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Crítica


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Sinopse

Um iminente desastre. Um caso de amor a esconder. Um casamento a ser preparado.

Crítica

Às vezes o resultado de um filme é ditado mais pelas oportunidades que deixa de abraçar e por eventuais omissões. O Noivo da Minha Amiga perde valiosas oportunidades de ser mais que uma comédia romântica banal sobre alguém abrindo-se ao amor. Depois do sexo casual entre Marina (Belén Cuesta) e Carlos (Álex García), é instalada a confusão proporcionada por uma coincidência das que surgem como uma espécie de pegadinha sarcástica do destino. Ele tem um relacionamento estável com Alexia (Silvia Alonso), que na infância praticava bullying contra a amante de ocasião do namorado. Também faz parte dessas casualidades o fato de Marina ser uma planejadora de casamentos, de seu cartão ter sido encontrado acidentalmente por Alexia e de Carlos não ter coragem para assumir a infidelidade. Está armada uma bagunça típica desse tipo de trama empenhada em mostrar desencontros e erros se avolumando até as devidas lições serem aprendidas e o certo prevalecer. Para aumentar o déja vu, surge a muito reiterada lógica “casa de ferreiro, espeto de pau”.

Porém, o grande desperdício de O Noivo da Minha Amiga – título estranho, pois as mulheres sequer são amigas – é a utilização frouxa do dado financeiro como ponto de pressão sobre a vida sentimental. Marina apenas aceita se encarregar dos trâmites do enlace por conta das dificuldades financeiras pelas quais sua empresa passa. Entre o coração e a manutenção do negócio, imediatamente fala mais alto a necessidade de subsistir no ramo. O traço também aparece como elemento definidor das decisões de Carlos. De olho no contrato graúdo com o futuro sogro sobre o projeto dos próximos hotéis de uma franquia luxuosa, o arquiteto se pega cedendo às consequências dos enganos e tentando asfixiar o amor sentido repentinamente pela mulher com quem teve a rápida aventura. Mas, esse dado importante, principalmente porque aparece como categórico ao casal formado aos trancos em barrancos, é subaproveitado pelo cineasta Dani de la Orden, logo soterrado por convenções. É negligenciado até como contraponto frio ao calor das emoções que tendem a prevalecer.

Outra fragilidade de A Noiva da Minha Amiga está no desenho tortuoso do percurso emocional de Marina. Obviamente, ela não foi afetada de um jeito afetivo pela noite com Carlos, tanto que demonstra embaraço tão logo ele desponte na empresa, chegando a acusa-lo de invasivo. Tudo muda quando nota que o sujeito trouxe a reboque a então noiva, sua antiga desafeto. A impressão passada é que as atitudes após isso, incluindo aí o amor supostamente avassalador que lhe toma, advém de uma mágoa recalcada e que, por conta das circunstâncias, vem à tona. À medida que a história se desenvolve, lotada de lugares-comuns e cenas cômicas de gosto duvidoso, fica ainda mais difícil diagnosticar se as patacoadas da organizadora de casamentos são fruto de uma rivalidade reacendida ou da paixão sentida pelo sujeito tomado de dúvidas. Quem dera à própria personagem fosse conferido o benefício dessa dúvida, ou se, ao menos, o realizador demonstrasse consciência de que as coisas podem se misturar. A fatura acaba sendo indefinida em função dos efeitos ligeiros e imediatos.

Ainda no que diz respeito ao desenrolar óbvio do enredo, ele é permeado por um humor oscilante entre o gracioso e o pastelão. Indícios da primeira vertente são mais raros. Já quanto à segunda, os exemplos são abundantes, tais como a sucessão de equívocos na cerimônia inicial, com direito a fogo no altar e outros escrachos improváveis. A conversa com o empresário da banda, especificamente a prova à qual ele submete os pombinhos – com isso permitindo que os turrões aceitem seus sentimentos – beira o risível (no mau sentido) pela artificialidade da situação. Igualmente entra nessa onda a cena de Marina despropositadamente interrompendo a entrevista do padre com revelações convenientes ao roteiro (pois engatilham um conflito vital), mas demasiadamente abruptas e encenadas como se fizessem parte de num programa humorístico televisivo de esquetes rápidas. O Noivo da Minha Amiga reafirma sua vocação aos desperdícios ao sabotar o potencial da surpresa observada no altar, preferindo agarrar-se aos chavões como ordinários salva-vidas.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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