Crítica
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Sinopse
Um surto zumbi transforma Las Vegas numa cidade em ruínas. Um ex-heroi de guerra é abordado por um magnata e incumbido de invadir o local a fim de roubar 200 milhões de dólares de um cofre antes do governo bombardear Vegas em 32 horas. Para essa missão, ele juntará uma equipe de especialistas.
Crítica
No cânone do filme de zumbi, geralmente os remanescentes não infectados lutam tão e somente por sobrevivência. Seus dramas passam por ter de lidar com um meio em colapso acelerado, a desterritorialização, a perda de entes queridos e a necessidade de proteger-se, assim como zelar pelos restantes. Em Army of The Dead: Invasão em Las Vegas a motivação tem outra natureza, a monetária. Scott (Dave Bautista), ex-militar condecorado e anteriormente deparado com a praga que transformou a meca do jogo no estado de Nevada num campo de concentração para mortos-vivos, é seduzido por um magnata a montar uma equipe, entrar na localidade infestada de ameaças bizarras e resgatar US$ 200 milhões de um cofre. Isso antes do governo dos Estados Unidos soltar uma bomba atômica por ali, o que basicamente existe a fim da turma não ter muito tempo para pensar. Seu principal incentivo ao abraço dessa missão praticamente suicida é deixar para trás uma vida pacata como chapeiro numa lanchonete. Mas, por trás disso também pode estar um impulso autodestrutivo motivado pela culpa? Pode. Deve servir de combustível o vício na adrenalina? Provavelmente.
No entanto, o cineasta Zack Snyder decide não investigar esse personagem para além de sua capacidade de liderar um time heterogêneo. Assim sendo, sem os aprofundamentos, soa unicamente como um enfastiado pelo marasmo, decidido a fazer algo sem nexo aparente, afinal de contas coloca o dinheiro acima da própria vida. Tá aí outra possibilidade de leitura desse encorajamento que parece desproporcional. Mas, novamente, Snyder se limita a pistas bastante anêmicas que levam a essa compreensão, rapidamente deixando que a ação domine. Por exemplo, a mulher refugiada que incursiona por Las Vegas para tentar garantir a salvaguarda dos filhos é uma sinalização política interessante. Sua tragédia está em ser colocada entre a displicência do governo norte-americano e o risco enorme de morte, este que, ao menos, lhe dá uma alternativa de conseguir subsistir. Ainda que tratada basicamente como isca, uma desculpa esfarrapada para o filme apresentar a relação (frágil) entre pai e filha pretensamente estofando a missão, essa coadjuvante (quase figurante) luta estritamente para viver. Uma pena que o filme a negligencie, bem como faz com outros apontamentos que poderiam reverberar.
Army of The Dead: Invasão em Las Vegas ensaia um viés conspiratório envolvendo o Estado e a natureza da tarefa contratada, mas não o lapida, transformando-o num pano de fundo decorativo, ou seja, passando longe de com ele instituir uma crítica ácida. Também pratica um discurso humanitário com os refugiados prestes a serem evacuados das redondezas de Las Vegas, mas acaba não amplificando suas ressonâncias. Igualmente, aponta ao machismo, vide o personagem estuprador deixado à própria sorte como oferenda aos mortos-vivos, porém sequer utiliza sua danação como uma catarse. Zack Snyder já tinha incursionado melhor pelo mundo dos zumbis com Madrugada dos Mortos (2004), fazendo um “feijão com arroz” mais saboroso, sobretudo pela forma direta com que estabeleceu os vínculos e opôs a humanidade restante aos inimigos inanimados. Aqui, ele tenta algo grandioso, mas acaba afogado nas próprias pretensões, ainda que o longa-metragem esteja longe de ser uma experiência aborrecida ou sem valor. Apenas não resiste ao escrutínio das várias fragilidades.
Além dos desperdícios supracitados, Army of The Dead: Invasão em Las Vegas desgasta as particularidades em prol do genérico. Dentro da estrutura dos chamados heist movies, ou filmes de assalto, tradição na qual Snyder bebe abertamente, cada personagem possui uma habilidade específica. Somados, os conhecimentos determinam o sucesso da missão, portanto as baixas representam, além do baque emocional, rachaduras nas fundações do plano. Isso está relativamente bem preservado, o mesmo não podendo ser dito sobre as personalidades das peças. Exemplo disso, o YouTuber que fez fama matando zumbis, contratado por não ter problemas morais para isso. Afora a selfie tirada na entrada desse “inferno”, não há outra menção à atividade que supostamente o define. Isso também pode ser dito da braço-direito do protagonista e do melhor amigo casca-grossa. Os únicos que têm espaço singular são a guia (que explica como funciona aquela geografia) e o chaveiro alemão que estabelece com o colega de ocasião uma mal trabalhada dinâmica de carinho/tensão.
Outro elemento pouco aproveitado é Las Vegas. Esse purgatório da beleza e do caos, ode ao hedonismo, à luxúria e ocasionalmente à ruína, é despersonalizada, não tendo suas características principais utilizadas, senão no ótimo clipe-resumo de abertura que mostra, inclusive, imitadores de Elvis e dançarinas zumbis. No que tange às ameaças, há uma mitologia distinta, com camadas diferentes numa sociedade superficialmente caótica, mas que tem organização própria. Há os alfas, que correm e pensam, e os demais, que formam hordas cegas. O que poderia tranquilamente servir de base a uma metáfora social pungente acaba como mero subterfúgio para escalonar o perigo. O cineasta faz breves acenos à tradição simbólica do filme de zumbi, isso enquanto serve aos ditames da ação, parecendo excessivamente indeciso entre essas possibilidades. O resultado é um filme que não evoluí os pensamentos políticos e tampouco investe numa coerência tétrica definida pela urgência de sobreviver ao próximo ataque, de juntar rapidamente os cacos e seguir em frente.
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