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Sinopse

Dezembro de 1897, Paris. O escritor Edmond Rostand ainda não chegou aos trinta anos, mas já tem dois filhos e anseia por muitas coisas. Ele não escreve nada há dois anos. Desesperado por trabalho, oferece ao grande Constant Coquelin uma nova peça, uma comédia heróica, em verso, para ser entregue no período de festas. Para Edmond, há apenas uma preocupação: o texto ainda não está escrito.

Crítica

A ideia de revelar os bastidores do nascimento de um clássico é inegavelmente interessante. No entanto, já foi explorada à exaustão no cinema. Um bom exemplo é Shakespeare Apaixonado (1998), longa de John Madden que, a despeito dos seus detratores, ganhou 7 Oscars conjecturando como teriam sido criados textos referenciais como Romeu & Julieta e Noites de Reis, entre outros assinados pelo bardo inglês. Pois é isso que o diretor de primeira viagem Alexis Michalik faz em Cyrano Mon Amour: imaginar o que teria estimulado o autor Edmond Rostand a dar origem a um dos romances mais referenciais da literatura francesa – e mundial. Porém, se a distribuidora brasileira optou por deixar as sutilezas de lado e apostou na obviedade no batismo do filme, está no nome original – Edmond – a verdadeira razão de ser deste longa: um olhar sobre o criador, e não sobre a criatura.

Quando nos deparamos com Edmond Rostand (Thomas Solivérès, de Intocáveis, 2011), ele desfruta de um momento de imensa popularidade: suas peças são aplaudidas pelo público e disputadas por estrelas como Sarah Bernhardt (Clémentine Célarié, de Uma Família de Dois, 2016). Porém, quando se está no topo, o único caminho é para baixo. E é o que lhe acontece a seguir: dois anos de bloqueio criativo, com nada de válido saindo de sua pena. A esposa (Alice de Lencquesaing, de Uma Escala em Paris, 2017) já se encontra em pânico, as contas se acumulam, porém nada parece mudar no horizonte do casal. Isso até que o famoso Constant Coquelin (Olivier Gourmet, excelente) lhe bater à porta com uma encomenda: deseja um texto revolucionário para sua volta aos palcos. Esse é o tipo de pedido ao qual não se diz não. Mas o que fazer quando nada lhe surge à mente?

Muitos são os autores que afirmam serem capazes de criar a partir do absoluto zero. No entanto, é sabido que qualquer um irá escrever melhor a respeito daquilo que conhece com profundidade, quando a ficção vem filtrada por um viés pessoal, refletindo as próprias experiências vividas por aquele que agora as imagina, dotando-as com a fantasia necessária para soarem mais palatáveis ao grande público. Pois é exatamente o que faz Rostand, não sem a ajuda daqueles que estão ao seu redor. O dono do bar (Jean-Michel Martial) pode servir para lhe abrir os olhos, mas serão esses que captarão a verdade que os cercam. Quando o melhor amigo, Léo Volny (Tom Leeb, de Papillon, 2017), bonito, porém de poucas luzes, se apaixona pela bela Jeanne (Lucie Boujenah, de Inocência Roubada, 2018), mas não tem coragem para se declarar, implorando por Edmond ajudá-lo com as cartas enviadas à amada, estará armado o cenário que o escritor deverá explorar.

A peça está ótima, só falta escrever”, declara Rostand. Pois assim se desenvolve Cyrano Mon Amour, com tudo sendo exposto a olhos vistos, mas sem a concretude que lhe faria real. Visualmente deslumbrante, faria bem se essa ousadia tivesse sido aproveitada também de modo narrativo, e não apenas no apuro estético. Cyrano de Bergerac fala de um herói repleto de bravatas que se esconde por trás de um nariz desproporcional para não revelar suas maiores fragilidades, mas discute também um país em guerra que insiste em se distrair dos seus verdadeiros problemas. Michalik, que também aparece diante das câmeras como o autor rival Georges Feydeau, carece de maior segurança ao assumir o que de fato pretende com sua obra: fazer diferença dentro de um cenário cada vez mais conturbado ou resignar-se como um curioso comentário de época, mas na mesma proporção descartável.

Equilibrando-se sem muita habilidade entre a comédia de erros e o romance de folhetim, Cyrano Mon Amour é feito para agradar aos fãs do texto original, que deverão identificar referências por todos os lados. A todos os demais, no entanto, desprovidos dessa camada de interesse, resta pouco além de uma fábula que nasce já um tanto envelhecida, por fazer uso de elementos desgastados, visto a conformidade como se esforça para se encaixar em uma estrutura pré-existente, sem a audácia para ir adiante em sua proposta. Bonito de se ver e sem provocar maiores perturbações, é daqueles conjuntos que agradam por conter elementos que parecem escondidos, quando na verdade estão ali justamente posicionados para serem reconhecidos. É um jogo perigoso, do qual não sobram feridos, principalmente os que deveriam estar sendo homenageados, mas que acabam por sucumbir a uma ânsia oriunda não pela criatividade, mas, antes, pela vaidade daqueles incapazes de seguir pelos próprios pés, tendo, portanto, que se apoiar em fórmulas há muito testadas.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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