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Sinopse

Leo e Rey são um casal gay que vive em Chueca. Um pouco atípicos, não têm gosto para a moda, gostam de futebol, não têm um centavo e estão passando por uma crise no relacionamento, mas, dentro do possível, vivem felizes. Ao mesmo tempo, no bairro estão acontecendo estranhos crimes contra anciãs. O assassino, Víctor, é o dono de uma imobiliária cuja máxima aspiração é transformar Chueca em um bairro modelo onde todos os habitantes sejam jovens, modernos e bonitos vivendo em casas de luxo reformadas.

Crítica

Chueca é um fictício bairro madrilenho, moldado pela especulação imobiliária a fim de ser um reduto perfeito para casais homossexuais. Lá se passa Chuecatown, comédia com tintas levemente macabras, desenvolvida a partir da sanha de um homem de negócios que não vê limites à expansão de conceitos supostamente mais vendáveis. Víctor (Pablo Puyol) veste roupas caras, frequenta espaços descolados e está à frente de quase toda a remodelação do lugar que abriga os gays em busca de uma infraestrutura pensada especialmente para eles. Como algumas moradoras ficam em seu caminho, sobretudo velinhas indispostas a se desfazer de seus apartamentos, ele trata de estrangulá-las, garantindo habitações vazias e, assim, oportunidades financeiras. Tudo é filtrado por um tom cômico que trata de conferir aos comportamentos, até aos mais torpes, uma fina camada de graça. Os subtextos existem, mas são ligeiramente preteridos em função da predominante e bem construída sensação anedótica.

Para adicionar mais tempero ao molho de Chuecatown, passa a ser central o casamento tão vigoroso como conturbado de Rey (Carlos Fuentes) e Leo (Pepón Nieto), este frequentemente tomado por crises de ciúmes. A despeito disso, eles formam uma dupla apaixonada, como mostram as brincadeiras sexuais que envolvem a admiração de ambos pelos X-Men, principalmente por Wolverine. Mas, as coisas se complicam quando a mãe de Ray, a praticamente insuportável Antonia (Concha Velasco), se instala no apartamento ao lado, imóvel deixado como herança ao seu filho por uma senhora recém-assassinada. O diretor Juan Flahn delineia bem essa conjuntura que adiciona camadas no casamento dos protagonistas e nos intentos homicidas do homem que vê outra possibilidade de lucrar com a morte de uma senhora. Mas, Antonia não é necessariamente desprovida de meios para se defender, pelo contrário, o que torna a vida do bandido complicada como ele não sonharia.

Há uma fórmula bastante visível guiando os desdobramentos de Chuecatown. O realizador pavimenta previamente os caminhos, então percorridos pelos carismáticos personagens sem o fator surpresa. Por exemplo, quando surgem em cena os investigadores criminais Mila (Rosa Maria Sardà) e Luis (Edu Soto), conseguimos antever, mais ou menos, como eles contribuirão à história e que trajetos tomarão particularmente. Isso se aplica às demais pessoas envolvidas nessa ciranda que utiliza o crime apenas como desculpa para abordar outros temas, contudo prioritariamente de maneira engraçada. As mães desempenham papel fundamental no sentido de suscitar e/ou amplificar questões importantes, acessadas pela via do chiste. Tanto a que inferniza abertamente a vida do genro quanto a insólita representante da lei permitem a erupção de conteúdos servidores de observações leves. O sabor é o de constatação bem-humorada de adversidades.

Outro ponto tocado por Chuecatown é o estereótipo do homossexual investido de bom gosto. Ray e Leo são simples, não combinam com os restaurantes chiques, as festas concorridas e os vernissages repletos da intelectualidade de Chueca. De certa forma, o filme é uma celebração da espontaneidade e da frugalidade, também no que diz respeito aos relacionamentos, sejam eles de quaisquer naturezas. Não à toa, o vilão representa esse mundo calcado nas aparências, em que nada faz sentido sem expressivo e efêmero valor social. Juan Flahn ressalta a sinceridade dos vínculos, mesmo dos tempestuosos, como o estabelecido entre Leo e sua sogra dura na queda. O viés policial é somente um gatilho à convivência dos personagens, bem como à apresentação do choque de realidades que substancia o enredo. O que vale aqui não é exatamente pegar ou não o bandido, mas, em meio à ameaça que paira sobre os cidadãos de bem do bairro, aproveitar a dinâmica jocosa que une figuras bastante cativantes.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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