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Sinopse

Traído por Messala, seu meio-irmão, Judah Ben-Hur é feito escravo e mandado para longe da família. Porém, o militar deposto irá galgar degraus para retornar e ter sua vingança, enquanto sua história cruza e avança paralelamente a de Jesus Cristo.

Crítica

A primeira versão cinematográfica do romance de Lew Wallace data de 1907 – trata-se de um curta em preto e branco de apenas 15 minutos. De lá pra cá já houve uma dezena de outras adaptações – o Ben-Hur de 1925 tinha 2h23min e era bem mais ambiciosa, enquanto que a de 2010 era uma minissérie feita para a televisão com 3h no total. Nenhuma, no entanto, possuía a magnitude ou obteve a mesma repercussão de Ben-Hur (1959), com Charlton Heston como protagonista – e que tomava quase 4 horas em sua totalidade. Este filme não só se tornou um clássico reconhecido até hoje, como foi um sucesso de bilheteria na época e recordista no Oscar, vencendo em 11 categorias – entre elas, Melhor Filme, Direção e Ator. Pois eis que o russo Timur Bekmambetov surge agora com o seu Ben-Hur, oferecendo uma roupagem mais dinâmica ao eterno conto de vingança e perdão. Estes dois extremos são simbolizados pela ascensão do Império Romano e pelo surgimento de Jesus Cristo, porém o diretor se mostra indeciso entre um caminho ou outro: se por um lado a selvageria e a violência ganha ares mais midiáticos, por outro a volta por cima e reconciliação de alguns personagens soa tão artificial que chega a ser difícil encontrar alguma naturalidade passível de identificação neste processo.

Judah Ben-Hur (Jack Huston, em composição convincente e em uma das melhores performances de sua carreira) é um príncipe judeu que precisa lidar com o crescimento do poder de Roma em sua vila. Sua pedra no sapato? O general enviado para liderar os esforços colonizadores é ninguém menos que seu irmão de criação, Messala (Toby Kebbell, unidimensional e incapaz de convencer em cada mudança de atitude). Este abandonou anos atrás a casa que o criou simplesmente por estar apaixonado pela meia-irmã e este relacionamento ser contrário às intenções maternas – ele decidiu que precisava provar por conta própria ser um homem de valia. Para tanto, toma o pior rumo possível, revelando um rancor quase inexplicável. Este amargo que carrega atinge o ápice quando, durante o desfile de chegada de um patrono romano, uma confusão se dá e sua antiga família é encarada como rebelde. Ao invés de desfazer o mal-entendido – provando altivez e magnitude – ele simplesmente dá seu aval a uma injusta condenação: Judah é vendido como escravo, enquanto que sua mãe e irmã são trancafiadas numa masmorra.

O que se passa a seguir é a jornada de recuperação do herói. Ele vai parar no porão de um navio de guerra como remador, apenas para que, durante uma batalha, um acidente acabe deixando-o náufrago, até parar em uma praia distante. Lá, é encontrado por um criador de cavalos (Morgan Freeman, com a mesma austeridade de sempre), que não só lhe salva como lhe oferece uma oportunidade de sonho: liderar seus animais em uma corrida de bigas contra o mais famoso campeão dos romanos: Messala! A cena clássica, que na versão de 1959 levava mais de duas horas para tomar o centro da ação, é a que abre esta nova leitura, deixando claro quais são as reais intenções por aqui: velocidade e adrenalina, relegando qualquer tipo de reflexão a um segundo plano. E se estes momentos eletrizantes se dão não apenas no duelo entre os dois inimigos-irmãos, mas também em alto mar ou mesmo nas provações pelas quais o protagonista se vê obrigado a enfrentar em seu caminho de volta à casa, todo o embate filosófico que justificaria tamanho distanciamento entre dois homens criados em um mesmo ambiente e em condições similares praticamente se perde, restringindo o nível do embate entre eles ao plano mais raso possível.

E é nesta questão que entramos na maior mudança do Ben-Hur de 2016 em relação ao Ben-Hur de 1959: a presença de Jesus Cristo. Pois se no longa que se tornou icônico um dos maiores motivos de interesse era acompanhar a trajetória deste bravo lutador em paralelo à do Filho de Deus, com este sendo sempre uma eminência parda, sentida porém não vista, tais momentos tangenciais entre eles se desfazem. Bekmambetov tira o Cristo das sombras e lhe dá não apenas voz, mas também rosto: o do brasileiro Rodrigo Santoro. Se esse tem postura e atitude que lhe confere a imponência necessária ao personagem – algo semelhante ao que ele fez em 300 (2006), porém no tom completamente oposto – suas intervenções terminam por soarem forçadas demais, e não por inabilidade dele (muito pelo contrário), mas pela ausência de elementos narrativos que a justifiquem. Afinal, enquanto a audiência ainda está tentando entender o que deu errado entre os dois irmãos, Jesus aparece com suas frases de efeito por um ou dois instantes, apenas para sumir e retornar cerca de uma hora depois. Não lhe é oferecida a chance de criar profundidade, nem como parábola para a trama central, e muito menos como exemplo para os demais personagens, uma vez que ele pouco interfere em seus destinos.

Se muito é amenizado em relação ao enredo original – a relação de Judah como apadrinhado de um romano, por exemplo, é completamente eliminada – o demais que permanece – como a lepra que tomará conta das mulheres de sua família – acaba sendo reduzido à mínima citação, apenas para ter algum tipo de efeito em uma conclusão forçada e nada convincente. O Ben-Hur que agora nos deparamos atinge com razoável competência suas intenções. A se lamentar, no entanto, é que estas visem apenas um retorno imediato, denotando quase nenhuma preocupação com o ressoar de seus acontecimentos junto ao espectador ou mesmo em oferecer qualquer tipo de mensagem mais pertinente, ainda mais envolvendo figuras como as aqui expostas. É um filme grandioso, no qual se percebe como foi gasto o orçamento de mais de US$ 100 milhões, mas que sucumbe diante desta própria ostentação – afinal, como os exemplos anteriores já provaram, poderia ter-se alcançado muito mais, com menos. Bastava, para isso, se focar no que realmente importa, sem perder tempo com distrações que até podem funcionar como atrativos, mas que não resistem a uma análise mais depurada.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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