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Sinopse

Melhor amigo do Superman, Krypto precisa reunir um time de animais notáveis quando os membros da Liga da Justiça são sequestrados. Os bichinhos terão de dominar seus superpoderes para conseguir triunfar contra o mal.

Crítica

Se por um lado a Marvel traçou e vem desenvolvendo um plano de transposição dos seus personagens e histórias, há muito conhecidos dos quadrinhos, para o cinema, com extremo sucesso, sua principal concorrente, a DC Comics, tem registrado um tropeço atrás do outro ao tentar replicar o mesmo modelo de negócios da rival. A tentativa de criar um universo compartilhado permanece em coma após tantas frustrações, e os esforços atuais se mostram mais direcionados a anseios individuais, como se cada força criativa da empresa estivesse disposta a atirar para um lado diferente. Dentro desse contexto, não deveria causar espanto se deparar com um título como esse DC Liga dos Superpets, uma animação não sobre os heróis, mas sobre os bichinhos de estimação desses. Só que a ideia, por mais absurda que fosse, talvez guardasse algum pingo de originalidade se permanecesse atenta à premissa original. Não é o que acontece em cena, no entanto, e o resultado está mais próximo a uma mistura de Pets: A Vida Secreta dos Bichos (2016) com Os Incríveis (2004), porém sem a acidez de um, nem o dinamismo do outro.

Se alguém chegar a esse filme imaginando encontrar uma investigação cômica sobre como tais animais se comportam diante dos feitos extraordinários dos seus proprietários, ledo engano. A história, aqui, é outra. Ao assumir um viés até mesmo desrespeitoso com figuras icônicas que se revelaram, com o passar das décadas, serem os verdadeiros patrimônios da editora, a produção sacrifica qualquer espírito inovador ao se mostrar confortável em apenas trilhar por caminhos conhecidos, sem ousadia ou aventura. Não apenas Superman, mas toda a Liga da Justiça – Batman, Mulher-Maravilha, Aquaman, Flash, Ciborgue e Lanterna Verde – são colocados fora de serviço sem muita cerimônia. Uma vez incapacitados, a quem restará salvar o mundo? Seus pets – ou algo que o valha. Mas o pior nem é isso – é descobrir, após esse constrangimento, que a vergonha pode ser ainda maior. Afinal, o vilão que nocauteou os mais poderosos seres da Terra é ninguém menos do que... um porquinho da índia.

Veja bem, é certo que esta é uma produção destinada a um público infantil... bem infantil, aliás. Mas não é por isso que os diretores Jared Stern (Feliz Aniversário de Casamento, 2018) e Sam Levine (roteirista de Nem Que A Vaca Tussa, 2004) deveriam desrespeitar a inteligência desses espectadores em potencial. Se faz evidente o esforço em emular uma certa ironia diante tamanhos absurdos, como se o improvável fosse suficiente para garantir o interesse. Mas não é exatamente assim que acontece. Um a um os heróis vão sendo derrotados por esse novo “gênio do crime”, que tudo o que busca é o reconhecimento do seu maior ídolo – e antigo dono – Lex Luthor. Ou seja, em resumo, é mais uma história igual a tantas outras, só que ao invés de capas azuis e pretas, laços indestrutíveis e aviões invisíveis, unidos contra um careca milionário, o que se tem é cães e esquilos, porquinhas e tartarugas. E hamsters e preás, claro.

Krypto, o supercão, o cachorro branco da família El que teria sido enviado à Terra em uma missão-teste antes de Kal-El (ou Clark Kent, dependendo do ponto de vista), apareceu pela primeira vez em março de 1955 – ou seja, há mais de seis décadas. Com uma trajetória própria, é um personagem querido, admirado por muitos – e desprezado por outros tantos. Mas singular, acima de tudo. Pois é justamente esse caráter único que Stern, co-roteirista ao lado de John Whittington – mesma dupla de Lego Batman: O Filme (2017) – decide deixar de lado, tornando uma trupe de pets abandonados, colegas em uma loja de adoção, tão superpoderosos quanto ele. As explicações e justificativas para como isso acaba acontecendo são frágeis, tais como a determinação do inimigo – um diminuto megalomaníaco – em alcançar seus objetivos, sejam eles quais forem. Ao final, a impressão é de se ter explorado apenas desculpas que possibilitassem embates e confusões, privilegiando a ação ao invés da lógica.

Por mais que faça uso como força narrativa de soluções já exploradas por seus similares – como o cão doméstico abandonado ou o porquinho neurótico, ambos vistos no citado Pets: A Vida Secreta dos Bichos (Lulu, a cobaia sem pelos, aliás, é uma versão genérica de Bola de Neve, o coelhinho fofinho com planos maléficos) – DC Liga dos Superpets não chega a ser um tiro totalmente descabido. Afinal, justamente pela pretensão que demonstra em se comunicar com uma plateia pouco exigente e desprovida de maiores referências, se comporta de forma relativamente eficiente enquanto entretenimento passageiro e sem maiores repercussões. Se não fossem os nomes altamente reconhecíveis que carrega, a responsabilidade seria inevitavelmente menor – e não é de se duvidar que sua aceitação fosse mais tranquila. Porém, diante de símbolos tão almejados, era de se esperar no mínimo um esforço condizente com o histórico que assume. É uma brincadeira, é fato. Mas não precisava ser uma tão descartável quanto a que aqui se revela.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.

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