Crítica
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Sinopse
Richard Phillips é um capitão que aceita ser tomado como refém por piratas somalianos em troca da liberdade da sua tripulação. O navio, de bandeira MV Maersk Alabama, foi o primeiro cargueiro americano a ser sequestrado em 200 anos.
Crítica
Tom Hanks construiu sua carreira interpretando o homem comum, a pessoa que se envolve em situações extraordinárias e precisa ultrapassá-las para completar sua jornada. Isso é verdade desde seus trabalhos iniciais cômicos em Splash: Uma Sereia em Minha Vida (1984), O Homem do Sapato Vermelho (1985), Um Dia a Casa Cai (1986) chegando às suas elogiadas performances em dramas como Filadélfia (1993), O Resgate do Soldado Ryan (1998) e Náufrago (2000). Não à toa, Hanks sempre foi visto como um novo James Stewart, ator reconhecido por ser o perfeito everyman dos anos dourados de Hollywood. Em Capitão Phillips, Tom Hanks chega ao suprassumo dessa máxima do homem comum, juntando-se com o diretor Paul Greengrass, cineasta reconhecido pelo visual documental de seus trabalhos no cinema. Juntos, estes dois profissionais transformam um longa-metragem que poderia ser apenas mais um drama baseado em fatos reais em uma experiência nervosa, contundente e extremamente emocionante.
Baseado no livro escrito pelo próprio Capitão Richard Phillips, o roteiro foi assinado por Billy Ray (Jogos Vorazes, 2012) e conta a história do citado comandante do navio Maersk Alabama, interpretado por Tom Hanks. No filme, Phillips e sua equipe são atacados por piratas somalis enquanto tentavam fazer o trajeto entre o Golfo de Aden e Mombaça. Rendidos pelos corsários comandados por Abduwali Muse (Barkhad Abdi), capitão e outros membros da tripulação do Maersk Alabama tentam de todas as formas negociar com os somalis, mas sem sucesso. Quando finalmente a ameaça parece estar contornada, os piratas raptam Phillips, o tirando do navio. Seria apenas o começo do martírio daquele capitão.
Quem já assistiu aos ótimos Domingo Sangrento (2002) e Voo United 93 (2006) não se surpreenderá com o estilo quase documental empregado pelo diretor Paul Greengrass. Em Capitão Phillips, o cineasta mantém características utilizadas naquelas duas produções, excetuando-se a presença de um grande nome encabeçando o elenco. Ou seja, diálogos bastante naturalistas, câmera na mão e trilha sonora pontual. Logo na primeira cena podemos notar a vontade de Greengrass em nos colocar em meio a um documentário. Vemos o casal formado por Tom Hanks e Catherine Keener (em uma ponta) conversando no carro, em um diálogo expositivo, nos mostrando em que pé os dois estão em relação ao trabalho e a família. Porque parece um documentário? Ora, os dois não dialogam como um casal normal, dentro de um carro. Eles conversam como se soubessem da presença da câmera, como se o diretor daquele doc os tivesse instruído a trocarem algumas palavras. Este parece ser o segredo do feeling documental nos filmes de Greengrass.
Ajuda o fato de Tom Hanks ser um ator completo e estar devidamente contido em boa parte do filme. A pegada naturalista empregada por ele, junto dos demais nomes do elenco, mantém Capitão Phillips sempre como uma história pé no chão, sem arroubos heróicos que poderiam minar a experiência. Mesmo a tentativa do comandante em retirar a atenção dos piratas de seus colegas de trabalho, que poderia soar heróica em qualquer outra produção, aqui parece uma forma desesperada para ganhar tempo. Toda a jornada do personagem culmina em um dos momentos mais emocionantes e impressionantes já vistos em uma produção hollywoodiana, quando o estresse e toda a tensão mantida sob controle até aquele momento simplesmente não conseguem mais ser represados. Uma cena que, certamente, dará a Tom Hanks uma nova indicação ao prêmio da Academia – e, nada impossível, o terceiro Oscar da carreira do ator.
Diferente de O Ultimato Bourne (2007), no qual Greengrass podia tirar o fôlego do espectador com cenas de perseguições inventivas, em Capitão Phillips, o diretor precisa criar a atmosfera de tensão de outras formas. Por incrível que pareça, o cineasta consegue fazer com que uma lancha caindo aos pedaços correndo atrás de um grande navio cargueiro seja eletrizante. Menos pelos cortes e pela velocidade dos veículos e mais por tudo o que estava em jogo.
Voltando ao elenco, ainda que Hanks roube os olhares dos espectadores, como de praxe em uma produção encabeçada por um grande ator, é digna de nota a performance de Barkhad Abdi, o comandante daqueles piratas. Mesmo que não seja o mandante da operação, sendo um infeliz pau mandado, Muse é ameaçador quando necessário e notadamente uma pessoa que não gostaria de estar ali caso tivesse escolha. Greengrass acerta ao não demonizar os “vilões”, tentando encontrar os motivos que levaram aqueles somalis a um plano tão arriscado.
Curiosamente, Capitão Phillips é alvo de diversas controvérsias não pela humanização dos piratas, mas pela veia heróica do seu protagonista. Membros da tripulação envolvida no sequestro vieram a público desmentir os fatos do filme, argumentando que a arrogância e a incompetência de Phillips teriam deixado o Maersk Alabama à mercê dos somalis. Esse fato, para quem espera se envolver com a trama contada por Greengrass, beira o irrelevante. Esta não é a primeira e nem será a última história baseada em fatos reais deturpada por Hollywood, portanto não é de se espantar caso os ex-subalternos de Phillips tenham razão. O que importa realmente é como o cineasta consegue envolver o espectador. Neste quesito, o filme é irretocável. Quanto à veracidade dos fatos, visto que se trata de um filme de ficção, a importância é mínima.
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