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Sinopse

Antonia Brico se tornou na primeira mulher a conduzir uma orquestra em Nova Iorque, nos anos 1930. Embora ninguém acreditasse que era possível, ela não descansou até virar maestrina.

Crítica

Ocupar as telas de cinema – ou de televisores, computadores, smartphones, tablets... enfim, através do audiovisual – com trajetórias ilustres é um dos recursos mais empregados por cineastas ao redor do mundo, e no que tange a essa questão, Antônia: Uma Sinfonia não possui absolutamente nada de novo a apresentar ao seu espectador. A questão importante aqui, no entanto, nem é tanto a “história real”, e, sim, o “baseado em”. Afinal, o longa escrito e dirigido por Maria Peters – produtora, roteirista e diretora com extensa carreira na Holanda – é muito mais uma alegoria a respeito da vida e dos feitos alcançados por Antonia Brico do que uma narrativa fiel a esses acontecimentos. Essa postura, ao mesmo tempo em que liberta a trama de um escrutínio mais detalhado por parte da audiência, também acaba por inevitavelmente empobrecer o relato, confirmando-o como uma ficção sem aprofundamento histórico. Ou quase isso.

Para quem desconhece sua história, uma rápida visita à Wikipedia revela que Antonia Brico se tornou reconhecida por ter sido uma das primeiras mulheres a ocupar a posição de regente em uma orquestra, papel tradicionalmente visado pelos homens. Se os fatos dela ter sido adotada pelos pais e que, com eles, migrou ainda criança de Roterdã para os Estados Unidos são mantidos como tais na fábula contada por Peters, pouco mais se mantém tal qual aconteceu na realidade. Sabe-se que ela foi morar primeiro na Califórnia, e após se formar na Oakland Technical High School, em Oakland, já possuía experiência como pianista e como maestra. Foi seu talento, notório também no outro lado do Atlântico, que a levou a ser chamada para uma bolsa na Escola Estatal de Música e Belas Artes de Berlim, o que lhe possibilitou estrear como regente profissional na Orquestra Filarmônica de Berlim. Coberta de aplausos do público e da crítica, foi convidada a conduzir apresentações em Detroit e em Washington, entre outros lugares, até ser nomeada condutora da Orquestra Sinfônica das Mulheres, que anos depois se chamaria Orquestra Sinfônica Brico.

É fato que quebrou muitas barreiras. Foi a primeira mulher norte-americana a se formar com uma master class em regência, sua orquestra completamente feminina era inédita até então e foi também a primeira mulher a conduzir a Orquestra Filarmônica de Nova Iorque. Dona de tantos feitos, certamente é uma personalidade atraente ao olhar cinematográfico, ainda mais por ter origem holandesa e se tratar de uma produção realizada em seu país de origem. No entanto, a cineasta não consegue evitar uma tendência em dramatizar ao excesso a jornada da biografada, e, com isso, afastando a personagem do roteiro percorrido por aquela que trilhou o mesmo caminho na vida real. Enquanto que Antonia Brico rompeu resistências e acumulou méritos por onde passou, tendo sido aclamada até morrer, aos 87 anos – e assim segue, até hoje – em Antonia: Uma Sinfonia tudo parece se resumir a um melodrama executado com tintas pesadas, constantemente reduzido a questões banais, como a determinação da protagonista contra o lugar que uma mulher supostamente deveria se encaixar há cerca de um século, seja no âmbito familiar, seja ao lado do homem que a ama – e que ela deveria corresponder, supostamente.

Três pessoas reforçam essas características. A primeira, a mãe adotiva, interpretada por Annet Malherbe (A Acusada, 2014), é a que mais sofre ao tentar defender uma figura unidimensional, cujas verdadeiras intenções nunca ficam realmente claras. A maldade com que trata a filha e o desprezo que demonstra diante de suas conquistas transitam entre a inveja e o puro rancor, sentimentos que não encontram eco nos laços que teriam unido as duas tantos anos antes. Robin Jones (Scott Turner Schofield, que atuou como consultor da série Euphoria, 2019), por sua vez, é a melhor das surpresas, encontrando sintonia entre intérprete e personagem em uma personalidade silenciosa, porém de atuação determinante. Será ele aquele que irá estender a mão para dar uma chance à Antonia, o que termina por fazer a diferença na vida da musicista. Por fim, Frank Thomsen (Benjamin Wainwright, de Além das Palavras, 2016) surge como o homem que poderia ser tanto a salvação da mulher como a perdição de um talento que só poderia aflorar em liberdade. Um clichê sustentado pela maior parte da narrativa, até ser descartado em um movimento curioso, ainda que não à altura das expectativas.

Ao evitar um desfecho romântico choroso, por mais que se aproxime desse contexto, Maria Peters revela nesse esforço final uma mudança de curva já tarde demais, após quase duas horas – ao todo, o filme tem mais de 135 minutos, o que é um exagero – de uma novela bonita em tese, mas pesada demais para alcançar o reconhecimento que merecia. Resta, por fim, o notável desempenho de Christanne de Bruijn, uma novata que se sai acima da média nessa que é sua estreia como protagonista. É ela que carrega a determinação e o comprometimento que, imagina-se, tenha sido necessário para Antonia Brico se tornar um nome a ser lembrado. Uma postura firme e decidida que, infelizmente, não encontra ressonância em Antonia: Uma Sinfonia, uma obra bonita de se ver, mas fácil de ser esquecida.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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