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Sinopse
Assassino experiente na mira do FBI, Alex precisa fugir das pessoas que queriam contrata-lo para um trabalho. No meio de tudo isso, a memória de Alex começa a falhar, o que o obriga a questionar todas as suas ações e vínculos.
Crítica
Liam Neeson, no início de sua carreira, parecia destinado a ser um intérprete sério, tendo atuado sob o comando de nomes como Woody Allen, John Boorman e Roland Joffé. Porém, após sua (única, ao menos até hoje) indicação ao Oscar como o personagem-título de A Lista de Schindler (1993), a maneira como o viam mudou, consagrando-se como um leading man, como se diz em Hollywood, ou seja, alguém capaz de encabeçar seus próprios projetos. Essa tendência artística perdurou por algum tempo, mas após uma série de cinebiografias que não renderam o esperado (Rob Roy, 1995; Michael Collins, 1996; Kinsey, 2004), um pequeno filme acabou fazendo a diferença: Busca Implacável (2008). Desde então tem se firmado como um astro de ação, deixando qualquer outro tipo de aspiração de lado. Assassino Sem Rastro, para se ter uma ideia, é nada menos do que o quinto projeto similar que estrela em menos de dois anos, sendo que está comprometido com outros inacreditáveis doze longas nos próximos meses. É como se fizesse sempre o mesmo tipo, com pequenas variações a respeito de suas motivações e interesses. E se o espectador está familiarizado com esse histórico recente do galã, sabe bem o que deverá encontrar por aqui.
Alguns detalhes, no entanto, fazem este resultado alcançar notas distintas. É visível o esforço do protagonista em mergulhar na figura que tem em mãos. Remake do thriller belga Alzheimer Case (2003), que por sua vez foi baseado no romance de mesmo nome escrito por Jef Geeraerts, Assassino Sem Rastro se mostra como uma leitura menos inspirada de Amnésia (2000), de Christopher Nolan. Em ambos tem-se no centro da ação um matador profissional com problemas de memória. Porém, se o drama estrelado por Guy Pearce envolvia tanto pela forma como pelo conteúdo, dessa vez essa condição só ganha mais relevo perto do término da trama. É como se essa fosse uma observação que dissesse mais respeito ao ator, no momento de compor sua atuação, e menos ao diretor ou ao roteirista. O que, evidentemente, não deixa de ser uma lástima, pois por mais que seja anunciada em diferentes passagens, só irá interferir de fato nos acontecimentos no meio de muitos outros eventos, sem alcançar o peso que se poderia supor a partir da sinopse inicial.
Neeson completou 70 anos no último dia 7 de junho de 2022, e a idade tem cada vez mais pesado também na escolha dos seus papeis. Aqui ele aparece como Alex Lewis, que também está cansado do que tem feito há tanto tempo – matar pessoas por contrato – e aceita uma nova missão com a condição de ser a última sob sua responsabilidade. Como visto em inúmeras ocasiões nesse tipo de história, seus agenciadores obviamente não permitirão que tenha acesso a um tranquilo descanso, por mais merecido que esse direito lhe seja. Então, se a situação em que se encontra era complexa a partir desse anúncio, a mesma se torna ainda mais delicada no momento em que se recusa a cumprir o que lhe foi ordenado. E isso se dá quando descobre que seu futuro alvo é uma criança. Uma espécie de código interno, pelo jeito, lhe aciona esse sinal de alerta. Como se matar adulto fosse liberado a ponto de não atrapalhar seu sono. Quando, independente de sua negativa, a garota é encontrada morta no dia seguinte, não chega a ser um mistério perceber que ele será o principal suspeito. E com isso, tanto os que lhe deram o trabalho – inconformados com sua decisão inicial – quanto a polícia – que encontra indícios de sua ligação com a vítima – partem em seu encalço.
O mais curioso é o título nacional, que não faz o menor sentido. Talvez Lewis não se recorde onde teria deixado as evidências que ligariam a mandante do crime – uma sedutora e poderosa Monica Bellucci, não indo além de sua zona de conforto, mas entregando o que dela se espera com a mesma segurança e elegância de sempre – aos seus atos, mas afirmar que ele “não deixa rastros” é quase uma piada. Afinal, todo mundo em cena sabe o que ele fez, por onde esteve e do que está sendo acusado. A ligação que estabelece com o detetive no comando desse caso (o citado Guy Pearce, outra presença de respeito) também é frágil, pois a tênue confiança que existe entre eles é mais imposta do que construída a partir de eventos e descobertas. Há muita gratuidade entre o que se diz e o que se verifica no desenrolar dos acontecimentos, pois estes só farão algum sentido ao espectador se esse abrir mão da lógica em mais de um momento. Por fim, quando qualquer ética de ambos os lados é abandonada em nome de uma “justiça feita pelas próprias mãos”, o que já estava complicado se torna ainda pior.
Martin Campbell é um diretor que se tornou conhecido pelo cinema de ação, tendo comandado nada menos do que dois sucessos da saga 007 James Bond e as duas aventuras do Zorro de Antonio Banderas. Porém, desde que cometeu o imperdoável Lanterna Verde (2011) com Ryan Reynolds, nunca mais se recuperou. Dentre a série recente de tropeços que vem realizando, talvez Assassino Sem Rastro não seja um dos piores, por mais que esteja também longe de se mostrar minimamente memorável (e a relação com o batismo original é mera coincidência). Neeson continua se provando competente no que faz, e está cercado por coadjuvantes de talento. Porém, a trama que os envolve é mal desenvolvida, assim como a condução de Campbell se mostra frouxa, até mesmo desajeitada em algumas passagens (a luta pré-explosão no estacionamento é particularmente constrangedora). Não fará ninguém pedir pelo dinheiro do ingresso de volta na bilheteria do cinema, mas também não ajuda nenhum dos envolvidos a recuperar parte do status que já desfrutaram em um passado não muito distante.
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