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Sinopse

Após uma tragédia pessoal, Howard entra em depressão e passa a escrever cartas para a Morte, o Tempo e o Amor, algo que preocupa seus amigos. Mas, o que parece impossível se torna realidade quando essas três partes do universo decidem responder. Logo, Morte, Tempo e Amor vão tentar ensinar o valor da vida para o protagonista.

Crítica

Se na primeira metade do século XX a produção de trailers para cinema era uma atividade quase descartável, sem que se desse muita atenção, foi lá pelos anos 1950 que a coisa começou a mudar de figura (Hitchcock era um dos grandes defensores desse exercício de concisão e marketing). É possível dizer que o auge dessa arte de venda e promoção de filmes foi durante os anos 1980 e 1990, para logo em seguida, com a virada do milênio, a situação se encaminhar para um crescente desconforto. E se até há pouco tempo estes previews pareciam versões reduzidas dos longas que, supostamente, deveriam despertar curiosidade, entregando de antemão toda e qualquer possível revelação da história, agora estamos em um outro momento, em que passou-se a mentir descaradamente a respeito do enredo em questão para o incauto espectador. Quem viu o recente Passageiros (2016) percebeu isso com clareza. E aqui temos mais um novo exemplar dessa infeliz corrente: Beleza Oculta pode ser tudo, menos aquilo que anunciava. E isso é ruim, muito ruim.

Com apenas dois minutos para dispor, o diretor David Frankel decidiu que seria preciso convencer sua eventual audiência de que o personagem de Will Smith era um pobre sofredor que, num momento mágico do destino, recebe a visita de três entidades – a Morte, o Tempo e o Amor – para reaprender a viver após uma grande desilusão. Bom, não é preciso muito tempo em cena para que se descubra que o roteiro de Allan Loeb (o mesmo de bobagens como Rock of Ages, 2012, e Esposa de Mentirinha, 2011) é bem mais ardiloso – e cínico – do que isso. O que temos em cena, afinal, nada mais é do que uma jogada financeira. Após a morte da filha pequena, Howard (Smith) entrou em uma rota aparentemente sem fim de autocomiseração. Sua falta de ânimo é tamanha a ponto de prejudicar seu desempenho nos negócios, atrapalhando a performance da agência de propaganda da qual é sócio com Whit (Edward Norton). Esse, preparando-se para o pior, decide vender a empresa, mas para isso precisa da concordância do colega. Para tanto, elabora um plano para ludibriá-lo, contratando três atores que, ao se fazerem passar pelos tais espectros, possam, enfim, enganá-lo.

É claro que no meio desse nem tão tortuoso caminho, Whit e seus comparsas no crime – a secretária dedicada (Kate Winslet) e o gerente financeiro (Michael Peña) – também terão uma ou outra lição a aprender. O problema, no entanto, não chega a ser essa inversão no jogo, mas a obviedade com quem estas peças são dispostas pelo tabuleiro. Senão, vejamos. Whit perdeu o casamento e a afeição da filha pequena após trair sua esposa. É por isso que será ele que irá lidar com o Amor (Keira Knightley, em um desempenho tímido e quase irrelevante). Claire (Winslet), por sua vez, dedicou a vida ao trabalho, e por isso agora, já com certa idade, está se perguntando se não seria o caso de recorrer a um banco de esperma para conceber uma gravidez independente. Quem lhe cabe, portanto? O Tempo (Jacob Latimore, surpreendentemente, o mais seguro dentro do estereótipo que lhe é proposto). Por fim, Simon (Peña) descobriu há pouco estar tomado por um câncer irreversível, e tudo que deseja é deixar as coisas encaminhadas para sua família. É por isso que terá pela frente um duelo com a Morte (Helen Mirren, divertindo-se um pouco além da conta com o pouco que lhe é oferecido).

Mas os círculos limitados de Beleza Oculta não se restringem apenas a este jogo de toma-lá-dá-cá. Afinal, uma das artimanhas mais irritantes da trama é a que diz respeito à própria jornada de recuperação do protagonista. Will Smith, em atuação sorumbática, é o pai que sofre pela perda inestimável. Qual a questão evidente a se fazer a seguir, portanto? Quem formulou “e a mãe, onde está?”, acertou. Pois bem, essa inexiste, não sendo nem mesmo citada. O esforço para eliminá-la é tão grande que só consegue o efeito oposto, chamando atenção para tal ausência. E quando se olha para os lados e percebe-se que há apenas uma mulher – a conselheira vivida por uma Naomie Harris que já teve melhores dias – próxima a ele, não chega a ser particularmente complicado somar um mais um. Surpresa, mesmo, é se dar conta que o único a não vislumbrar o quão ridícula é essa pretensa “reviravolta” (até M. Night Shyamalan ficaria envergonhado) é Frankel, cineasta que teve um acerto em sua carreira (O Diabo Veste Prada, 2006), mas desde então só tem dado pisado na bola (Marley & Eu, 2008, e Um Divã Para Dois, 2012, por exemplo).

Will Smith já foi o maior astro de Hollywood (até Hancock, 2008, para ser mais exato), mas desde que decidiu que o que lhe faltava é um Oscar (algo que até Tom Cruise parece já ter desistido, e por isso tem aproveitado muito mais), tem dado um fora atrás do outro. Começou com o ingênuo Sete Vidas (2008), seguiu pelo insuportável Um Conto do Destino (2014) e resvalou no subestimado Um Homem Entre Gigantes (2015). E se alguém ainda achava que Esquadrão Suicida (2016) havia sido o ponto baixo dessa trajetória, aqui está Beleza Oculta para provar que é sempre possível ir além (ou seria aquém?). Maniqueísta e manipulador, tem-se aqui um filme que, não contente em menosprezar os personagens arregimentados, também peca por desprezar a inteligência e perspicácia de seu público, fazendo uso de recursos vazios e discursos empolados para trafegar por um nada que apenas figuras esquemáticas e mal construídas como essas poderiam ousar se aventurar.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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