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Crítica


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Sinopse

Uma mulher e seu filho adolescente têm suas cotas de tragédia. Ambos decidem invadir um território por ambos desconhecido a fim de encontrar subsídios para seguir com suas vidas.

Crítica

O diretor de Com Todo Meu Coração sabia sobre o que queria falar em seu filme: o processo de luto no seio de uma família quando um dos membros se vai de forma trágica. Com isso em mente, tratou de agregar nomes conhecidos ao elenco, escolher os melhores cenários e desenvolver sua história de uma maneira minimamente crível. No entanto, lhe faltou debruçar justamente sobre o mais importante: o roteiro. É tudo muito genérico, como se não soubesse ao certo qual caminho seguir dentre as tantas possibilidades abertas. E assim, termina por desperdiçar até os seus pontos fortes, principalmente as atuações dos protagonistas: a sempre ótima Marisa Tomei e o garoto-revelação Charlie Plummer. Ainda que passem a maior parte do tempo afastados, quando juntos a relação de mãe e filho dos dois chega a provocar faíscas. No entanto, apesar de prometer muito, pouco é alcançado.

Margaret (Tomei) e Steven (Timothy Olyphant), mesmo após tantos anos juntos e já com um filho, nunca deixaram de ser quem são para se tornarem outra coisa – apenas pais, por exemplo. As transformações pelas quais passaram foram sendo agregadas às suas personalidades, e não trocadas por outras deixadas de lado – como a maioria acaba fazendo. São pessoas que se jogam do alto da montanha no lago abaixo e esperam que a criança que geraram faça o mesmo, sem esperar por ela. Não por maldade, mas por saberem que apenas ela pode decidir a hora de pular, sem empurrões ou surpresas. Ele sabe que dividir o baseado com o garoto, já um adolescente, não chega a ser uma transgressão, mas parte de um processo de assumir responsabilidades. Assim como ela não se preocupa em levar o rapaz até o bar onde o pai – um músico – irá se apresentar, pois cada um é perfeitamente capaz de dar seus próprios passos, e assim o encontra diretamente no show.

É nessa mesma noite, no entanto, que após tentar apartar um casal no meio de uma discussão, Steven é golpeado pelas costas, vindo a falecer poucas horas depois. Joshua Leonard, apesar de ser também ator – estreou no sucesso A Bruxa de Blair (1999) e, desde então, tem sido visto em filmes como Se Eu Ficar (2014) e Distúrbio (2018) – aqui aparece apenas como diretor e roteirista. Suas escolhas, porém, não são as mais firmes, demonstrando falta de convicção a respeito do que fazer com seus personagens. Não está interessado na agressão que tirou a vida de um homem inocente e nem como esse incidente pode ter impactado a pequena comunidade onde vivem. Seu foco está em Margaret e em Marcus (Plummer, de A Rota Selvagem, 2017). Mas é difícil para ele tomar um dos lados. Os dois afundam na depressão assim que perdem o marido/pai. A maneira como irão se reerguer é que exigirá diferentes desafios.

Enquanto o jovem opta por assumir as rédeas da casa, se preocupando com a falta de comida, as contas vencidas e demais necessidades, a mãe irá mergulhar na bebida e num desalento que a mantém trancada dentro de si. Ele fica cada vez mais sozinho, e nesse ponto a impressão é que está à frente da história. Porém, aos poucos esse protagonismo vai sendo transferido para ela, na mesma medida em que o garoto começa a se perder em suas certezas. Após um incidente entre os dois, Marcus decide sair de casa e se rebelar contra tudo e todos. A queda dele, agora, parece ser suficiente para motivar uma recuperação materna. E assim o enredo vai seguindo, como uma gangorra. O problema é que nem o alcoolismo dela – que inclui passagem por reuniões de apoio, quando passa a contar com a ajuda de uma vizinha interpretada por Mireille Enos, em participação discreta – ou a revolta dele, que parece se resumir a desprezar uma possível namorada e disparar mentiras aleatória, são graves o bastante para gerarem algum tipo de empatia.

Em resumo: apesar do título nacional, parece que é justamente coração – ou alma, diriam alguns – que se ressente a trama. Marisa Tomei convence tanto como a deprimida como a que busca se colocar em pé mais uma vez, mas bastaria apenas um tronco cortado ao meio para que a terapia funcionasse? Assim como Charlie Plummer, mais maduro do que sua pouca idade poderia supor, funciona tanto na fragilidade como na ousadia. Porém, uma postura inesperada do agressor seria bastante para que deixasse de ser um menino mimado com pena de si para se assumir como um homem diante de novas responsabilidades? Com Todo Meu Coração, mesmo com pouco mais de 80 minutos, resulta em uma experiência cansativa, pela falta do que dizer além do óbvio. É certo que somente os que caem conseguem se levantar – ainda que nem todos consigam. Mas não é por alcançar tal feito que mereça palmas. Afinal, o que importa em casos assim é dar um passo após o outro, e não chegar ao final da corrida.

 

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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