Crítica
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Sinopse
Através de entrevistas realizadas com vários homens moradores da Região Metropolitana de Recife, este é um retrato aprofundado sobre o universo masculino e sobre como os homens enxergam o papel das mulheres na sociedade ocidental.
Crítica
Como os homens veem as mulheres? Ou melhor, o que pensam e, mais importante ainda, o que dizem sobre elas? Muito já se falou a respeito da evolução do comportamento social e das necessidades de nos adaptarmos a um modelo de politicamente correto. Ao mesmo tempo, sabemos que quando nos sentimos “seguros”, ou seja, apenas entre aqueles que consideramos iguais, os discursos podem ser mais relaxados e menos policiados. Foi atrás dessa ‘verdade’, aquela que não se esconde por detrás de códigos sociais muitas vezes já em desuso, que a diretora Dea Ferraz partiu em Câmara de Espelhos, aquele que considera seu “primeiro longa-metragem autoral”.
Esta percepção da cineasta se dá a partir de duas constatações – ou necessidades. Primeiro, por seus trabalhos anteriores terem sido por encomenda ou sugestões de outros. Mas também, e ainda mais importante, é o fato deste falar sobre um tema que lhe diz respeito de forma mais íntima – e não só a ela, mas a todas as mulheres brasileiras. Trata-se, afinal, de uma investigação sobre como elas são encaradas por eles, respeitadas ou não, identificadas ou não, ignoradas ou não. Como iguais, acima ou aquém. As situações podem ser muitas, diversas entre si ou bastante próximas no discurso e na recepção. Mas, acima de tudo, estará na formação ideológica desse viés masculino seu maior foco de interesse.
Câmara de Espelhos possui um estilo documental semelhante àquele praticado por Eduardo Coutinho no final de sua vida. Aquele cinema que se apoia em um conceito bem estruturado, em grande parte original, mas que necessita de um olhar muito apurado por trás coordenando o seu desenrolar. Sem isso, reduz-se ao óbvio. Porém, de posse dessa visão e de um objetivo bem determinado, verdadeiras preciosidades podem surgir. Coutinho alcançou esse patamar com Jogo de Cena (2007). Ferraz, no entanto, carece das décadas de experiência que o saudoso realizador tinha de sobra. E o que acaba se observando no longa que assina é uma ideia até interessante, porém conduzida aos tropeços e com resultados que vão do curioso ou irrelevante.
Após a publicação de um anúncio nos classificados de um jornal de grande circulação em Recife, convocando homens dos “18 aos 80 anos com interesse em aparecer no cinema” (um chamado, por si só, passível de diversas interpretações), formaram-se dois grupos de discussão, cada um com seis ou sete (a razão da inconstância não é revelada) integrantes. Sentados em forma de semicírculo, são confrontados com imagens em uma televisão e convidados a refletir a respeito. O que veem vão de reportagens sobre abuso sexual a clipes de música que exploram a sexualidade feminina como artifício de venda e sedução comercial. Os comentários que seguem, por outro lado, percorrem caminhos óbvios. A princípio eles não se conhecem, e por isso tentam exercer algum controle e respeito entre si. Mas, com o desenrolar da conversa, as manifestações começam a ser mais naturais. E também problemáticas. Mas isso não era o esperado? Câmara de Espelhos busca comprovar uma tese ou descobrir algo insuspeito?
Diante de garotas dançando funk, discute-se a mulher como objeto. Frente a uma fala de Angela Merkel, chanceler da Alemanha, comenta-se o avanço da mulher, ao mesmo tempo em que se questiona: como fica o ambiente doméstico? Afinal, pode crescer na rua e deixar a casa desamparada? Ou as tarefas domésticas podem ser divididas? E quando feministas saem às ruas bradando que “o corpo é meu”, será que tudo que eles podem dizer é “belos peitos”? Redundante e circular, Câmara de Espelhos perde força com elementos mal empregados – um dos depoentes está a serviço da diretora para desestabilizar os rumos de cada conversa, mas qual a função prática dele, afinal? – e com uma forma que se apoia por demais na estrutura, sem valorizar as possibilidades que apresenta, seja na representatividade de identidade, gênero, cultural ou econômica. Dessa forma fala-se muito. Porém o quanto disso é, de fato, novo?
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