Cutie and the Boxer
Crítica
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Sinopse
O pintor Ushio Shinohara já foi muito famoso e respeitado no circuito de arte independente, mas em idade avançada, ele reflete sobre novas formas de pintura que possam trazer a fama de volta. Sua esposa e companheira, Noriko, ajuda Ushio na construção das obras, mas também tenta vender seus próprios desenhos, com a personagem Cutie, baseada em sua própria história de vida.
Crítica
A arte pode sobreviver a um casamento? Um casamento pode sobreviver à arte? O documentário Cutie and the Boxer, dirigido por Zachary Heinzerling, mostra o relacionamento de dois interessantes artistas que moram em Nova York, mas tem suas raízes fortes no Japão: Noriko e Ushio Shinohara. Os dois se conheceram na Big Apple em 1969: Ushio tinha 41 anos, Noriko apenas 19. Como um artista avant garde, o então quarentão fazia sucesso com suas pinturas originadas de golpes de boxe na tela branca. Já a jovem ainda buscava sua voz, tateava o que gostaria de mostrar como artista. Passados mais de 40 anos, Noriko finalmente consegue sair da sombra de seu marido, assinando uma exposição ao lado de Ushio. E é isso que acompanhamos neste agridoce documentário que fala sobre amor, arte, ciúmes e libertação.
Zachary Heinzerling sabe que tem em mãos uma história interessante e cativante, e não a desperdiça de forma alguma. Tendo a disposição imagens de arquivo do casal, mostrando como era sua vida quando mais jovens, o cineasta consegue fazer um apurado cotejo entre passado e presente, transmitindo ao espectador as esperanças e vontades daquele tempo, mesclados à realidade do momento atual. Tudo isso com total colaboração do casal retratado, que abre as portas de sua casa e permite que vejamos o seu cotidiano – e suas costumeiras discussões sobre as menores coisas.
O clima familiar ajuda o documentário, que nos faz mergulhar no dia a dia dos artistas, nos fazendo compreender o que cada um almeja. Ushio, com mais de 80 anos, ainda mantém-se ativo, continuando suas obras com luvas de boxe. Enquanto isso, Noriko passa a desenhar seus personagens, chamados Cutie and the Bully, um retrato pouco embelezado do relacionamento entre os dois. Os anos de bebedeiras de Ushio e sua relação intempestiva com a esposa são colocados em quadrinhos curiosos e extremamente francos. A artista parece não se importar que seu parceiro possa ter ressalvas quanto ao material apresentado. Da mesma forma, Ushio parece não se dar conta do turbilhão de ideias que passam pela cabeça de sua esposa. Noriko sabe, depois de anos de convivência, que seu marido não leva sua arte a sério. Portanto, uma exposição conjunta causa certos choques de ciúme e uma até então improvável parceria se dá.
Ainda que se concentre bastante na arte dos dois, e dê destaque para este clima de competição entre Ushio e Noriko, Cutie and the Boxer não é cínico em apontar falta de amor ou de carinho entre os artistas. Um relacionamento de 40 anos que teve seus altos e baixos e que ainda continua rendendo frutos não é extirpado de sentimentos. Portanto, ao vermos o embate dos dois ao final do documentário, com as ferramentas preferidas de Ushio sendo usadas por ambos, notamos que os artistas encontraram uma maneira muito pessoal de encontrar um equilíbrio.
Deixando que seus personagens contem sua história, e incluindo belas animações da arte de Noriko para ilustrar a trama, Zachary Heinzerling cria um documentário que chama a atenção pelas discussões que apresenta, mas que conquista o espectador, principalmente, pela força de seus protagonistas. Dois artistas que passaram por um bocado juntos e que tem em sua arte uma forma de diálogo. Por mais enviesados que possam ser e por mais cicatrizes e arrependimentos que possam carregar, ainda assim, diálogos. E amor.
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