Crítica
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Sinopse
Em Um Asilo Fora do Comum, após ser condenado a prestar serviços comunitários, um jovem deve trabalhar numa casa de repouso para idosos. No entanto, o que parecia ser um martírio se transforma na maior e mais transformadora experiência de sua vida.
Crítica
Já vimos esta história inúmeras outras vezes no cinema (e fora dele). O protagonista é um sujeito aparentemente “perdido”, sem perspectivas, estagnado e/ou ainda vivendo uma enorme crise. Enfim, é alguém que chegou ao fundo do poço. De repente, surge a nova chance num cenário improvável, logo refutado, mas no qual ele se vê obrigado a mergulhar. Aos poucos, o tal sujeito descobre motivações na companhia de um grupo estranho que lhe ensina valiosas lições de vida. Dentre as convenções desse tropo narrativo estão essa rasteira de um destino que prescreve paciência para escutar e aprender com os outros e o clímax com gosto de “moral da história”. É exatamente o que acontece com o protagonista de Um Asilo Fora do Comum. Milann (Kev Adams) foi criado num orfanato na companhia do irmão mais velho e, ao se tornar adulto, prefere passar seus dias diante da televisão do que encontrar um rumo. Ainda por cima, deve uma quantia considerável para o bandido da região, o que aumenta a sua miséria. Num dia, ao discutir com uma senhora enquanto trabalhava como caixa de supermercado, acidentalmente quase mata a cliente e vai parar na cadeia. O juiz o condena ao cumprimento de 300 horas de serviço comunitário num asilo. Ele não gosta de idosos, nega veementemente os termos da sentença penal, mas acaba praticamente obrigado pelo irmão a embarcar nessa. O resto é óbvio.
O andamento é previsível, mas nem é isso o que incomoda em Um Asilo Fora do Comum. O que mais diminui a credibilidade do resultado é a falta de consistência da trama e, por extensão, das subtramas utilizadas para justificar os comportamentos e as dinâmicas. Milann diz no começo que sente certa ojeriza de idosos, por isso a ideia de cumprir serviços comunitários num asilo lhe é naturalmente angustiante. O roteiro assinado por Kev Adams, Catherine Diament e Romain Lévy até tenta adicionar uma camada a isso, recorrendo depois à lembrança ruim envolvendo o abandono de um avô desalmado. No entanto, esse psicologismo parece mais uma desculpa aleatória do que algo que poderia realmente engatilhar uma sensação ruim por conta das lembranças dolorosas. Tanto que em pouquíssimo tempo ninguém mais faz sequer menção a essa suposta restrição do protagonista a idosos. Depois disso é observada a suspeita de que o administrador do asilo é um homem corrupto com intenções escusas. Porém, esse pano de fundo nunca é convincente, nem ao menos para estabelecer um inimigo propício ao nascimento do heroísmo de Milann, rapaz que evidentemente é modificado para melhor na convivência com os idosos. A trama é frouxa e isso tira a validade dela. Nada do que é dito ou falado tem peso. Há ainda o sumiço do restante da equipe quando o protagonista começa a se acostumar à rotina.
Alguns podem argumentar que Um Asilo Fora do Comum é um filme leve, para ser aproveitado justamente naquilo que tem de mais ordinário e positivo. E não estarão errados ao afirmar isso, com certeza. Todavia, o fato de se tratar de uma produção menos empenhada em revelar os dramas, tendo clara vocação por ser conciliatória e nos fazer sentir bem, não lhe dá carta branca para tudo. É paternalista essa ideia tola de que alguns filmes não merecem ser avaliados pela crítica, já que eles “não foram feitos para críticos de cinema”. Inclusive por respeito ao trabalho de artistas e técnicos, é preciso compreender que todos os filmes merecem ser considerados de acordo com diversos critérios críticos, claro, levando em consideração a compreensão das especificidades de cada projeto. Dito isso, é uma pena que o cineasta Thomas Gilou se contente em fazer um feijão com arroz medíocre, incapaz de se arriscar ao menos em alguns territórios temáticos e estilísticos, feliz em repetir fórmulas e padrões. A história é contada direitinho, há instantes em que o elenco ganha espaços para brilhar, mas falta ânimo a praticamente tudo no desenvolvimento do longa-metragem. Nem a educação sentimental do protagonista é tão relevante, sendo uma desculpa para fazer o enredo avançar. Em meio a isso, clipes musicais suprimem etapas essenciais do aprendizado que parece o fim milagroso de uma estrada torta.
Em meio à construção da responsabilidade de Milann (sintoma de seu crescimento tardio), há a história dos idosos largados à própria sorte numa instituição preocupada apenas com herdar seus bens. Essa noção de abandono é artificial, pois mais um dos aspectos dramáticos que se perdem enquanto o cineasta mantém tudo num nível seguro de positividade. Não contribui para isso a ambientação, afinal de contas o tal asilo opressor é um local sempre muito limpo, arejado, com paredes impecavelmente pintadas, ou seja, sem indícios daquilo que os personagens citam como evidências de calamidade. Muito do filme existe somente a partir das manifestações dos coadjuvantes, não sendo projetadas visualmente ou articuladas para além dos diálogos. Não há a construção de uma atmosfera de vigilância, somente algumas tomadas do chefe da equipe de segurança. Do mesmo modo, o orfanato onde Milann cresceu parece mais um castelo de contos de fadas – seria ótimo escapar ao clichê do lugar frio que causou traumas, mas não ao preço de uma idealização que gera ambientes falseados e postiços. Os melhores momentos do filme podem ser colocados na conta do experiente elenco coadjuvante, sobretudo na de Gérard Depardieu que, mesmo com um personagem fraco, sobressai em virtude de sua presença inconfundível. Tanto que a única “surpresa” acontece com o pai substitutivo que ele representa.
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Pois e...por simples a trama do filme,ele atual , trazendo uma realidade e um conteúdo de humanismo que não temos. uma humanidade Macabra, que não sabe para onde vai...