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Sinopse

Unté é um jovem que faz parte da resistência à ocupação soviética em 1949, quando a Segunda Guerra já acabou. Bem na idade em que tem grande descobertas, ele precisa lutar efetivamente num front que o faz perder a inocência.

Crítica

A guerra já acabou. Mas a paz está longe de ocupar seu lugar devido. Os tempos continuam turbulentos e instáveis. É este cenário que Unté encontra ao retornar para casa. Ele tem no pai a fonte das maiores incertezas. O homem sério e austero, dono de voz forte e gestos largos, nem mesmo ligado a ele por sangue pode dizer que é. O rapaz sabe disso, assim como tem consciência que insistir em ir atrás da verdade a seu próprio respeito não é algo fácil, não para ele, que precisa fazer as perguntas na hora e no momento certo, e muito menos para os que ouvirão suas indagações. É assim, entre o correto e o duvidoso, o dia e a noite, a direita e a esquerda, o correr e fugir ou ficar e enfrentar que se situa Ao Entardecer, filme que parte de pressupostos conhecidos, mas ganha muito da sua força tanto pela ambientação precisa que opta por estabelecer sua trama, como também pelo cuidado rígido que revela mais no que esconde do que naquilo que se verifica às claras.

Sharunas Bartas, que além da direção assina também o roteiro de Ao Entardecer, não é nenhum novato. Dono de uma carreira cujo início data dos anos 1980, já atuou como ator, compositor, fotógrafo e produtor. Porém, aqui, restringe-se à ação verificada nos bastidores, conduzindo uma história repleta de ressentimentos há muito entalados e angústias que esperam silenciosamente pelo momento de poderem, enfim, se fazerem ouvir. Unté, interpretado com uma aparente apatia – que esconde, na verdade, uma dissimulação à espreita por mudança – pelo novato Marius Povilas Elijas Martynenko, é o retrato da nação, um país que não sabe se fica ou se vai, se acorda ou segue dormindo, se assume seus erros ou finge que nada aconteceu. Ele surge quieto, com uma ou outra pergunta pontual, apenas na espera para agir. Precisa falar, mas tem medo das reações que pode causar. Sabe que ficar parado não é mais uma opção, mas também é incerto quanto ao impacto que pode ou não gerar.

Muito disso estará nessa estranha configuração familiar que lhe é apresentada como opção de lar. O suposto pai prefere não contar com ele, mantendo no lugar um empregado que, como aqueles que começam a despertar, passa a dar sinais que não ficará calado por muito mais tempo. Enquanto decide o que fazer com o subalterno, o patriarca tem também o fardo de lidar com a esposa, a velha senhora de família nobre que o olha com desprezo, por reconhecer nele uma classe que julga inferior. Há amargor e desprezo entre eles. É em terra árida, portanto, que Unté busca encontrar seu espaço. Assim como reflete os desatinos de uma Lituânia perdida em aceitar sua posição como moeda de troca entre vizinhos muito mais fortes ou lutar pela própria condição de estado independente. As ameaças estão por todos os lados. Mais eficientes, no entanto, são aquelas que tem como origem as entranhas daqueles que deveriam ser os primeiros à combatê-las.

Entre a cidade e o campo, há a resistência. Os que não querem ser, mais uma vez, subjugados. São aqueles que, justamente por se julgarem mais patriotas que os demais, se veem agora sem casa para chamar de sua. São figuras banidas, perseguidas e prontas para luta, mas também desmotivadas pelo afastamento dos acontecimentos. Unté e o pai se encontram no meio desse fogo cruzado. Agem como se obedecessem às normas impostas, mas calados anseiam por uma nova realidade. São reflexo de um país que já foi grande, mas se encontra encolhido dentro da insignificância a qual se viu destinado. Os segredos pelos quais há muito lutaram, agora são combustíveis, tanto de permanência, quanto de motivos para uma eventual partida.

O olhar crepuscular e muitas vezes depressivo que Bartas lança sobre seus personagens é como um manto de angústias que iria abafar a região ainda por muitas décadas. Se nem sempre consegue resolver com eficácia os enigmas sobre os quais se debruça e por outras vezes alguns dos seus desfechos acabam por soar apressados demais – a sequência do julgamento na floresta é particularmente perturbadora, como uma moeda que insistisse em cair sempre com a mesma face para cima – ao menos Ao Entardecer entrega o prometido ao não poupar nenhum dos tipos que termina por expor, sejam os que acreditam em melhores possibilidades, como também os que se veem sem terem para onde ir. Há um limite para todos, seja dentro de casa, ou nas fronteiras de uma nação. E essa parece ser a maior reflexão proposta por um filme que, no meio de tantos signos, se esforça em mostrar-se à altura das responsabilidades que abraça durante o seu caminho.

Filme visto online na 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em novembro de 2020.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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