Crítica
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Sinopse
A trajetória da influente Gloria Steinem, dos tempos de jovem indiana à fundação da revista Ms. em Nova Iorque. Ela se tornou uma figura essencial na luta pelos direitos das mulheres.
Crítica
Como visto em outros de seus longas-metragens, tais como Across The Universe (2007), Julie Taymor provavelmente não acredita serem suficientemente potentes as abordagem diretas da realidade, preferindo nela injetar fabulações, talvez, para enfatizar as intensidades de sensações e subjetividades. Em As Vidas de Glória, a cineasta dificilmente se demora em olhares ou numa pausa/respiração alongada para o espectador se conectar calmamente com pessoas e circunstâncias, assim permitindo-lhe gerar seus próprios juízos de valor. Em vez disso, ela lança mão de reflexões que a protagonista faz ao ser fracionada. A trama do longa-metragem é quase integralmente entrecortada por uma viagem de ônibus imaginária, em que quatro Glórias Steinem debatem, por exemplo, acerca de escolhas que umas fizeram e as demais não corroborariam. A criança olha à versão derradeira, lembrando-lhe da inocência. A jovem mulher recorre à sua etapa mais velha para termos uma ideia poética de ciclicidade, de jornada a ser cumprida. Esse artifício lúdico poderia funcionar melhor, não fosse o seu caráter meramente ilustrativo, pois dele não decorrem disputas, somente conscientizações rasas e as sentenças semelhantes a conclusões um tanto óbvias, pois não demarcadas pela evolução pessoal.
As Vidas de Glória é dividido em dois filmes, ainda que a realizadora supostamente contradiga isso com o vai e vem cronológico. A oscilação temporal é um subterfúgio para camuflar a bipartição. Tenta torna-la menos cartesiana, porém sem ofender os princípios da segmentação, no fim das contas, mais convencional do que possa parecer inicialmente. A primeira parte trata da infância/pré-adolescência, na qual a nobre protagonista é vivida respectivamente por Ryan Kiera Armstrong e Lulu Wilson. Glória Steinem é vista como uma menina inclinada a identificar-se com a personalidade solar do pai vivido excepcionalmente por Timothy Hutton. Afinal de contas, seu espírito aventureiro certamente é atrativo a uma criança, bem mais que o senso de responsabilidade encarregado de fazer sua mãe, interpretada por Enid Graham, permanecer preocupada com o futuro. Porém, o longa não resolve essa questão tão importante, tendo em vista que se trata da cinebiografia de uma ativista pelos direitos femininos. Sequer observa como é possível a consolidação do lugar-comum que confere ao homem a possibilidade de apostar e à mulher a sina de ser a “estraga prazeres” de plantão.
Ainda no que diz respeito ao dado familiar, claramente Glória herda do pai a inquietude que a leva à estrada e o temperamento vibrante. Mas, além de não desenvolver essa simetria, Julie Taymor ainda relega à mãe um espaço figurante no decurso da história, não refletindo sua existência posteriormente a partir das experiências da protagonista que passa a (se) enxergar diferente, inclusive retrospectivamente, vários aspectos importantes de sua vida. Não se trata de advogar pela vilanização paterna e tampouco em favor da romantização da resiliência materna, mas de cobrar posicionamento diante dessa dinâmica que diz muito sobre a configuração social das famílias norte-americanas, ao ponto de possibilitar a instauração do clichê mencionado. A segunda fração traz pretensamente Glória Steinem sendo apresentada/revelada/ressignificada a partir das inúmeras causas defendidas. Alicia Vikander é a Glória que enfrenta corajosamente o mundo machista, encarando sexismo no mercado de trabalho e os desafios de começar a se fazer ouvir. Julianne Moore vive a fase conhecida internacionalmente, a da mulher que ajudou tantas outras a buscarem o ideal de emancipação.
Contudo, em vez de deixar consistentemente que Glória Steinem mostre sua essência por meio da resistência, dos atos considerados controversos por uma parcela conservadora da sociedade norte-americana, vide a forma como lidou com conflitos dentro do próprio movimento feminista, As Vidas de Glória prefere ora reduzi-la ao papel de agregadora, ora investi-la de uma capacidade catalisadora. As conversas imaginárias com as outras Glórias se tornam esporádicas, já que o foco se desloca da pessoa ao que ela representa coletivamente como propulsora da revolução. A protagonista passa a transitar como que encarregada de, na condição de magnetizadora das atenções, iluminar etapas e facetas da insurreição feminista nos Estados Unidos, contratempos gerais e específicos (sobretudo oriundos das singularidades de grupos minoritários), gradativamente esvanecendo como sujeito em prol da sua reconstrução como símbolo. Esse trajeto poderia ser interessante e instigante, caso Julie Taymor conseguisse equilibrar o prévio estudo de personagem com a deflagração de sua importância pública. O resultado transita entre a instabilidade, às vezes extravagante, e o retrato carinhoso da notável, ainda desperdiçando os talentos do elenco, colocando-os no piloto automático.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Marcelo Müller | 4 |
Alysson Oliveira | 8 |
MÉDIA | 6 |
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