Crítica
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Sinopse
Depois de conhecer Miranda e, principalmente, se apaixonar perdidamente por ela, Abe começa a fazer uma mudança drástica em sua vida. Até então ele era um adulto adolescente preso às bugigangas da sua infância.
Crítica
Azarões são os últimos cavalos nos quais alguém apostaria numa corrida. Abe (Jordan Gelber) é um tipo de azarão. Tem quase 40 anos, mora na casa dos pais (num quarto repleto de action figures), está fora de forma, trabalha na empresa da família por conveniência (pois é inapto), não acabou a graduação e ainda tem um constante senso de inadequação. Ele é o protagonista de Dark Horse, mais recente filme do cineasta Todd Solondz. Abe conhece a depressiva Miranda (Selma Blair) numa festa de casamento e logo depois, no primeiro encontro, pede ela em casamento. Misto de infantilidade e desespero, o ato promove algo como uma revolução na vida desse cara que teima em achar que os pais devem passar a mão na sua cabeça mesmo quando ele está errado.
Quem conhece o cinema de Todd Solondz sabe que seus filmes são recheados de uma ironia cáustica. Em Dark Horse isso não é diferente, a começar pelas músicas da trilha sonora, todas baladinhas pop que flertam com a autoajuda ou cujo sucesso exemplifica a babaquice alastrada pela classe média americana que compra, aos montes, CDs de gente cantando o consumismo desenfreado, entre outras distorções de valores. A ironia está ali, para quem quiser ver, aliás, provavelmente um tanto explícita demais. A narrativa envereda pela subversão das comédias protagonizadas por “perdedores”, hoje em dia muito comuns, mas não deixa de cair numa que outra armadilha desse já quase subgênero.
A derrocada capital de Abe é preenchida pelo relacionamento lacônico com Miranda, as problemáticas familiares e os conselhos de gente conhecida fora de seus contextos normais, pois fruto de alucinações. Em dado momento, realidade e delírio se confundem, o que acaba dando tempero interessante ao filme, embora não se confirme como elemento lá tão relevante. Abe parece não ter salvação nesse mundo de gente petrificada frente a televisão, ou subserviente às ordens patronais. Não que isso faça dele espécie de “outsider idealista contra os desmandos do sistema”, aliás, longe disso. Abe está mais para produto resignado e sem profunda autoconsciência desse “sistema” que automatiza as pessoas e não lhes deixa muitas escapatórias.
Dark Horse radiografa, por assim dizer e em tom pessimista, essa geração desesperançada por natureza, que não sofreu a grande depressão, as guerras mundiais ou a latente repressão social, tal as gerações passadas. Entretanto, a despeito de suas qualidades, o filme carece da veia mais radical de Solondz, pois acaba um tanto pálido, por vezes até inofensivo. Está muito longe dos melhores momentos do cineasta, como em Felicidade (1998), por exemplo, em que a incontornável imperfeição humana é base de um ponto de vista essencialmente niilista. Em Dark Horse, também existe esse senso de negação, mas num espectro bem menos mordaz e eficiente. Sobra uma boa história, cujo final é, felizmente, tudo, menos edificante, ou seja, coerente com seus princípios e meios.
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