Crítica
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Sinopse
Em um futuro distópico em que próteses biônicas redefinem os esportes, duas irmãs competem no salto em distância. No entanto, a rivalidade as coloca em um caminho sinistro.
Crítica
A premissa de Biônicos é muito interessante. A história se passa no ano de 2035, num mundo diferente do nosso por conta do sensível avanço tecnológico que permite a existência de próteses biônicas de altíssimo desempenho, artefatos que alteram drasticamente certos setores. Assim, pessoas que tiveram membros amputados, em vez de sofrer com qualquer desvantagem, tornam-se praticamente super-heróis por conta dos ganhos físicos impressionantes. A protagonista é Maria (Jessica Córes), filha de uma ex-campeã de atletismo, treinada desde cedo para ser a substituta natural dessa mãe lendária. No entanto, a encontramos mergulhada num poço de ressentimento em virtude do sucesso da irmã caçula, Gabi (Gabz), atleta que sobressai nos jogos paralímpicos ao ponto de ser recordista mundial e a eclipsar. Então, a primeira lógica prontamente estabelecida no filme é: esportes biônicos se tornaram tão espetaculares, pelo desempenho sobre-humano, que escantearam as modalidades “comuns”. No entanto, o roteiro assinado por Josefina Trotta não abre espaços significativos para compreendermos melhor essa mudança de estatuto, no máximo dando algumas pistas via patrocinadores ambiciosos. Como a ação de Heitor (Bruno Gagliasso), sujeito que atua no submundo, é de certa forma influenciada por esse abandono dos competidores sem prótese, a falta de um bom contexto é muito sentida.
Biônicos chama a atenção pela incursão brasileira na ficção científica, gênero geralmente pautado por investimentos em tecnologia de pós-produção que tendem a inviabilizar produções de qualidade em cinematografias periféricas. O cineasta Afonso Poyart e sua equipe contornam bem essas restrições ao apresentar as peculiaridades de um futuro imediato. Os personagens circulam pela metrópole caracterizada por publicidades gigantes em movimento, todos utilizam aparelhos celulares de telas translúcidas e as próteses são críveis. Nota-se que a direção de arte assinada por Eduardo Schaal se preocupa em não pesar a mão nesse desenho de futuro, uma vez que ele seria pouco mais de uma década à frente do que estamos vivendo. Feita essa ressalva positiva, precisamos falar sobre outros problemas estruturais desse longa-metragem que almeja ser um melodrama familiar com pano de fundo sci-fi e dá com os burros n’água. Poyart havia sido bem-sucedido no comando de uma produção em que o esporte emoldurava a relação entre pai e filho. Com Mais Forte que o Mundo (2016) ele acertou ao ressaltar a complexidade da tarefa de superar a figura paterna para se emancipar de uma influência nem sempre positiva. Infelizmente, aqui ele não atinge semelhante resultado, principalmente porque trata os laços afetivos entre irmãos, pais e filhos com displicência, às vezes os banalizando muito.
Na verdade, Afonso Poyart tem sérias dificuldades para trabalhar com diversas frentes, por isso Biônicos resulta em algo apressado e sem consistência. Enquanto desenha uma disputa genérica entre irmãs aspirantes ao Olimpo do esporte mundial, ele vai encaixando outras figuras que deveriam melhorar a nossa percepção desse universo, mas que acabam virando distrações. Um desses personagens pouco relevantes é o detetive interpretado por Danton Mello, alguém que tinha tudo para ocupar espaços valiosos numa trama que rapidamente assume contornos policiais. Mas, ele é restrito a poucas cenas realmente importantes e a um modus operandi meio automático. Já o vilão de Bruno Gagliasso vai perdendo camadas de humanidade à medida que a trama avança com Maria sendo pervertida pelo sistema e induzida à trapaça. No começo ele parece um benfeitor que utiliza métodos escusos, ou seja, alguém com certa ambiguidade moral. No entanto, rapidamente, se transforma numa inofensiva caricatura vilanesca que contribui para a diminuição das nuances da trama. Por falar na danação de Maria, Poyart perde uma oportunidade de ouro ao não conseguir transformar esse trajeto em tragédia pessoal clássica, com a personagem penhorando suas moral e ética ao perder a queda de braço com o “sistema”. Como o “sistema” nunca é investigado profundamente, o efeito colateral é esse esvaziamento.
Na medida em que o enredo progride, tudo em Biônicos parece gratuito demais para soar instigante. A rivalidade entre as irmãs é resumida a pequenos embates antes e depois dos treinos e das provas, a tendência trágica do irmão Gus (Christian Malheiros) se torna uma nota de rodapé e até as disputas esportivas viram movimentações protocolares. Para engrossar ainda mais as fileiras dos coadjuvantes meramente ilustrativos, temos o homem da tecnologia vivido por Paulo Vilhena e o absolutamente desperdiçado pai interpretado por Nill Marcondes. Eles ajudam a compor um ecossistema falsamente amplo, pois não são relevantes o suficiente para que outros territórios desse meio ambiente futurista sejam devidamente explorados. O filme não se esforça minimamente para mostrar como demais setores da sociedade são influenciados pela existência dos biônicos, uma demanda justificável a partir do momento em que as próteses são utilizadas para praticar delitos e reforçar as fileiras da criminalidade. Outro ponto que enfraquece demais o conjunto é a falta de espessura na motivação dos personagens. Não basta alguém dizer em cena o porquê faz determinada coisa, é preciso que esse combustível esteja visível nas ações e hesitações, nos acertos e erros, senão as falas viram enunciados pobres. O clímax cada vez mais estapafúrdio e menos interessante dá o tom da superprodução que começa sendo um drama familiar emoldurado pelo sci-fi e termina querendo ser filme de super-herói.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 4 |
Francisco Carbone | 2 |
Alysson Oliveira | 1 |
MÉDIA | 2.3 |
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