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Crítica


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Sinopse

Quatro viúvas entram para o mundo do crime após os seus maridos morrerem durante uma das maiores tentativas de assalto da atualidade. Eles tomam para a si a responsabilidade de honrar a memória dos amados terminando o que eles não conseguiram completar.

Crítica

Quatro bandidos de Chicago morrem num confronto com a polícia local. Suas esposas ficam à deriva, convivendo com o sofrimento e, de maneiras distintas, enfrentando a necessidade de prover o sustento das famílias ou, no caso de Veronica (Viola Davis), pagar a dívida milionária com a facção criminosa rival. As Viúvas se fundamenta, inicialmente, no percurso que três dessas mulheres encaram para solucionar os problemas financeiros, entrando em contato com a marginalidade, outrora um dado que apenas as afetava indiretamente. Todavia, o cineasta Steve McQueen não parece disposto a fazer seu longa-metragem enveredar irremediavelmente à seara da ação. Ele investe muito na nutrição do cenário em que as personagens se encontram, utilizando a disputa política em curso para mostrar a podridão do entorno. Nesse sentido, é importante a participação de Jack (Colin Farrell), jovem candidato à liderança do condado, cuja campanha é incentivada pelo pai, o escolado Tom (Robert Duvall).

As Viúvas, portanto, se desenvolve em várias frentes, tratando com semelhante consideração a montagem improvável do grupo feminino para dar um golpe de grandes proporções e a contemplação dessa comunidade em que os políticos se beneficiam sobremaneira de suas posições de poder, certos religiosos rifam o apoio irrestrito dos rebanhos a quem desembolsar mais dinheiro e a bandidagem procura eleger-se para legitimar sua força até então paralela ao aparato estatal. Há um desenho relativamente consistente dessa conjuntura em que a dubiedade moral dá as cartas, na qual homens e mulheres fazem o necessário para prosperar, angariar aliados influentes ou coletar fundos para saldar dívidas astronômicas. Porém, McQueen, ao invés de mergulhar de cabeça na sordidez deflagrada generalizadamente, acaba criando antagonismos simples e incorrendo em registros quase banais. Veronica, por exemplo, não tem uma trajetória clara da passividade à atividade ilegal, se tornando alguém inconsistente.

Apesar da ausência de uma argamassa sólida, As Viúvas tem momentos suficientemente fortes do ponto de vista cinematográfico, o que a torna uma realização valorosa o bastante. A melhor personagem é Alice (Elizabeth Debicki). Seu arco dramático é superior ao das demais, em virtude da análise sensível de sua desorientação pós-viuvez. Largada à própria sorte pelo marido, que a espancava costumeiramente, ela se depara com o comportamento questionável da mãe. Aliás, há uma cena excepcional entre Debicki e a intérprete da matriarca, Jacki Weaver, quando esta indica a prostituição de luxo como o melhor caminho para a subsistência sem sobressaltos. É um momento capturado com particular atenção por McQueen, cineasta que valoriza a atuação das atrizes, colando a câmera em seus semblantes e deixando que o torvelinho de sentimentos se dê sutilmente numa conversa convenientemente travestida de alinhamento prático. Já as comparsas, como a vivida por Michelle Rodriguez, são meras coadjuvantes sem muito peso.

As Viúvas perde potência, justamente, ao abarcar uma série de realidades para a construção de um painel amplo. Ainda assim, consegue prender a atenção numa trama cheia de reviravoltas, saindo-se melhor na condição de esquadrinhador de uma circunstância macroestrutural, caracterizada pela relação promíscua entre política, criminalidade e religião, que necessariamente enquanto observador da intimidade das pessoas. O choque entre o pensamento político do filho e as concepções ultrapassadas do pai ensaia tomar os holofotes ocasionalmente, mas acaba surgindo como outro componente valioso ao todo, bem mais relevante, diga-se de passagem, que a jornada de Veronica, a líder do grupo, a que se embrenha na delinquência arregimentando novatas como ela. A falta de concisão, no entanto, não afeta a coerência interna desse enredo repleto de partícipes lidando, cada qual ao seu modo, com as demandas da circunvizinhança marcada por transgressões de tantas ordens.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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