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Crítica


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Sinopse

Phil Phillips é um fantoche ex-policial que agora trabalha como detetive particular. Após seu irmão ser assassinado, ele descobre que o responsável é um serial killer que pretende eliminar todos os integrantes do “The Happytime Gang”, série de TV de grande sucesso nos anos 1980. Juntamente com sua parceira, a detetive Edwards, ele precisa capturá-lo antes que faça uma nova vítima.

Crítica

Há algo de podre no reino de Los Angeles. Fantoches sofrem discriminação diariamente e uma onda de assassinatos coloca em xeque a figura central de Crimes em Happytime, Phil Phillips, ex-policial, agora um investigador particular. O longa-metragem dirigido por Brian Henson – filho de Jim Henson, criador dos Muppets – bebe abertamente da fonte da tradição noir, com o protagonista corroído pela culpa de um erro crasso no passado, a femme fatale que exala luxúria e ambiguidade e o submundo de drogas e pornografia. Trafegando com desenvoltura entre âmbitos legais e ilícitos, o detetive literalmente azul se vê no centro de um turbulento plano arquitetado por alguém misterioso. Desde o começo, sobressai a incorreção como elemento narrativo, com direito a bonecos destilando palavrões, mencionando práticas sexuais das mais diversas, isso sem contar as cenas ótimas pelo potencial de subversão e graça, como a do flagrante da filmagem do pornô entre um polvo e uma vaca. Sim, você leu certo.

Completamente cientes de que são fantoches, as figuras multicoloridas se sentem deslocadas no mundo dos humanos porque são consideradas párias. Infelizmente, o realizador não investe particularmente nessa observação alusiva, de cara, ao preconceito racial, mesmo apresentando miradas pontiagudas, como a da celebridade que utiliza água sanitária para ficar mais clara. Crimes em Happytime se desenvolve a partir do enigma, mas conserva uma inclinação ao humor desbragado. Melissa McCarthy, intérprete da ex-parceira de Phil, entra em cena para garantir que a comédia seja uma constante. Por conta de uma particularidade em sua composição física, ela pode fazer certas coisas, como cheirar açúcar, igual aos fantoches, e fichar chapada. No mais das vezes, há tensão entre os tons sério e cômico. O segundo geralmente quebra a dureza do primeiro, como quando brinquedos são destroçados por animais domésticos. É engraçado, porque acontece numa esfera diegética supostamente dramática.

Exatamente pela filiação óbvia ao noir, Crimes em Happytime é repleto de reviravoltas, com a revelação das verdadeiras intenções de tipos absolutamente dúbios. Todavia, isso não gera previsibilidade, principalmente pela forma inteligente como Brian Henson constrói o viés paródico. Phil é uma figura taciturna, de personalidade problemática, um produto da corrupção dominante numa cidade como Los Angeles. Frustrando possíveis expectativas de um decurso pueril, o filme traz justamente o contrário, ou seja, aposta fortemente em piadas sujas e nas sequências inusitadas, como a da relação sexual entre Phil e a cliente, prolongada jocosamente por conta da quase ininterrupta ejaculação do fantoche. Aqui e ali há exageros que tratam de aliviar ligeiramente a barra, mas mesmo eles não são exatamente construídos visando o público infantil. Melissa McCarthy passa do ponto em determinados instantes e sua personagem não é explorada totalmente a contento, embora sirva de contraponto ao sarcasmo vigente.

Crimes em Happytime ainda guarda alguns truques na manga, como a citação ao excelente Instinto Selvagem (1992), mais precisamente a reprodução da famosa cruzada de pernas de Sharon Stone. Pelos pubianos de marionetes, menções a orgias e noitadas marcadas por consumo de drogas, amores transformados em ódio mortal, são ingredientes que convivem relativamente em harmonia com as sacadas humorísticas fundamentadas no ridículo das situações. O filme é uma divertida homenagem ao noir. Concomitantemente, reafirma o carisma das marionetes semelhantes às da Vila Sésamo e aos próprios Muppets, embora não haja sequer vislumbres de Caco, Miss Piggy, Animal, Gonzo e os demais do primeiro time da criação de Jim Henson. Fazendo da pelúcia as vísceras expostas em vários momentos, o cineasta apresenta uma produção desbocada, recheada de palavras de baixo calão, com circunstâncias controversas, ainda que não livre de pontos baixos, vide a reiteração de algumas piadas bobas. Entretanto, ainda assim, é irônico e mordaz.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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