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Crítica


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Sinopse

Lorraine Broughton é uma agente disposta a enfrentar qualquer desafio e a usar todas as suas habilidades para sobreviver à uma missão impossível. Após a queda do muro de Berlim, a assassina mais brutal do MI6 é enviada à cidade para recuperar um dossiê de valor inestimável. Ela se une ao chefe da estação local, David Percival, e se envolve em um jogo letal de espiões.

Crítica

O corpo severamente castigado de Lorraine (Charlize Theron) é um mapa vivo ao entendimento do que aconteceu em sua missão na Alemanha, um pouco antes da queda do muro de Berlim. Cheia de marcas das batalhas travadas em meio à intricada trama que envolveu espiões, listas importantes, conspirações e agentes duplos, ela chega à sede do MI6, o serviço secreto de inteligência britânica, para prestar depoimento. Sendo assim, quase tudo o que vemos em Atômica é fruto do relato da protagonista aos homens, alguns deles hierarquicamente superiores, a quem conta os pormenores da estadia conturbada no território germânico. O filme se baseia na graphic novel The Coldest City, de Antony Johnston e Sam Hart, e busca inspiração, especialmente no que tange ao tom empregado para desdobrar as intrigas, na vasta cinematografia estadunidense que igualmente se instaurou nos tempos da Guerra Fria, mais especificamente na fronteira entre o oriente e o ocidente alemães.

O cineasta David Leitch, do ótimo De Volta ao Jogo (2014), mostra novamente expertise para conduzir espetáculos de ação. Atômica possuiu algumas cenas realmente de tirar o fôlego, sendo a mais virtuosa delas a luta da servidora britânica com os inimigos russos nas escadas. É um plano-sequência impressionante, cuja primazia é registrar a fisicalidade do embate, com os corpos perdendo sangue e sendo deformados na medida em que se embrenham numa briga evidentemente mortal. Contudo, há duas fragilidades patentes. Uma delas é o roteiro, incapaz de criar um interesse inabalável pelo labirinto proposto à verdade, um caminho repleto de pequenas reviravoltas – com as contumazes quebras de confiança, parceiros demonstrando lealdade ao “inimigo”, entre demais recorrências do filão – que não dão conta de suscitar apreensão. A outra é Lorraine, não necessariamente por debilidade do trabalho de Charlize Theron, mas em virtude de sua concepção monocórdica, de infalibilidade artificial.

Lorraine é uma personagem unidimensional, incorruptível subordinada à coroa, destoando dos colegas que serpenteiam e mudam de posição ao sabor das trocas de poder. Ela é uma espécie de heroína sem pontos fracos e, portanto, mais próxima de um autômato, embora os desdobramentos do enredo deem conta de uma complexidade de intenções que, inclusive, serve ao plot twist do final. No mais, a protagonista de Atômica é incapaz de esboçar sentimentos ou mesmo vacilar diante da possibilidade de falhar miseravelmente na tentativa de recuperar o arquivo que pode, segundo palavras de seu chefe imediato, prologar a Guerra Fria por mais 40 anos. A título de comparação, o dúbio David Percival (James McAvoy), responsável pela base alemã do MI6, virtual parceiro de Lorraine nessa empreitada perigosa, possui bem mais espessura dramática e densidade, demonstrando-se humano e, portanto, instável, o que faz muito bem ao longa-metragem, pois proporciona ao espectador o benefício da incerteza.

Há aqui momentos de ação excepcionalmente bem coreografados e executados. A fotografia a cargo de Jonathan Sela é outro ponto forte, pois se vale das cores neon, um dos ícones dos anos 80, para banhar frequentemente o rosto dos personagens, sobretudo durante instantes reflexivos e/ou de calmaria. Aliás, a década mencionada é aludida sobremaneira pela trilha sonora. Pérolas facilmente associáveis ao período, pois de sucesso retumbante nele, como Father Figure, de George Michael e Cities In Dust, da Siouxsie And The Banshees, para citar somente duas de várias, emolduram incessantemente os acontecimentos. Ao passo que avança, a missão de Lorraine perde relevância frente à apresentação de suas instâncias, ou seja, o estilo se torna mais determinante que a história ou suas reverberações. No que tange à espionagem, Atômica é praticamente um produto genérico, derivado da tradição cinematográfica (oitentista) ambientada nos arredores do famigerado muro de Berlim.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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