Crítica
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Sinopse
As filhas de um cangaceiro assassinado são levadas por Toneco a um orfanato. Dez anos depois, o sujeito entra para o bando de Sabiá que, descobrindo o destino das moças, destrói o orfanato. As jovens partem em busca de vingança.
Crítica
Roberto Mauro (1940-2004) foi um dos grandes nomes da pornochanchada brasileira. Dentre os vinte longas que dirigiu nos menos de quinze anos de sua carreira como cineasta – como se percebe, prolífica para um período tão curto – se destacam longas como O Poderoso Machão (1974), A Praia do Pecado (1978) e Etéia: A Extraterrestre em sua Aventura no Rio (1983), apenas para ficarmos nos mais comportados. Porém poucos foram tão revolucionários e inovadores como As Cangaceiras Eróticas, título que inverte a ordem dos fatores praticados até então, tirando as mulheres do papel de vítimas para assumirem uma posição de controle, indo atrás de vingança sem, no entanto, deixarem de lado todo e qualquer prazer que pudesse ser encontrado pelo caminho – em todos os sentidos, é claro.
Quando um volante de policiais descobre o esconderijo de um grupo de cangaceiros, todos acabam mortos, com exceção de Toneco (Jofre Soares), que consegue escapar. Seu intento é salvar as duas filhas do chefe do bando, levando-as até um orfanato próximo comandado pelo Padre Lara (Letácio Camargo). Após deixá-las, retorna decidido a se infiltrar entre os bandidos liderados por Cornélio Sabiá (Enoque Batista), seu maior inimigo, para descobrir quem foi que os traiu. Ele não é o único que deseja acertar as contas com o vilão, no entanto, pois Paulo Pastor (Marcos Miranda) também está no encalço dos fora-da-lei após ter perdido sua família. Só que os anos se passam, e quando Sabiá fica a par da existência das duas garotas – agora já mulheres feitas – manda eliminá-las. Elas, no entanto, por um acaso do destino, sairão vivas do novo ataque, e se unirão a outras colegas para vingar todo o mal que sofreram até então.
Talvez essa seja a grande questão de As Cangaceiras Eróticas: as meninas não se colocam em posição indefesa em nenhum momento. Elas são donas de seu destino, e irão fazer o que for preciso em busca da justiça que acreditam que merecem. Vestidas com um uniforme pra lá de fetichista – as saias são tão minúsculas que é impossível esconder as calcinhas (não que elas queiram fazer isso, é claro) – e nem um pouco inibidas em relação ao sexo, eliminam qualquer um que se coloque no caminho delas, não sem antes levá-los para uma sessão mais privada em suas cabanas. Invadem casamentos e mandam todos os convidados ficarem nus, sequestram o noivo virgem a ponto de deixá-lo insaciável e deturpam a imagem de falsos moralistas, que descobrem nos seios delas a perdição que tanto condenavam.
Algumas brincadeiras, no entanto, fogem um pouco dos limites, como as que fazem referência ao jegue que abandonam no orfanato – cada vez que encontram um novo homem, puxam uma fita métrica para medir o “instrumento” do coitado, e sempre que se deparam com um bem-dotado (com 23 cm, por exemplo), exclamam “lembra tanto o Cacá” (o animal, que fique claro). A homossexualidade também não fica de fora, e se sequestrar o halterofilista do circo parece despropositado, como se fosse apenas um exercício de luxúria, no mesmo instante em que ele revela ser cabeleireiro (ou costureiro, ou algo que valha) nas horas vagas, a piada fica óbvia. Por outro lado, é curioso perceber que sempre que os cangaceiros estão reunidos com prostitutas, um deles está permanentemente sozinho, observando um dos colegas em particular com inveja – se dele ou da moça que está em seu colo, logo não restarão dúvidas.
São detalhes assim, quase despercebidos, que se mostram ainda mais provocadores do que as protagonistas boas de cama e de revólver. Mas talvez tais polêmicas não tenham sido tão discretas assim. Afinal, para um gênero que costumava levar milhares de espectadores aos cinemas – A Dama do Lotação (1978) somou 6,5 milhões – os pouco mais de 200 mil espectadores de As Cangaceiras Eróticas podem ser considerados um fracasso. Mesmo assim, Mauro não se deu por vencido, e dois anos depois voltaria com a sequência A Ilha das Cangaceiras Virgens (1976), feito de forma ainda mais amadora, e sem o potencial inovador que havia despertado tanta atenção no anterior. Resta, então, neste primeiro o exercício que mostra que, mesmo num gênero tão dado ao clichê e ao estereótipo, era possível exercer uma insuspeita criatividade.
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