações morais e éticas impostas ao homem pela coletividade. O toque hanekeniano confere agudeza idiossincrática a essas narrativas contestadoras, mas não parece moldar-se sem pequenos solavancos a trajetórias, como a de Amor, que clamam por pulsação íntima e pessoal. O cartesianismo usual do diretor acaba quase comprimindo aspectos humanos que, por paradoxo, são relevados nas brilhantes atuações de Trintignant e Riva. Sendo assim, Amor é bonito à sua medida e duro de modo bastante particular, ainda que paire sobre ele certa fleuma.
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