Crítica
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Sinopse
Depois de uma série de acontecimentos, um imigrante nigeriano acaba descobrindo que em Londres há uma rede de contrabando de órgãos. No entanto, ele não pode denunciar o fato à polícia pois está em situação ilegal no país.
Crítica
Cineasta acostumado a exercer um olhar crítico sobre a socieade inglesa, poucas vezes Stephen Frears foi tão incisivo quanto em Coisas Belas e Sujas, talvez um dos seus trabalhos mais subestimados. Vendido como um thriller, na verdade o que se tem aqui é um intenso drama sobre a condição dos imigrantes em um país que lhes é estranho – no caso, a própria Inglaterra. O filme acerta em vários tópicos, como seu elenco acima da média, direção segura e interessante direção de arte e fotografia, que nos mostra um Londres bastante distante daquela privilegiada por turistas. Mas é o roteiro – merecidamente indicado ao Oscar e ao Bafta – seu maior mérito, pois nos esmiúça, de forma hábil e competente, uma situação real e contemporânea sem, no entanto, deixar de lado a perspicácia ou a criatividade, evitando, deste modo, o maniqueísmo e o clichê.
Em Coisas Belas e Sujas temos como cenário o dia-a-dia dos estrangeiros ilegais em uma das maiores metrópoles mundiais. Okwe (o inglês Chiwetel Ejiofor, mantendo a postura honrada que lhe é característica) veio da Nigéria, Senay (a francesa Audrey Tautou, a melhor em cena) é turca. Os dois – ao lado de personagens oriundos da Rússia, África do Sul e China, entre outros – trabalham no hotel do espanhol Juan (Sergi López, compondo um vilão ardiloso e terrivelmente crível), além de dividirem o mesmo apartamento. Ou melhor, ela aluga o sofá de sua casa para que ele possa dormir durante algumas poucas horas, já que, além de atender na recepção, também trabalha como taxista num segundo emprego. Todos querem ganhar a maior quantia de dinheiro possível e, quem sabe com isso, realizar seus sonhos. Mas, antes de qualquer coisa, tudo o que anseiam é por saírem daquelas vidas.
A chave para esse destino começa a ser vislumbrada no dia em que Okwe encontra um coração humano entupindo uma patente num dos quartos do hotel. Logo, descobre que o local é usado como fachada para tráfico de órgãos. Um pulmão pode ser trocado por um passaporte, o que pode garantir que pessoas como Okwe ou Senai saiam das “sombras” e sejam reconhecidas como “reais” pelo governo. Isso lhes garantiriam melhores condições, empregos mais estáveis, dignidade e segurança. O que compete a eles, agora, é decidir se esse não é um preço alto demais a ser pago por tal recompensa. Além, é claro, de descobrirem até que ponto podem se envolver com essa história sem, de fato, sujarem as próprias mãos.
Frears consegue em Coisas Belas e Sujas um dos melhores momentos de sua carreira, lembrando trabalhos como os oscarizáveis Os Imorais (1990) ou Ligações Perigosas (1988). É uma obra interessante pelas questões levantadas, mas ainda mais pelo domínio do seu realizador na condução de uma narrativa eletrizante e sem respiros, que envolve o espectador com tamanha eficiência a ponto de provocar a mesma vertigem experimentada pelos personagens. É ficção, mas feita com competência e antenada ao que se passa dia após dia nas ruas de qualquer grande metrópole, estabelecendo um comentário absurdamente atual sobre a sociedade de hoje, em que cada um está a ponto de literalmente comer o próximo em nome do seu próprio bem estar. E, afinal de contas, o que é o cinema, senão a arte de contar boas histórias? Porém, quando nos deparamos com uma que, além disso, sabe como poucas estimular a reflexão e o debate, o jogo já está mais do que ganho.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Robledo Milani | 8 |
Chico Fireman | 3 |
Alysson Oliveira | 6 |
MÉDIA | 5.7 |
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