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Sinopse

O capitão de um barco de pesca tem um passado misterioso que está prestes a vir à tona. Vivendo em uma pequena ilha do Caribe, sua vida assume um caminho que pode não ser tudo o que parece.

Crítica

Desde o começo, incomoda a artificialidade gritante dos personagens de Calmaria. Se reportando bem mais aos arquétipos, destituídos de arestas substanciais, os homens e as mulheres em cena são arremedos absolutamente postiços, característica que entrava o decurso da narrativa na fictícia ilha de Plymouth, próxima à Miami, tornando-a sobremaneira truncada, tragando-a rapidamente ao banal. Todavia, o que poderia perfeitamente ser entendido como uma grande falha de concepção e execução, adiante, assume contornos de estratégia para dar ao espectador pistas de que há algo de errado com aquele entorno paradisíaco no qual vive o protagonista, Baker Dill (Matthew McConaughey). Sujeito de passado militar, ele sobrevive de levar turistas para pescar atum. A obsessão por um peixe tão grande quanto arredio lhe fornece familiaridade com o capitão Ahab, o famoso lobo do mar empenhado em capturar a baleia Moby Dick no romance homônimo de Herman Melville. Todavia, esse traço de personalidade externado pela fixação é subaproveitado.

Calmaria transcorre aos trancos e barrancos em sua primeira metade, com o retorno da ex-esposa, Karen (Anne Hathaway), servindo apenas para sacudir o marasmo do pescador preocupado com sua presa solta na maré alta. O cineasta Steven Knight lida de forma claudicante com os aspectos porosos da relação, distanciando-a da dúvida, menos por habilidade para adensar a cortina de fumaça, mais por ausência de jeito no entrelace das camadas distintas. De dado momento em diante, a comunicação entre o veterano e seu filho, por telepatia ou algo que o valha, ensaia mergulho numa onda esotérica, o que acaba frustrado à frente pelas verdadeiras intenções do enredo. São muitos os elementos orquestrados tropegamente a fim de acobertar a realidade, nos oferecida numa virada absolutamente surpreendente, que reconfigura integralmente o conjunto e ajuda a justificar “fragilidades” precedentes como traços imprescindíveis à boa guinada narrativa.

Antes do radical plot twist, os personagens assumem contornos cristãos, vide a humilhada que logo simboliza a serpente do pecado original, tentando o protagonista para ele cometer pecado mortal; o imediato, Duke (Djimon Hounsou), gradativamente parecido com um anjo bom que aconselha o homem a evitar o crime como alternativa à crise; e Constance (Diane Lane), guardiã que zela pela saúde financeira do seu amante, bem como ocupa a posição de protetora de sua integridade. Antes da confirmação do cenário que permite, entre outras coisas, a pai e filho a compreensão à distância e o impedimento dos segredos, o realizador não logra êxito ao criar um ambiente instigante, chegando a deixar que Calmaria chegue perto do enfadonho. Falta pulso diretivo para lidar acuradamente com as múltiplas possibilidades que o roteiro suscita aos tropeções. Componentes vitais, assim, são encarados como falhas estruturais, fragilidade crucial ao resultado medíocre.

O protagonista descobre junto conosco a verdade, alertado quanto à experiência singular da qual faz parte. Todavia, Calmaria, a despeito do fator surpresa, não nutre a contento a nova instância que, pelo menos, trata de diminuir a incômoda sensação de um fracasso praticamente completo. Steven Knight não se cerca de subsídios para estabelecer uma lógica própria ao mundo então desvelado paulatinamente. Portanto, as informações sobre regras e funcionalidades são completamente preteridas, do que decorre a frouxidão prevalente até o desfecho falsamente conciliatório. Não se sabe, por exemplo, o que impele personagens a tentarem impedir o criador de alcançar o seu objetivo, se a autoconsciência é um fator inerente à genialidade do produto ou como aquilo tudo é viável. O elo entre as dimensões é superficial, exposto a fórceps e com leviandade, o que é realmente uma pena. Talvez, se nas mãos de um cineasta mais experiente, o roteiro poderia render mais. É insuficiente a meia dúzia de bons lampejos. O todo é carente de sustentação e consistência.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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