Crítica


5

Leitores


3 votos 6

Onde Assistir

Sinopse

Um jovem empresário, que está noivo, se envolve em um estranho triângulo amoroso. Sem perceber, começa a se apaixonar por um engraxate adolescente.

Crítica

Uma das principais características das pornochanchadas é o questionamento dos costumes aliado ao erotismo. São tradições sociais e culturais envoltas numa metáfora sexual. Cio: Uma Verdadeira História de Amor, que por pouco nem seria enquadrado nesse gênero do cinema nacional, trata da paixão entre o jovem engraxate Darci e o burguês Paulo (Francisco di Franco). Enquanto o garoto vem de uma vida difícil no interior, o homem feito desfruta de um cotidiano satisfatório na capital, com um bom trabalho, carro importado e o noivado com uma rica mulher. Esse contraste entre ambos é um dos motes da produção dirigida por Fauzi Mansur.

20180702 02 cio uma verdadeira historia de amor papo de cinema e1530584470996

Como amor à primeira vista, Paulo se encanta após tirar uma foto de Darci em um caminhão de migrantes. O encontro traçado pelo destino se intensifica quando ele revê o jovem no centro da capital, engraxando sapatos. Ao presenciar o garoto vivendo na miséria, Paulo logo decide, como num impulso, adotar Darci. Acontece que, a partir deste momento, o desenvolvimento da trama ganha um tom fraco. Sua linguagem muitas vezes prima pelo didatismo exagerado que se arrasta quase ao simplório. A narração dos pensamentos de Paulo afrouxa o peso psicológico da direção de atores. Seus dilemas, a problemática de estar se apaixonando por um garoto e ainda ser considerado homossexual, repetidos à exaustão, junto da trilha, tornam um pouco cansativa a obra. Muitas das vozes em off nem seriam necessárias já que a atuação do machão viril Francisco di Franco é muito satisfatória, psicologicamente  bem realizada.

Uma das cenas mais emblemáticas do filme é certamente quando a noiva de Paulo, Ângela (Márcia Maria), começa a desconfiar da relação entre ele e Darci. O casal discute e ela se recusa a acreditar na homossexualidade do parceiro. Tanto que nem consegue falar a palavra homossexual, já pausando em homo e largando um “coisa assim”. Ali é demonstrada a dificuldade da alta sociedade burguesa e até mesmo da sociedade como um todo de aceitar a diversidade sexual dos indivíduos de forma plena.

Enquanto Paulo vive o dilema de assumir para si mesmo a relação que gostaria com Darci, o jovem, por sua vez, parece guardar um segredo que se arrasta e cuja revelação é protelada ao máximo. O espectador já desconfia pelos traços andrógenos do garoto que, na verdade, ele é uma jovem travestida. Talvez seja uma reviravolta que, na época, causasse impacto e certo alívio. Afinal, para o público, Paulo e Darci se salvam de uma relação fadada à marginalidade e ao erro que era considerada a homossexualidade. Hoje, o filme mais parece um retrocesso no aspecto de retratar personagens queer, mas para a época certamente foi identificado como um grande passo.

20180702 01 cio uma verdadeira historia de amor papo de cinema e1530584433467

Mansur peca exatamente no momento da revelação de Darci, que para Paulo é muito mais uma redenção do que uma constatação positiva a respeito da diversidade das sexualidades. Mesmo com dificuldades para edificar sua temática completamente, Cio: Uma Verdadeira História de Amor não possui um saldo assim tão negativo. Sua montagem e fotografia são muito bem realizadas em diversas partes do filme, e a premissa é pertinente por expor críticas relacionadas à péssima distribuição de renda, às dificuldades de quem vive no campo, às concessões dos casamentos de famílias burguesas e à constante busca pelas aparências. Todos esses apontamentos são envolvidos nessa história de amor que talvez nem conseguisse ser filmada nos dias atuais.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
é graduado em Cinema e Animação pela Universidade Federal de Pelotas (RS) e mestrando em Estudos de Arte pela Universidade do Porto, em Portugal.
avatar

Últimos artigos deRenato Cabral (Ver Tudo)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *