Crítica
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Sinopse
Um registro afetivo sobre a história do Coletivo Murais da Leba, a maior intervenção de grafite da África, procurando entender as motivações dos artistas participantes. A Serra da Leba, composta pela província de Huila e Namibe, tem um histórico de 30 anos vividos em guerra. Buscando se relacionar com sua tradição e ancestralidade, um grupo de artistas angolanos busca pintar os mais de seis mil metros quadrados dos paredões que envolvem a região.
Crítica
As Cores da Serpente é o registro de um processo. Neste caso, o trabalho em curso é a maior intervenção de grafite da África, na Serra de Leba, formação montanhosa na província da Huíla, localizada próxima à cidade do Lubango, em Angola. O local é muito famoso por sua altitude e pelo serpentear da estrada – daí a frequente menção ao réptil. O que está em jogo é a arte como transformadora da paisagem, mais especificamente uma agregadora de beleza. O cineasta Juca Badaró acompanha um grupo de artistas que paulatinamente muda os paredões ao longo das curvas, sobrepondo formas e cores às pichações que outrora banalizavam o espaço. O vislumbre inicial de um ritual angolano aponta à vontade do longa-metragem de valorizar a cultura local, algo que os próprios grafiteiros mencionam no decurso desse acompanhamento que carece, no entanto, de pontos de apoio tratados com mais consistência.
A maior fragilidade de As Cores da Serpente está na displicência do realizador quanto ao entrelaçamento dos vários discursos presentes. O único personagem que ganha um pouco de espaço considerável é o responsável pelo Coletivo Murais de Leba. Ele discorre a respeito das dificuldades para fazer o projeto prosseguir, da necessidade de contar com a ajuda do empresariado local – desde que o mesmo não coloque suas marcas acima dos desenhos concebidos – e chega a ensaiar um depoimento acerca das precariedades que os grafiteiros angolanos são obrigados a sobrepujar para fazer valer a sua criatividade. Todavia, é frágil a linha que Juca utiliza para cerzir essa fala, supostamente basilar, com as demais manifestações, especialmente as dos jovens que fizeram parte do projeto, se encarregando de embelezar a região, geralmente recorrendo aos motivos africanos para expressar-se visualmente. Os ditos acabam bem soltos.
As Cores da Serpente passa rapidamente sobre tópicos importantes, tais como a situação da mulher grafiteira em Angola. Um par de meninas menciona a felicidade de fazer parte daquilo tudo, mas falta ímpeto ao realizador para adensar esses testemunhos pessoais. De forma parecida, o entusiasmo ao retratar a cultura nativa em figuras e símbolos bastante sintomáticos é desperdiçado como potencial dramático. Juca Badaró se contenta com a observação, pura e simples, de um cotidiano de esboços e arremates, transitando de maneira célere pela profundidade inerente àquele movimento, preterindo as complexidades num percurso esvaziado pela soma de retóricas apressadas. Há instantes de transição que soam como meros enxertos nesse andamento caudaloso, que poderia ser condensado em ainda menos tempo que os, aqui, setenta minutos utilizados para mostrar o empenho dos grafiteiros angolanos.
Nas paredes há representações da resistência ao tráfico escravo, de ícones da religiosidade afro-brasileira, mas nenhum deles é, sequer, identificado. As Cores da Serpente conta com a participação, apenas citada, não instrumentalizada, de artistas de outros países, inclusive do Brasil. Intentando capturar essa construção de maneira afetiva, Juca Badaró negligencia a progressão cinematográfica, fazendo de seu documentário um exemplar vago e ocasionalmente arrastado. A dispersão é oriunda, justamente, da falta do comprometimento com a costura dos componentes, do que decorre a sensação de inércia e desperdício constante. Mesmo a duras penas, a beleza desse mutirão que interfere positivamente num cenário emblemático por força, especialmente, de uma juventude orgulhosa de suas raízes, aparece e reduz um pouco os percalços impostos pela estrutura escolhida para contar essa história inspiradora.
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