Crítica


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Sinopse

Uma grande família se reúne em uma ilha em Nápoles para comemorar as bodas de ouro dos avós, Alba e Pietro. Porém, quando, em meio às festividades, uma tempestade faz com que o numeroso grupo fique preso no local, eles são obrigados a encarar os rancores e hipocrisias escondidos por muitos anos.

Crítica

Gabriele Muccino é um diretor italiano que ganhou as graças de Hollywood em meados dos anos 2000. Depois dos sucessos de público e crítica de títulos como Para Sempre na Minha Vida (1999) e O Último Beijo (2001), os olhos do mundo se viraram ao cineasta. Não demorou muito para que seu jeito de retratar as relações humanas com pitadas de acidez e romantismo, na mesma medida, se traduzisse em um título norte-americano. Bom, ele lançou Will Smith novamente ao Oscar por conta de À Procura da Felicidade (2006). Porém, depois vieram coisas como Sete Vidas (2008), Um Bom Partido (2012)... Até teve Beije-me Outra Vez (2010) nesse meio tempo, para dar uma apaziguada, mas sua mão já não era considerada tão infalível. O que nos leva a Aqui em Casa Tudo Bem, para mostrar que Muccino não teve apenas sorte, pois é, realmente, um realizador acima da média.

O cenário é uma ilha italiana. O contexto, uma grande família recheada de filhos, esposas, maridos, ex e primos que se juntam para o aniversário de 50 anos de casamento dos avós Alba (Stefania Sandrelli) e Pietro (Ivano Marescotti). Se reunir tanta gente com traumas passados já não seria a melhor ideia do mundo, uma grande tempestade ocorre, serviços de balsa são cancelados e, claro, os sentimentos enclausurados de cada um começam a se manifestar após tantos anos sem um encontro. Quem é casado com quem, quem tem amante aqui e ali, são peças jogadas para o espectador descobrir aos poucos, num grande mosaico de situações cotidianas que guiam esta tragicomédia siciliana.

Muccino conta com um grande trunfo em mãos: personagens deliciosamente expostos, cheios de carisma e, melhor ainda, um elenco que os defende com unhas e dentes. Inclusive Stefano Accorsi, que parece não ter envelhecido desde O Último Beijo e Beije-me Outra Vez, outras parcerias com Muccino em que o ator faz o eterno adolescente irresponsável preso num corpo adulto. Aqui, no entanto, todos têm espaço suficiente e, principalmente, tempo de tela para gritar, espernear, botar para fora o que realmente são. É aquela clássica reunião familiar em que tudo dá errado e não há como fugir das dúvidas, traições e segredos. É como o churrasco de domingo com pais, irmãos, tios e primos. Uma naturalidade que lembra alguns momentos da família de Como Nossos Pais (2017), de Laís Bodanzky, porém, na potência máxima. É o sangue italiano fervendo na mais alta temperatura.

Por isso mesmo, o cenário acaba por se tornar um importante elemento dessa equação. A ilha é um ambiente claustrofóbico, física e emocionalmente, para todos os personagens, que precisam extravasar de alguma forma. Afinal, animais presos ficam com raiva. O ser humano não é tão racional quanto pensa, ainda mais numa hora dessas. A fotografia aumenta essa sensação, ao tornar a paisagem da região quase inatingível para pessoas tão perdidas dentro de si quanto as dessa família completamente disfuncional. Um dos raros momentos de calmaria é a sequência da noite de sono, em que palavras ao pé de ouvido são trocadas e todos parecem respirar com uma aparente paz – mesmo que alguns não queiram estar com o exato parceiro presente na cama.

Aqui há um retrato que traduz bem a sociedade italiana nesse pequeno nicho. São homens amargurados, fechados (especialmente o personagem de Pierfrancesco Favino), que explodem numa onda de machismo, e mulheres criadas para serem submissas, subservientes, mas que se negam (seja em maior ou menor grau) a tais papéis. Quando parece que Muccino está entrando numa atmosfera de misoginia, ele logo derruba isso com alguma reviravolta causada, é claro, por uma presença feminina bem mais forte e determinada que qualquer outra masculina. Isso até em momentos mais singelos, como o de uma adolescente que resolve tomar a iniciativa de fazer sexo com outro jovem. Uma cena perfeitamente natural e realista.

É claro, nem sempre o roteiro ajuda e alguns momentos parecem deslocados da conjuntura narrativa, ainda mais com a trilha sonora, que, apesar de bela, é utilizada em instantes desnecessários, como se obrigasse o espectador a sentir algo já está exposto nos diálogos ou no simples olhar dos personagens. Problemas menores que não alteram a eficiência do longa. É mais uma prova de que, por mais que se tente fugir, família é uma só, para o bem ou para o mal. E melhor ainda que seja dirigida por alguém que entende tão bem esses laços quanto Muccino. Que o sucesso deste longa (primeiro lugar nas bilheterias italianas nas duas primeiras semanas em cartaz) seja apenas um aperitivo do retorno desse diretor, que há tempos precisava de um trabalho à altura de suas habilidades.

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é crítico de cinema, apresentador do Espaço Público Cinema exibido nas TVAL-RS e TVE e membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista e especialista em Cinema Expandido pela PUCRS.
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