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Sinopse

Ajudante do tio mafioso, Charlie enfrenta a sua família que não aprova o relacionamento com Teresa. Ele não nasceu para o crime, diferentemente do seu amigo Johnny Boy, que o mete numa enrascada por causa de dívida de jogo.

Crítica

Pode-se dizer que Caminhos Perigosos é uma espécie de sequência natural de Quem Bate à Minha Porta? (1967), com personagens e situações muito próximos dos vistos na estreia de Scorsese, só que elevados a outro patamar, saindo da irresponsabilidade jovial à dureza da vida adulta em meio a bandidos de verdade, apostas de verdade e intenções violentas de verdade. É como se os garotos à deriva, de atividade criminosa reduzida ao porte de armas pequenas e uma que outra briga de rua, virassem os homens que regulam o banditismo no bairro de ítalo-americanos em Nova Iorque. Harvey Keitel interpretava J.R. no primeiro filme, um jovem religioso, refém da fé e dos princípios por ela moldados. Já aqui, a fé novamente aparece, sobretudo na penitência almejada por Charlie – personagem de Keitel – a fim de purificar seus pecados.

Charlie tinha tudo para trilhar um caminho brilhante como sucessor de seu tio, o chefe que comanda as coisas no bairro, aquele a quem todos devem, ao menos respeito. Bastaria seguir as passagens abertas pelo irmão de seu pai e estaria tudo bem, pois garantiria uma vida regada a dinheiro fácil, mulheres e todo status que o glamour do gangsterismo trazia aos poderosos marginais de então. Mas Charlie decide tomar um caminho mais espinhoso, como dito antes, quem sabe com o intuito de limpar um pouco sua barra com Deus, sacrificando a estabilidade e as costas quentes para, sobretudo, proteger o porra-louca Johnny Boy (Robert De Niro) e Teresa (Amy Robinson), mulher com quem mantém relacionamento à revelia de todos que a veem como uma doente mental, inferior aos olhos dos ignorantes por conta de sua epilepsia.

Aliás, se há um elemento bastante presente em Caminhos Perigosos é o preconceito, mostrado por diversos ângulos, direcionado a muitos segmentos. Num bairro de italianos, os negros, por exemplo, são vistos com desdém, assim como as mulheres e toda e qualquer “minoria”. Neste filme, Scorsese começa a delinear um estilo que ficou marcado como seu, cujo ápice se deu mais tarde em longas como Os Bons Companheiros (1990). Há quem diga que o cineasta deveria fazer apenas filmes de gângsteres, pois não há quem domine o gênero como ele, vide, também, a ferocidade de Cassino (1995). E tudo isso tem um embrião bastante desenvolvido em Caminhos Perigosos, longa no qual Scorsese combina o ambiente familiar onde a violência irrompe a qualquer momento, até entre amigos, e um protagonista que, mesmo com os dois pés nesse mundo, age conforme sua moral (cristã).

Charlie protege duas pessoas mais frágeis do que ele, pecado capital a quem aspira à chefia de um esquema ilícito tão enriquecedor quanto, no limite, solitário. Por mais que os italianos preguem valores familiares e a necessidade de justar-se aos seus, à marginalidade é necessária a supressão de sentimentos que bloqueiem demasiado uma visão prática e puramente objetiva, ou seja, é preciso frieza. Se Charlie deixasse os credores darem cabo de Johnny Boy, ou se renunciasse à mulher que ama (mesmo que não assuma esse amor), tudo seria mais simples, mas ele prefere seguir o instinto e acaba refém da própria incompetência de desumanizar-se para chefiar algo de brilho aparente, mas que pode desvanecer a qualquer momento.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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