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Sinopse
Um pai e a sua filha adolescente vão a um show de música pop, momento de descontração que rapidamente se transforma num pesadelo. Para seu horror, descobrem que estão presos num acontecimento aterrador que desafia a compreensão.
Crítica
A piada é tão fácil que chega até a perder a graça. O espectador desconfiado poderia afirmar que Armadilha é apenas mais um esforço de M. Night Shyamalan para agradar sua prole. Afinal, após produzir Os Observadores (2024), estreia na direção de Ishana Shyamalan, sua filha do meio, agora é chegada a vez de desenvolver uma história em torno dos talentos de Saleka Shyamalan, a primogênita, que é cantora, compositora e, claro, também atua. Pois grande parte da ação se passa durante um concerto de música pop, cuja estrela é justamente sua herdeira. É de se imaginar quando chegará a vez de Shivani, a caçula, receber tamanha atenção dos holofotes paternos. Porém, o certo é que por mais coruja que ele seja, seu olhar permanece afiado. E, dessa vez, deixando de lado bagagens que tanto o prendiam à fórmulas vencidas, como também o impedia de certas ousadias.
Ao contrário de seus esforços mais recentes, como Tempo (2021) ou Batem à Porta (2023), que partiam de premissas interessantes, afeitas ao fantástico, mas durante o desenrolar dos eventos acabavam perdendo a mão e entregando desfechos aquém do prometido, dessa vez o Shyamalan pai permanece com os dois pés firmes no chão. Com isso, alcança uma das suas obras mais coesas, que não desperdiça as atenções com desvios desnecessários, indo direto ao ponto, sem alarmes falsos ou reviravoltas gratuitas. É quase como se o cineasta abrisse mão de algumas das suas marcas registradas em busca não de uma nova identidade, mas de sua própria origem. Armadilha talvez seja o filme mais próximo de Hitchcock de toda a sua filmografia.
Cooper (Josh Hartnett, que desde a série Penny Dreadful, 2014-2016, há exatamente uma década, não tinha um personagem tão interessante em mãos) está tendo um dia de pai exemplar, ao acompanhar sua filha de doze anos no show vespertino de Lady Raven (Saleka, sem a profundidade dramática que sua presença exige), uma cantora que é febre entre adolescentes. Aos poucos ele começa a perceber uma quantidade fora do normal de seguranças no estádio, e de forma discreta consegue que um vendedor local lhe conte o que está acontecendo: uma pista chegou até ao departamento de polícia de que o Açougueiro, um assassino em série que tem aterrorizado a cidade nos últimos meses, estaria presente naquele evento. A intenção é clara: capturá-lo num momento de descuido. O problema é que o Açougueiro é o próprio Cooper.
Tal revelação não chega a ser um spoiler, pois Shyamalan não pretende esconder quem o protagonista é de fato. Da mesma forma, o audiência vai recebendo as informações ao mesmo tempo que o Cooper, que sente o cerco se fechando ao seu redor. Como, portanto, conseguirá sair ileso dali, sem despertar suspeitas não apenas na multidão ao seu lado, mas principalmente na filha que o acompanha? Ele cria distrações – joga uma garota das escadas, provoca um acidente na lanchonete – mas essas servem apenas para tornar evidente que suas chances de escapar são cada vez menores. O diretor não está interessado na verossimilhança: muitas das artimanhas deste que está sendo procurado são tão improváveis que chegam a ser curiosas, para não dizer excitantes. Brinca-se com o absurdo num prolongamento da tensão: se mesmo com todas as coincidências a seu favor ele se mostra cada vez mais acuado, como esperar que chegue vivo ao final do dia?
Quando se esgota as possibilidades do cenário principal – o espetáculo musical e seus bastidores – Shyamalan não se mostra limitado, e num caminho inverso, decide dobrar a aposta. Com isso, Hartnett se vê diante de uma variedade de emoções, que vão desde um homem perturbado pelo fantasma da mãe ao estilo de Norman Bates em Psicose (1960), até um mestre em fugas impossíveis, como um Houdini contemporâneo. E o ex-galã de tramas de terror adolescente e épicos românticos se sai bem ao expor um lado mais sombrio e intenso, mostrando que a maturidade pode lhe ter demorado, mas chegou com créditos em sua conta. Armadilha é um presente para o ator e um belo exercício do diretor, que deixa de lado argumentos mirabolantes na proposta, mas frágeis no resultado, para se mostrar satisfeito em percorrer os trâmites de um gênero dominado por mestres, mas de portas abertas para artesãos talentosos.
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