Crítica
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Sinopse
Os 60 anos de carreira de um dos maiores nomes do cinema nacional, narrados por ele mesmo. A história do jovem estudante de teatro, que iniciou sua carreia no cinema através pequenos papéis nas icônicas pornochancadas e se consagrou como ator no Cinema Novo. Através de imagens raras disponibilizadas por artistas que compartilharam de sua trajetória, o ator e diretor é visto pela primeira vez de maneira transparente, sem apelos publicitários.
Crítica
Embora aborde rapidamente as passagens importantes de Hugo Carvana no teatro e na televisão, Carvana é um documentário majoritariamente detido na relação desse artista com o cinema. Fazendo uso de imagens de arquivo, o diretor Lulu Corrêa contextualiza a descoberta da Sétima Arte por esse carioca da gema, a situando historicamente num momento em que os subúrbios da Cidade Maravilhosa tinham dezenas de salas de exibição – atualmente os espaços de boa parte delas são ocupados por igrejas, e a periferia sofre com o preconceito de um mercado que lhe disponibiliza apenas blockbusters. Assim, há um contato com cenários relevantes da urbe de outrora, ainda que essa observação seja célebre e circunstancial. Alternando depoimentos do próprio protagonista, alguns relativamente recentes, outros antigos, o filme é uma bonita homenagem a esse sujeito cuja trajetória ímpar se confunde com as transformações da produção audiovisual brasileira, das chanchadas carnavalescas aos primórdios do século XXI.
Carvana não é marcado pela articulação fértil de seus elementos, restringindo-se a criar um percurso retilíneo e a ilustra-lo visualmente. Nesse sentido, os excertos dos exemplares da filmografia de Hugo Carvana são essenciais, pois ajudam a dimensionar sua envergadura à plena construção de um imaginário cinematográfico nacional. Da atuação destacada em obras seminais como Os Fuzis (1964), passando pela colaboração com Glauber Rocha em momentos distintos, chegando aos longas-metragens dirigidos com base numa visão bastante acurada e singular da carioquice, o documentário desenha esse caminho com competência, mas burocraticamente. Ao largo das declarações, especialmente em registros de bastidores, é notável a presença de amigos tornados parceiros contumazes, como Joel Barcellos e Antônio Pedro. O realizador, no entanto, subaproveita esses elos que a Carvana, conforme o mesmo atesta em testemunho, eram valiosos.
A costura dos fragmentos em Carvana soa um tanto aleatória. Basicamente se atendo ao que o protagonista fala, privilegiando lembranças e as substanciando com o material de arquivo, Lulu passa quase batido pela atuação política de Hugo Carvana, conformado nessa seara com a disposição de algumas fotografias do ator/diretor em eventos emblemáticos, como a passeata no Rio de Janeiro em favor da campanha Diretas Já, a presença em comícios de Leonel Brizola e um breve comentário sobre a traumática atuação na administração municipal. Ainda que frágil nesse entrelaçamento de componentes, o documentário consegue mostrar como Carvana deixou uma marca indelével na cultura do país, encarnando como poucos o espirito despojado tantas vezes atribuído aos nascidos no Rio de Janeiro. Reverente ao seu objeto de estudo, a produção logra êxito pela força inerente a uma carreira que merece amplo reconhecimento, bem como à constatação quase automática do quanto ela engrandeceu e representou a nossa criatividade.
Carvana é um filme combalido pela linguagem simplista, vide a montagem que se encarrega tão e somente de justapor passados a fim de criar um caminho correto e descomplicado. Com arroubos de condescendência, poder-se-ia dizer que esse caráter direto, sem firulas, remonta ao estilo de Hugo Carvana como diretor, mas a trivialidade formal do conjunto, aqui, tem mais a ver com uma miopia diante de pontos-chave que se oferecem quase naturalmente, como as já citadas amizades fiéis e a formação espontânea de uma família de atores, atrizes e técnicos que se divertiam atrás das câmeras. A despeito disso, é possível, por meio dele, ter uma boa ideia da importância desse artista e, ainda, um acesso privilegiado à intimidade de determinadas produções como Vai Trabalhar Vagabundo (1973), Se Segura Malandro (1978), Bar Esperança (1983). Controvérsias passam longe desse retrato afetuoso, em que a homenagem é prioridade e as máculas sequer surgem.
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