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Sinopse

Foi na década de 1970 que começou o processo de assoreamento da Baía de Sepetiba, e isso por causa da implantação da Zona Industrial. Isaura e João vivem na pacata região. Ela faz e desfaz um crochê, alegando que é sua única distração naquele lugar, e ele, pescador, promete trazer todos os peixes do mundo caso ela pare com essa mania. Mas João é obrigado a ir cada vez mais longe nesta busca, e Isaura segue esperando por ele, em meio à solidão.

Crítica

Os letreiros finais de Cada Vez Mais Longe dão conta de denunciar a degradação da Baía de Sepetiba, no litoral do estado do Rio de Janeiro. Fala-se de assoreamento, pesca predatória, vilipêndios em escala industrial. Os diretores Eveline Costa e Oswaldo Eduardo Lioi decidem, assim, finalizar o longa-metragem alterando o seu tom, pois até ali pouco levava a crer numa intenção de queixa ou lamento por conta da situação ambiental daquele lugar considerado outrora um paraíso. Quando muito dá para perceber, em meio às deambulações dos jovens João (Fernando Alves Pinto) e Isaura (Branca Messina), a tentativa de esquadrinhar ligeiramente as transformações do ambiente, embora o foco permaneça encoberto pela necessidade de ser plasticamente bonito, sem fundamentalmente estofar a exuberância com algo que trate de dirimir sua efemeridade. É um exercício de estilo combalido pela inocuidade.

A câmera registra o cotidiano do casal protagonista. Ele, sempre preparando o retorno ao mar. Ela, entediada às margens, frequentemente fazendo crochê. Os diálogos de Cada Vez Mais Longe são fragmentados, assumindo os contornos pretensamente metafóricos do itinerário adotado. Abundam cenas de gaivotas voando, detalhes da natureza seguindo seu curso, como se os realizadores pretendessem extrair poesia desse fluxo, no qual os humanos são meros penduricalhos. As demandas de Isaura, personagem que se mostra inquieta e insatisfeita, são enevoadas por essa atmosfera que tenciona inabilmente ao transcendente. Se, por um lado, são verdadeiramente bonitas as imagens desse ecossistema singular, por outro, a simples deflagração da beleza não é suficiente para injetar substância na narrativa. Os atores fazem o que podem com o pouco material à disposição. Observam e se movem, sem reagir.

Do meio para o fim, Cada Vez Mais Longe fica mais cifrado. João desaparece na vastidão do mar, para não mais voltar. Já Isaura passa a ser vivida por Neila Tavares. O envelhecimento da mulher denota a passagem do tempo, embora a instância cronológica seja praticamente negligenciada, o que gera uma deliberada indefinição. A partir daí, acompanhamos ela se deslocando solitária por um cenário em franca deterioração, com barcos encalhados na lama, praticamente anunciando a morte do lugar. Surge, então, fugazmente a, mais tarde exposta, preocupação de Eveline Costa e Oswaldo Eduardo Lioi em permitir a constatação lírica de uma realidade aterradora, ocasionada pela ação indiscriminada da ganância humana. Todavia, há um deslumbre flagrante com as possibilidades encantadoras do meio ambiente que circunda as pessoas na tela. Tornado figura dramática, o espaço, no entanto, não vinga como potência.

O simbolismo presente em Cada Vez Mais Longe acaba soterrado pelas prioridades plásticas da direção. No que tange à fotografia, temos um filme bastante engenhoso, especialmente pelo fato da utilização integral de luz natural, o que torna o trabalho de Luís Abramo ainda mais louvável. Contudo, no que concerne à construção de uma experiência cinematográfica, há muito que objetar, principalmente por conta do desequilíbrio gritante entre o âmbito meramente visual e a dimensão dramática, cuja tessitura se ressente da falta de uma liga suficientemente vital. O constante som do violoncelo traz uma solenidade superficial às intermináveis andanças de Isaura pelo charco que antes fora domínio das águas marítimas. Por fim, o desenvolvimento alegórico, predominante, é contrastado pelo caráter informativo das frases que explicam as intenções dos diretores, algo que o próprio filme é incapaz de mostrar.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
3
Leonardo Ribeiro
5
MÉDIA
4

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