Crítica
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Sinopse
Um vigarista tenta passar a perna num grupo de avós. Mas, elas o matam acidentalmente. Agora, as aposentadas terão de se livrar do parceiro do morto, um sujeito violento e sedento de vingança.
Crítica
Armadas e Perigosas (2017) se constrói em torno da inversão de expectativas. Não se espera que mulheres idosas ameacem fisicamente um rapaz, que saquem um revólver contra ele, matem-no, arrastem o corpo, cortem-no em pedaços etc. Em paralelo, senhoras de certa idade não costumam fumar maconha, admirar os músculos de xerifes jovens ou ainda negociar com sequestradores. Estas são algumas das ações que as “avós malvadas”, do título original, efetuam nesta comédia. A premissa se traveste de superação de obstáculos: veja só, que bonito, essas mulheres são capazes de qualquer coisa! No então, o humor se torna depreciativo ao concentrar a risada no exotismo da situação: elas não são elogiadas por suas forças e proezas, e sim sublinhadas pela dor no corpo quando carregam o cadáver, pela maneira como dirigem o carro, pelo prato de comida delicioso preparado enquanto o sujeito morto continua no tapete da sala. O humor provém da ridicularização dos conflitos, e não de sua naturalização.
Caso fosse realizado com esmero, o projeto produziria um efeito semelhante ao de As Rainhas da Torcida (2019), comédia dramática de ambições simples, onde senhoras idosas realizavam o sonho de se tornarem cheerleaders. No entanto, a primeira ficção do diretor Srikant Chellappa possui inúmeros problemas de realização. As cenas carecem de ritmo, a montagem não tem ideia de como imprimir dinamismo (picotando cenas no meio do plano, aleatoriamente), a direção de fotografia demonstra indecisão ao enquadrar, com qual profundidade de campo. O resultado soa como um exercício de estudantes de audiovisual: na dúvida, as cenas apresentam planos de conjunto banais, que abrem a objetiva ao máximo para enquadrar mais. Quanto mais espaço em cena, melhor. O primeiro close-up digno deste nome aparece a 1h10 de duração: antes disso, nos contentamos com as senhoras sentadas à mesa ou no sofá, olhando umas para as outras em tom de desconforto, dentro de planos fixos protocolares. Mesmo os aspectos mais básicos de direção demonstram falhas graves: há erros de continuidade, quebras de eixo, desequilíbrios notáveis de iluminação e correção de cor, problemas da captação de som em espaços internos, figurinos grandes ou pequenos demais, acessórios fracos (a peruca de Pam Grier), ausência de maquiagem... A lista poderia continuar.
Em paralelo, a direção de arte insiste tanto no estereótipo da “estética de vó” (cores pastéis, estampas floridas) que beira o grotesco. Este é um dos problemas mais evidentes da narrativa: ele não permite que a situação improvável aconteça dentro de um ambiente verossímil, introduzindo forçosamente a comicidade num contexto absurdo por si só. Como as cenas demoram a se resolver, e as piadas do texto nem sempre se concluem, a produção transmite a aparência de uma longa piada que nunca chega à punchline. Enquanto isso, para uma trama de ação sobre um assassinato involuntário, o resultado é curiosamente desprovido de tensão. O roteiro possui incongruências óbvias: ele ignora uma de suas protagonistas, sequestrada durante dias num galpão de portas abertas, enquanto introduz o motivo de um importante contrato cuja única cópia se encontra em papel, e brinca de maneira absurda com pedaços de carne humana que aparecem e desaparecem de acordo com as conveniências do roteiro. Mimi, Coralee e Bobbi nunca parecem realmente ameaçadas, até porque os numerosos indícios do crime são ignorados pela trama. Uma gigantesca mancha de sangue é esquecida pela trama, assim como o roubo de uma pasta de documentos, uma ligação comprometedora e o cheiro dos pedaços de carne. É bom que o filme não se leve a sério demais, mas pode-se questionar o desprezo do projeto por sua própria lógica interna. A comicidade não implica no desdém pela direção, nem o legitima.
Um dos principais motivos para a origem desta comédia se encontra na reunião de atrizes veteranas. Florence Henderson foi a eterna Carol Brady da série The Brady Bunch (1969-174), enquanto Pam Grier encarnou Foxy Brown nos anos 1970, e depois interpretou a Jackie Brown de Quentin Tarantino. Ora, aqui elas estão tristemente perdidas e mal dirigidas, sobretudo Pam Grier, graças às personalidades mornas e intercambiáveis das protagonistas. Henderson consegue extrair algum frescor em determinadas cenas, acelerando falas e propondo pausas inesperadas em certos diálogos. As demais vovós fazem uma caricatura da velhice: nada mais desrespeitoso do que pedir a mulheres de 70-80 anos que brinquem de idosas, ao invés de interpretarem a si mesmas. De resto, as atuações permanecem em nível próximo do amadorismo, sobretudo no que diz respeito à galeria de coadjuvantes (a filha interpretada por Miriam Parrish, o detetive vivido por Randall Batinkoff). As deficiências se distribuem de maneira tão uniforme pelos aspectos técnicos e discursivos que transparecem a a inaptidão específica do papel dos produtores, seja por desconhecimento ou desinteresse. Armadas e Perigosas se torna um filme mais incômodo do que divertido, além de um tanto constrangedor e aborrecido, soando como oportunidade perdida às atrizes e ao espectador.
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