Crítica
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Sinopse
Crítica
De cara, a característica que chama atenção em Clara Estrela, documentário sobre a cantora Clara Nunes, é a opção pela narração em primeira pessoa. Ao refutar a inserção de entrevistas, valendo-se apenas de áudios e vídeos originais, bem como da voz em off da atriz Dira Paes reproduzindo trechos de entrevistas concedidas pela falecida artista à mídia impressa, os diretores Susanna Lira e Rodrigo Alzuguir demonstram coragem diante da limitação. O relato, portanto, tenta ser o mais íntimo possível, utilizando desde rememorações da juventude passada na cidade mineira de Paraopeba à análise do amplo reconhecimento do público. Transcorrendo em linha cronológica praticamente reta, o longa-metragem busca se apropriar das palavras de Clara para, num processo curioso, apesar de simples, refletir acerca de sua representatividade, tanto ao cenário musical quanto à esfera social, por conta de seu estilo.
O maior problema de Clara Estrela é realmente o roteiro. Não faltam materiais de arquivo, entrevistas reveladoras da personalidade de Clara Nunes, fotografias de parcerias importantes, ou seja, as ferramentas à disposição são ricas e relativamente vastas. Todavia, o alinhave dos elementos é frouxo, com pouco tempo disponível ao pleno desenvolvimento dos vieses apresentados. Há uma pressa flagrante para enfileirar episódios capitais da vida de Clara. Tal sucessão trôpega não consegue, por exemplo, dimensionar o valor da cinebiografada à música popular brasileira. Semelhante afobação se vê nos números musicais, respiros pontuais em meio ao ritmo acelerado dos demais apontamentos. É como se fosse necessário oxigenar o conjunto, então consideravelmente debilitado, com as performances icônicas de Clara, um óbvio porto seguro. O filme se ressente da falta de uma urdidura mais consistente.
Somente no início e no encerramento do longa-metragem, Susanna Lira e Rodrigo Alzuguir se dispõem a criar imagens próprias para trazer à tona mais abertamente uma dinâmica poética. No mais, eles lançam mão de um processo de organização de imagens e sons preexistentes, deflagrando a riqueza da pesquisa da trajetória da protagonista. Um dos únicos aspectos dos quais os diretores ensaiam aproximar-se com mais de atenção, destacando-o ligeiramente dos demais, é o estilo singular de Clara Nunes, a relação com as religiões de matriz africana. Ainda assim, não há mergulhos profundos ou algo que o valha. Clara Estrela toca de maneira excessivamente rápida nos ângulos mais destacáveis da carreira da cantora, sem preocupar-se com reverberações ou em amplificar quaisquer dinâmicas mencionadas. Em parte, isso pode ser explicado pelas diversas restrições decorrentes da abordagem norteadora adotada.
O que sobressai em Clara Estrela é a extensa pesquisa, as múltiplas fontes consultadas. Há, porém, uma dificuldade evidente de transcender a mera observação. O contato que temos com a protagonista, a partir deste filme, é intenso, mas ligeiro e resumido demasiadamente. Passamos batido por alguns capítulos da biografia da cantora, como a sua infância, apenas trazida à tona por lembranças bastante genéricas da liberdade no interior de Minas Gerais. Os excertos das apresentações musicais carecem de vigor, soando na tela mais como interlúdios obrigatórios. O casamento com o compositor Paulo Cesar Pinheiro é mencionado, devidamente registrado com fotografias, mas não fornece chaves para a vida pessoal de Clara Nunes, o que igualmente enfraquece a proposta do documentário. Cabe-nos unicamente contemplar a voz e a originalidade da cantora, já que o filme não nos permite ir muito além.
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