Crítica
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Sinopse
Prestes a se casar, Roman decide fazer uma despedida de solteiro com seus amigos e o irmão numa mata fechada. No entanto, muitas coisas não planejadas começam a acontecer.
Crítica
O começo de Caça Invisível é muito promissor, sobretudo porque nele há a sugestão de elementos para além dos que estamos efetivamente enxergando. Roman (David Kross) vai se casar e decide fazer sua despedida de solteiro numa incursão com os amigos pela floresta. Em meio aos deslocamentos por terra e água, o cineasta Thomas Sieben lança mão de recursos para insinuar o perigo. A câmera desliza cuidadosamente (como se estivesse esperando algo acontecer) pelo cenário cheio de folhas secas, galhos retorcidos e raízes à mostra. O efeito é incutir no espectador a noção de que a morte espreita por ali. E isso é potencializado no acidente quase fatal com um dos sujeitos que escorrega próximo a uma fenda no chão. Essa construção é tão minuciosa que até quando apenas quatro dos cinco homens estão no quadro isso gera uma apreensão capaz de incentivar as nossas expectativas. Aos poucos, os indícios ficam menos sugestivos, como quando se ouvem tiros distantes – “é temporada de caça”, menciona um deles para o alívio momentâneo dos demais – ou na cena de um vulto ao longe que sai do campo de visão como se quisesse manter-se incógnito da câmera. Alguém leva um tiro de raspão aparentemente acidental, os disparos vão se tornando menos aleatórios e a situação fica dramática.
Depois do início auspicioso, certas perguntas se impõem aos personagens e ao espectador: quem está atirando propositalmente nos amigos? Qual é a motivação da pessoa para atentar contra a vida de desconhecidos? Infelizmente, em vez de manter pelo menos mais um pouco a dúvida – assim fazendo da incompreensão um combustível do absurdo –, o realizador logo se deixa contaminar por uma praga dos nossos dias e começa a explicar a natureza daquilo tudo. Sintomaticamente, os personagens se referem ao atirador misterioso como “ele”, partindo do pressuposto (grande parte verdadeiro) de que homens são mais agressivos do que mulheres. No entanto, antes do que deveria, somos expostos ao agressor misterioso. É uma mulher estranha, que não fala, sequer ofendendo às vítimas antes de executá-las a sangue frio. Curiosamente, algumas cenas idílicas do passado recente do protagonista com a noiva, bem como as conversas truncadas com o irmão mais velho, ensaiam transformar essa dinâmica numa alegoria. Seria o disparate uma forma de projetar simbolicamente as diferenças familiares ou mesmo de colocar um freio na euforia do rapaz prestes a se casar? Essas são outras questões alimentadas pela direção, mas rapidamente soterradas por esclarecimentos que as banalizam.
O grupo é formado pelo protagonista, seu irmão e mais três amigos. Uma vez que Thomas Sieben (também encarregado do roteiro) aponta à importância dos abismos entre o primogênito e o caçula, não é difícil prever quais personagens serão abatidos antes. A partir dessa noção, Caça Invisível deixa excessivamente exposta a sua fórmula. Os agregados descartáveis servem o quanto pesam suas características à ênfase do cenário bizarro: um é o medroso retardatário; o outro é o pragmático que conhece a floresta; e o terceiro é o egoísta/agressivo de marca maior. Já no que diz respeito aos irmãos David e Albert (Hanno Koffler), há evidentemente algo mal resolvido entre eles. Também não é a missão mais árdua do mundo compreender o que está acontecendo, pois o realizador sublinha as interações dos irmãos com as lembranças de alguém. É formado um triângulo. O filme fica excessivamente indeciso entre observar as desavenças e encarar a ameaça da mulher que segue matando impiedosamente. Como não abraça o texto e tampouco o subtexto vigorosamente, o longa-metragem gira repetidamente em torno das mesmas situações e progride de modo esquemático. Pelo menos o espectador não fica em posição confortável enquanto as dúvidas permanecem.
Mas, quando o longa-metragem parece esgotado por falta de estratégias para diversificar essa jornada, o cineasta aperta uma espécie de botão de segurança para, talvez, não perder a adesão da plateia. Ele cria uma cena gratuita, conveniente e artificial, na qual David fica sabendo exatamente o porquê a assassina os persegue. Demonstrando uma impressionante falta de personalidade, Thomas Sieben recorre a um expediente surrado dos filmes de horror/suspense: o personagem encontra um tutorial de pretextos e porquês. David entra sorrateiramente na casa da antagonista e um vídeo está convenientemente no ponto (sim, é só ele dar play) no computador da enigmática homicida. Assim, o realizador nem deixa espaço para os criadores de conteúdo do tipo "explicando o final", já que apresenta a filmagem de celular que esclarece como uma violência causou uma tragédia e gerou uma resposta não menos agressiva. E essa predisposição por explanações é reiterada na revelação do segredo que separa os irmãos. Podemos supor que Caça Invisível seria muito mais (in)tenso se não estivesse tão preocupado em, no fim das contas, deixar o espectador confortável por ter compreendido tudo. Uma vez contemplada a lógica, há pouco a ser expandido nesse filme que começa apostando lindamente no poder da sugestão/ indefinição e acaba como outro exemplar “bula de remédio”.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Marcelo Müller | 5 |
Leonardo Ribeiro | 3 |
MÉDIA | 4 |
Um suspense interessante, bom roteiro, elenco formidável e trilha sonora escolhida a dedo. Excelente filme, recomendo!