Crítica
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Sinopse
Crítica
O cinema é definido, desde os seus primórdios, como uma experiência coletiva. Todavia, a partir do surgimento dos aparelhos de home vídeo, a começar por videocassetes, passando por DVD e Blu-Ray, chegando ao atualmente dominante streaming, o ato de assistir a filmes está ficando cada vez mais privado, por incontáveis motivos. Black Mirror: Bandersnatch é um passo adiante no sentido de transmutar a vivência cinematográfica em algo pessoal e praticamente intransferível, impossível de ser compartilhada em sua totalidade, pois absolutamente dependente das vontades de cada espectador. Por esse lado, traz consigo algo de assustador e apocalíptico. Mas, por outro, apresenta um caminho instigante que, verdade seja dita, apenas funciona porque essa narrativa, específica, é fundamentada em diferentes esferas metalinguísticas se entrelaçando. Portanto, nessa jornada interativa, não se trata apenas de decidir entre A ou B, mas de fruir as escolhas, de entender efeitos de umas e gozar da possibilidade confortável de voltar atrás ocasionalmente.
Parte do universo Black Mirror, uma das séries mais elogiadas e bem-sucedidas da atualidade, Black Mirror: Bandersnatch é protagonizado por Stefan (Fionn Whitehead), jovem programador de entretenimentos eletrônicos que está trabalhando no projeto ousado da adaptação aos games de um livro interativo. Bandersnatch é tanto o nome de uma criatura fictícia presente na obra do escritor Lewis Carroll quanto o título de um jogo verdadeiro, produzido pela Imagine Software nos anos 80 – mesma década em que o filme se passa –, mas nunca lançado. Somente com essa breve descrição já é possível perceber as camadas se sobrepondo, com a realidade fornecendo personagens e fatos à ficção construída na tela pelo cineasta David Slade. O espectador é instado a fazer escolhas frequentemente, das banais, se o jovem deve comer cereal ou uma guloseima diferente, às complexas, como o jeito adequado de responder às consideráveis pressões que os prazos de finalização de um trabalho impõem. É estimulante a trama progredir basicamente de acordo com o direcionamento de quem possui o controle remoto. Mas, essa liberdade é relativizada, nunca tornada plena.
Black Mirror: Bandersnatch, como um game, “trava” em certos pontos, isso caso as preferências levem ao fracasso. Assim, é engenhosa a maneira como a estrutura oferece a possibilidade de retorno, direcionando caminhos pontualmente para que o enredo “destrave” e a história possa caminhar a um dos cinco finais possíveis. Mais que necessariamente disponibilizar uma sensação de onipotência, o longa-metragem confronta o espectador com as consequências de escolhas erradas, como ceder à emoção e aceitar irrestritamente o convite do empresário para se instalar na desenvolvedora. Bem como acontece nos jogos eletrônicos, para avançar devidamente é necessário acumular alguma bagagem sobre os personagens, experimentando seus lados autodestrutivos, por exemplo, a fim de que entendamos claramente a necessidade de tomar direções contrárias às tortuosas de antes. Está justamente na forma como se apropria da interatividade a grande qualidade dessa produção. As quebras da quarta parede desempenham uma função vital nesse sentido.
Lá pelas tantas, Stefan começa a questionar integralmente a sua realidade, mencionando a sensação de ser controlado diretamente por alguém (nós, antes passivos, agora de controle remoto na mão, como agentes da narrativa). O labirinto metalinguístico se intensifica na medida em que isso ganha explicações diversas. Black Mirror: Bandersnatch é exitoso exatamente porque opera dentro do mundo tecnológico de Black Mirror, no qual sempre foram questionados, por exemplo, princípios da virtualidade e da consciência humana. É particularmente difícil classificar o filme, senão como experiência de vanguarda, de teor bastante característico, que dificilmente pode ser reproduzida em larga escala, por diversos motivos, dentre eles os de ordem prática. Sobressai a curiosidade quanto aos demais encerramentos, mas o que nos foi permitido possui um tom melancólico muito condizente com os preceitos da marca que, mais uma vez, lança indagações sobre o futuro, desta feita, inclusive, o do próprio cinema, seja como viagem coletiva ou jornada solitária e egoísta.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 8 |
Robledo Milani | 2 |
MÉDIA | 5 |
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