Crítica


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Sinopse

Em Ash: Planeta Parasita, Riya, uma cientista espacial, volta a si e descobre que dois dos seus tripulantes foram violentamente mortos e um terceiro, Clarke, está desaparecido. Ela não se lembra do que aconteceu e tem um ferimento na testa, mas começa a investigar. Ficção Científica.

Crítica

Riya (Eiza González) acorda completamente atordoada numa estação espacial. Na medida em que vai se deslocando pelos ambientes desse local escuro e silencioso, ela se depara com cadáveres brutalmente desfigurados. Aos poucos, tem lampejos de uma memória perdida, nos quais vislumbra rapidamente as várias mortes acontecendo. Como qualquer personagem desmemoriada do cinema, ela é uma página em branco que precisa ser preenchida de informações. Mas como fazer isso se quase todo o restante da tripulação da nave encarregada de encontrar um novo lar para a humanidade está destroçada? Ash: Planeta Parasita lança alguns questionamentos que poderiam fazer de sua sessão uma interessante jornada por pistas vagas, sendo os principais: 1) quem Riya é?; 2) o que aconteceu aos colegas?; qual a missão que eles foram cumprir longe do planeta Terra?; são confiáveis as informações fornecidas pelo único sobrevivente além dela, Brion (Aaron Paul)? Estamos diante de um filme mais de mistério do que necessariamente de suspense, uma vez que como espectadores também tateamos no escuro, assim experimentando um pouco da sensação da protagonista. Portanto, a qualidade da trama depende, em grande parte, de como esses questionamentos serão respondidos e se outros surgirão no meio do caminho. Infelizmente esse desenvolvimento é desinteressante e genérico.

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De certa forma, todas as heroínas espaciais descendem da Ripley interpretada por Sigourney Weaver na saga Alien. Não adianta, é quase inevitável que a imagem de uma mulher tentando sobreviver a uma ameaça estranha nos corredores estreitos de uma nave espacial nos remeta diretamente à criação do cineasta Ridley Scott – que também é um paradigma no que diz respeito à fusão de horror e ficção científica. Sem cair muito na armadilha de fazer comparações simplistas como muleta argumentativa, Ash: Planeta Parasita soa como o derivado do derivado do derivado pela maneira como repete fórmulas, além de tiques de direção e decupagem característicos desse tipo de filme. No entanto, o mais problemático é como o roteiro elabora esse suposto labirinto na mente da protagonista que recupera aos poucos alguma lembranças. Os flashbacks são mais explicativos do que qualquer coisa, pois não servem para causar uma tensão entre o que aconteceu e o que está acontecendo, mas simplesmente para elucidar os enigmas que o cineasta Flying Lotus poderia “cozinhar” por bem mais tempo e com muito mais habilidade. É repetitiva a lógica de colocar gatilhos diante de Riya acionando lembranças fugazes que deveriam funcionar como peças de um quebra-cabeça instigante. Chega um ponto em que se instala o desinteresse generalizado pelas respostas de todas as perguntas do mistério chocho.

Ash: Planeta Parasita ignora o potencial dramático dos dilemas morais da personagem principal. Num primeiro momento, Riya coloca a culpa dos assassinatos numa colega desaparecida, mas nos lampejos vemos uma perspectiva em primeira pessoa dos homicídios, ou seja, é provável que a própria Riya tenha cometido tais atos. No entanto, Flying Lotus nem trabalha essa dúvida sobre a identidade do culpado e já começa a distribuir elementos facilitadores na trama que enfraquecem as demais interrogações. Brion é o companheiro que tem todas as respostas, aquele que explica à protagonista (e ao espectador) de modo muito didático onde eles estão, o que está acontecendo em termos gerais e qual a alternativa para escapar desse planeta aparentemente em tudo hostil à presença humana. O realizador não se apropria da ideia do narrador não confiável, evitando de colocar outra pulga atrás da orelha do espectador, quando na verdade o contrário seria muito mais interessante. Riya é uma página em branco ávida por respostas e informações que a ajudem a completar as lacunas, assim sendo é uma vítima perfeita para algum vilão inescrupuloso a manipular como bem quiser. Como essa incerteza não é estimulada pelo roteiro e muito menos pela direção, somos submetidos a um joguinho superficial de perguntas e respostas logo aditivado pela revelação de que muito disso é mentira.

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O que falta em Ash: Planeta Parasita é uma verdadeira atmosfera de terror, a consolidação de uma sensação de medo quando certos limites são ultrapassados. Tomemos como exemplos da ineficácia da direção a situação de um vazamento de oxigênio e a necessidade de esperar para sincronizar como o módulo espacial que pode tirar os sobreviventes dali. Nos dois casos o roteiro assinado por Jonni Remmler utiliza um dispositivo clássico do suspense, o contrarrelógio. Afinal de contas, as dificuldades das tarefas são aumentadas pelo fato de os personagens terem pouco tempo para as cumprir como deveriam. Porém, Flying Lotus não utiliza bem essa ferramenta narrativa, pois rapidamente sabota a ansiedade com mais perguntas sendo respondidas de modo protocolar. Então, o que temos não é nem um filme de mistério com qualidades suficientes para ficarmos interessados pela resolução e tampouco um exemplar de horror daqueles capazes de nos deixar angustiados, torcendo pela sobrevivência humana. Aliás, poucas coisas são tão nocivas para uma sessão de cinema, seja de qual gênero for, do que o espectador simplesmente não se importar mais com o que acontece, contando os minutos para a experiência acabar. Por fim, é compreensível apenas pela lógica do marketing que esse longa-metragem ostente um subtítulo alcagueta. Isso porque uma das principais perguntas é: “quem é o verdadeiro vilão”?

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
4
Leonardo Ribeiro
5
MÉDIA
4.5

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