Crítica
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Sinopse
Já adulto, Hugo lembra dos tempos de menino, especialmente o ano de 1937, quando saiu de Santa Catarina e desembarcou em São Paulo para reencontrar a mãe. Ela vive num bordel de luxo, atendendo principalmente homens influentes da política paulistana. Hugo passa a conhecer melhor a mãe enquanto desperta para a vida sexual.
Crítica
Percorrer novamente os cômodos, agora vazios, da mansão onde muitos anos antes reencontrara a mãe traz uma torrente de lembranças para Hugo (Wálter Forster). O protagonista de Amor Estranho Amor rememora os dias em que teve a inocência confrontada, entre outras coisas, pela sexualidade pulsante das colegas prostitutas de sua genitora. Essa presença pueril causa desiquilíbrio na rotina das mulheres encarregadas de satisfazer as vontades de figurões do cenário sócio-político brasileiro. De início, podem parecer exageradas as constantes manifestações de excitação delas pelo menino franzino, amedrontado, que anseia finalmente permanecer ao lado de quem o botou no mundo. Contudo, isso se esclarece na bela cena em que uma das jovens tenta seduzir Hugo (Marcelo Ribeiro) com sua nudez escultural, mencionando a frequência naquele lugar de gente torpe, como se buscasse desesperadamente na pureza do garoto algo que ela própria perdeu durante o caminho.
Amor Estranho Amor se passa em 1937, mais especificamente às vésperas do golpe dado por Getúlio Vargas, cujo resultado foi o cancelamento das eleições e a instituição do chamado Estado Novo. Esse contexto histórico é imprescindível ao filme. Dr. Osmar (Tarcísio Meira), aspirante a cargos públicos, além de mantenedor do bordel de luxo que marcou o passado do protagonista, é amante da mãe dele, Anna (Vera Fischer). O choque da ingenuidade de Hugo com o entorno hipersexualizado precede o evento que, de certa maneira, abriu caminho para o famigerado golpe civil-militar de 1964. No entanto, a ausência de sinais de trauma ou de sofrimento no semblante do senhor que no presente perscruta saudosamente os espaços da infância enfraquece possíveis correspondências mais íntimas entre a singularidade de sua experiência e a turbulência que sobreveio àqueles instantes cercados de tensão. Nem por isso, sob a ótica de Khouri, deixa de ser significativa a simultaneidade dessas transformações.
O cineasta constrói exemplarmente uma atmosfera instaurada no limiar entre a realidade e as possíveis distorções provocadas pela inconstância da memória. A presença de Tamara (Xuxa Meneghel), ninfeta preparada para agradar a um influente político, interpretado por Mauro Mendonça, com quem Dr. Osmar planeja aliança, surge como o principal indício dessa fronteira. Ela é uma espécie de versão mais jovem de Anna, traço pelo qual, inclusive, chama a atenção do menino receoso diante das demais que o querem. Xuxa – pública a notoriamente contrária à disseminação deste filme – compõe bem a personagem, fazendo dela um dos pilares da trama, em virtude de sua força alegórica, por carregar no corpo devidamente escrutinado pela câmera contemplativa de Khouri o poder de desestabilizar, de despertar sentimentos tais como a cobiça e a inveja. De simples peça descartável num jogo partidário, ela adquire papel de mediadora, até mesmo da complexa relação mãe e filho.
Constante em Amor Estranho Amor, um dos fantasmas com que o Hugo adulto se depara nessa arqueologia emocional, o incesto se apresenta enquanto impulso na sequência que mostra o menino mirando com desejo o banho da mãe, logo após descartar os avanços de uma beldade nua. A futura consumação, responsável por deflagrar o tabu, tampouco parece psicologicamente dolorosa ao protagonista que “encara” retrospectivamente o episódio com um sorriso terno no rosto. Walter Hugo Khouri não persegue reações óbvias às ações, por mais controversas que elas possam ser. A bela trilha sonora de Rógério Duprat ajuda na evocação dos anos 30, emoldurando sensivelmente com canções românticas a ciranda marcada pela pungência do sexo, instaurando, assim, um paradoxo dramaticamente expressivo. Infelizmente pouco visto, este longa-metragem merecia ser lembrado menos pela interdição da “arrependida” Xuxa, e mais por seus méritos cinematográficos.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 8 |
Filipe Pereira | 7 |
Francisco Carbone | 7 |
MÉDIA | 7.3 |
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