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Crítica


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Sinopse

Os estudantes Bernardo e Pedro se veem divididos entre a diversão e sua vida escolar. Tudo se torna pior quando começam a estudar numa instituição que adota medidas cada vez mais politicamente corretas. Após momentos de frustração, Pedro encontra no banheiro do colégio um diário contaminado com dicas para instaurar o caos na escola sem ser notado. O caderno levará os garotos para uma jornada que pode despertá-los ou arruiná-los para sempre.

Crítica

Muitas vezes, ao se falar do ofício de crítico de cinema, as pessoas reagem com uma expressão como se estivéssemos nos referindo ao emprego dos sonhos. “Imagina, passar a vida assistindo a filmes!”, como se todo longa fosse Cidadão Kane (1941), Casablanca (1942) ou O Poderoso Chefão (1972). Pois se levar a vida imerso no universo cinematográfico volta e meia nos reserva boas surpresas, é fato também que, invariavelmente, há seus pontos baixos. Porém, pouca coisa pode preparar o profissional da área para se deparar com algo do nível de Como se Tornar o Pior Aluno da Escola, uma vergonhosa massagem ao ego do cômico e apresentador de televisão Danilo Gentili, um produto audiovisual que pode ser tudo, menos um filme de verdade.

Nas entrevistas de divulgação, Gentili – que, além de ser autor do livro homônimo que deu origem à trama e um dos roteiristas, também aparece como um dos personagens principais – afirmou que “se algum crítico gostar do meu filme, então terei feito alguma coisa errada”. Como se percebe, seu objetivo é provocar, incomodar, e não gerar algo que seja minimamente proveitoso, seja no âmbito cultural (isso, talvez, fosse pedir demais) como, também, como mero entretenimento (será difícil encontrar, nas suas quase duas horas de duração, momentos de pura graça – se é que esses existem. O que se vê aqui é apenas uma sequência de tentativas pouco felizes de humor chulo e de baixo calão, digno de adolescentes com os hormônios em alta e o senso crítico em baixa. E, para piorar, percebendo-se diante do próprio fracasso, o responsável por tal discurso decide apelar para temas mais polêmicos, digamos. É quando se abre espaço para pedofilia, racismo, homofobia, bullying e outras violências. A técnica é clara: não lhe importa que falem mal, desde que falem a seu respeito.

O fiapo de história de Como se Tornar o Pior Aluno da Escola é enganoso desde o princípio. O próprio título dá a entender um interesse em angariar a atenção de estudantes rebeldes e inquietos. No entanto, o que temos como protagonista são dois, na falta de melhor termo, nerds – onde está a identificação com seu público-alvo? Estes dois são uma referência óbvia ao arquétipo clássico do Gordo & Magro, porém sem a ingenuidade ou sensibilidade destes. Pedro (Daniel Pimentel) é um garoto quase invisível, daqueles que ninguém dá muita atenção. Problemas em casa – separação dos pais – acabam, no entanto, afetando sua performance escolar. Prestes a rodar de ano, ele entra em desespero. Com a ajuda do melhor amigo, Bernardo (Bruno Munhoz), decide ir atrás do dono de um caderno que encontra escondido atrás de um azulejo no banheiro dos meninos. Na primeira página, o enunciado – que dá, também, título ao filme – alerta para o que vem a seguir: uma série de armadilhas para professores, peças para colegas e outras diabruras para fazer o período escolar memorável, porém da pior maneira possível.

É interessante que a única dica que o tal manual oferece a quem o lê para se dar um pouco melhor nas notas – afinal, esse parecia ser o motivo do garoto recorrer a ele – é como ser um pouco mais antenado no momento da cola: algo que ele descobre, na prática, não ser nada producente. Ao encontrar o antigo aluno – e autor daqueles escritos – os dois se veem frente a um farsante, alguém que leva a vida enganando os outros, sem se dar particularmente bem em nenhum dos seus propósitos. Um exemplo que dificilmente estimularia alguém a segui-lo, portanto. O que teria incentivado dois estudantes relativamente aplicados – e apenas um enfrentando uma dificuldade momentânea – não apenas a ouvir o que ele teria a dizer, como também seguir seus passos quase cegamente? Apenas um roteiro mais furado do que uma peneira, que cria situações inverossímeis, sem nenhuma preocupação em justificá-las.

Não contente em ter elaborado a série de absurdos que desfilam em cena durante o desenrolar das ações de Como se Tornar o Pior Aluno da Escola, Gentili ainda aparece como o suposto “mentor”, uma figura frágil e egocêntrica que passa todo seu tempo tentando aparentar ser mais do que, de fato, é. Ou seja, ele não está atuando, e, sim, simplesmente dando vida à própria persona pública que criou para si. Tecnicamente competente – no Brasil de hoje, dinheiro é o que não falta para aqueles dispostos a defender uma visão ultrajante de mundo – sua obra é não mais do que um exercício de exageros para defender uma lógica agressiva e deturpada da realidade, na qual os fracos não têm vez, e os brutos servem apenas para serem usados pelos mais rápidos, numa busca cega pelo “eu” em detrimento do coletivo. Curiosamente, sua conclusão é um legítimo gol contra, prestando tributo mais à dura realidade dos fatos do que à lei do mais esperto. Como se vê, nem mesmo na ficção ele consegue provar ser válida tal diretriz. Pois nem mesmo o que cria está de acordo com uma postura tão ultrapassada e perniciosa, num típico caso em que o tiro, ao menos dessa vez, saiu pela culatra. Felizmente.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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