Crítica
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Sinopse
Com a aproximação do verão, o jovem Elias só tem um sonho: finalmente conhecer o mar. Em Corpo Elétrico, o problema é que, trabalhando duro em uma fábrica, seu tempo vai ficando cada vez mais curto com a proximidade do fim de ano. Mas, inesperadamente, após uma noite de cerveja com seus colegas operários, novas possibilidades surgem e sua vida pode ser transformada para sempre.
Crítica
O toque da pele. O frenesi do sexo. O tesão do momento. Dois corpos nus se estendem sobre a cama. A conversa entre eles revela vontade e desapego, interesse e liberdade. São jovens, atraentes, sabem o que fazer com o que possuem – mesmo que nada tenham além deles próprios. A linguagem que falam é a das ruas, é aquela vivida em cada instante, ditada pelo instinto e ouvida pelo prazer. O ontem já foi e pouco importa o amanhã: o que vale é o agora. O que os move é a necessidade de se manter em constante movimento. Talvez não se tenham para onde ir, ainda que ficar não seja uma opção. Afinal, em algum momento, o dia irá raiar. E o que era novo será ultrapassado. Mas, enquanto isso, basta estar ligado – em si, nos outros, no todo. Em Corpo Elétrico, o diretor e roteirista Marcelo Caetano propõe um retrato do hoje sentido nas ruas, sem filtros, baseado no instantâneo e nas reações mais básicas. E ainda que almeje pouco, dotado de uma total ausência de pretensões, o que alcança é impressionante, muito além do imaginado, ainda mais partindo de um discurso tão singular. Porém, e talvez por isso mesmo, absolutamente universal.
Ainda que Corpo Elétrico seja seu primeiro filme, Marcelo Caetano não é nenhum novato. Seu nome está ligado a alguns dos melhores filmes brasileiros recentes. Foi, entre outras funções, co-roteirista de Mãe Só Há Uma (2016), ator em Boi Neon (2015), produtor de elenco de Aquarius (2016) e diretor assistente de Tatuagem (2013). Ou seja, como se percebe, créditos não lhe faltam. E essa experiência acumulada se reflete no desenrolar da ação do seu longa de estreia. Afinal, estamos aqui diante de uma obra concisa, aberta exatamente onde precisa ser, fechada no que lhe é mais importante: seus personagens. Cada figura que surge em cena, ainda que por instantes, é dotada de tamanha personalidade que facilmente nos pegamos indagando por suas origens, de onde veio e imaginando como seguirá dali em diante. São completas, nem certas ou erradas, pois tais conceitos aqui inexistem. Verdadeiras, contraditórias e múltiplas. Se perdem, se encontram, erram e acertam na mesma proporção. E é este conjunto que as compõe, não isso ou aquilo – como se detalhes pudessem formar um todo.
Elias (a revelação Kelner Macêdo) tem pouco mais de vinte anos e está começando sua vida adulta. Ele mora nas ruas, nos ambientes de frequenta, nos amigos que visita, nos amantes que o recebem. O quarto e sala que chama de casa é não mais do que um ponto de referência. Passa seus dias na pequena fábrica de confecções onde trabalha, e as noites e momentos de folga os usa para explorar – corpos, desejos, sensações. Seja um flerte rápido na hora do lanche ou um happy hour prolongado com os colegas, um fim de semana à beira mar ou uma festa que não termina. Tudo é motivo para reunião, para a troca fundamental e necessária, que o move, preenche e completa. O companheiro de ofício pode ser o parceiro de cama, o êxtase do dever cumprido eventualmente irá resultar na comemoração sem hora para acabar. O diretor e roteirista – em um trabalho feito em parceria com Gabriel Domingues e Hilton Lacerda – dedica seu olhar a cada um deles sem pressa, evitando atropelar emoções ou represar sentimentos. Eles tem a seu favor todo o tempo do mundo – mesmo que não se preocupem com isso.
Corpo Elétrico é um filme impregnado pelo libertário. O desprendimento é tamanho a ponto de se perguntar se houve, de fato, uma diretriz a ser seguida. Porém, no minuto em que a dúvida surge, logo o realizador faz questão de mostrar estar no completo domínio da narrativa que desenvolve. Um bom exemplo é a sequência da saída da fábrica, em um plano-sequência de arrepiar até os estetas mais exigentes, revelando precisão e estudo, combinando ficção e intérpretes de forma quase aleatória, porém com uma determinação assustadora. Nenhum passo em falso é dado, ainda que estejam tão soltos a ponto de voarem. Para os céus que dentro de si carregam, cada um deles, um universo em particular. Elias é nosso condutor. Ele faz uso da atração que exerce e que sente, deixando-se levar e consigo carregando outros. É uma vida composta pela coleção de momentos. Soam quase que perdidos em um jogo maior, mas fazem parte de um quebra-cabeça que só se completa após a última peça – essa que não tem pressa nem necessidade de se fazer presente.
Homens e mulheres se misturam e se combinam. Gays e heterossexuais, casais de uma vida ou de um instante. A eletricidade que percorre de um para outro termina por conectá-los em perfeita sintonia. Corpo Elétrico não é mais um filme, somente a atração da semana, motivo de uma conversa que logo se esvazia. É uma obra completa que, se por um lado irá afastar os mais formais e desavisados, por outro recompensa os ousados e curiosos com audácia e uma contagiante ausência de pudores e ressalvas. Cores explodem na tela, nada mais se esconde, e o crível se revela sem chance de voltar atrás. Eles são o que são, nus e crus. Elias pode ter sonhos simples, mas são do tamanho do seu mundo. E aqueles ao seu redor, com os quais se liga com a mesma vontade e praticidade com que deles se afasta, também são parte de cada um no lado de cá da tela. E o espelho só é bonito àqueles que acreditam no que veem. Independente do que digam, essa verdade precisa partir de dentro. Viva, esfuziante, contagiante. De braços abertos e sem olhar para trás.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Robledo Milani | 9 |
Bianca Zasso | 9 |
Marcelo Müller | 9 |
Matheus Bonez | 9 |
MÉDIA | 9 |
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