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Sinopse

O aleitamento materno proporciona grandes transformações na vida das mães e dos bebês. Seis mulheres de diferentes realidades socioculturais relatam suas experiências durante os primeiros 180 dias após darem à luz, tempo recomendado pela Organização Mundial de Saúde para amamentação exclusiva.

Crítica

“Financiado por 700 mulheres... e 30 homens”. Os letreiros no início deste documentário são importantes para se determinar o orgulho de ser um projeto dirigido por mulheres e para mulheres, motivado pela iniciativa feminina em se falar de temas como a aleitação e as pressões exercidas sobre as mães de filhos recém-nascidos. As frases iniciais também ostentam o orgulho de ser um filme produzido a partir de financiamento coletivo – portanto, de baixo orçamento – com foco na importância de seu tema, ou seja, justificado por uma urgência, pela necessidade de levar a discussão ao maior número de pessoas possível.

O melhor aspecto do projeto nasce de seu posicionamento político claro em defesa da amamentação e do leite materno em oposição à indústria alimentícia, que pretende empurrar fórmulas industrializadas como única solução, supostamente mais completas que o leite da mãe. A diretora Graziela Mantoanelli jamais confronta estas empresas a ponto de procurar um ponto de vista das mesmas nem de incluir dados e denúncias concretas, porém multiplica relatos sobre a pressão da Nestlé e semelhantes nos médicos – e destes, nas pacientes – no que diz respeito ao consumo de seus produtos e na desvalorização de processos naturais de alimentação. O filme possui a coragem de manter depoimentos que inclusive denunciam as fórmulas como “baby killers”, ou seja, matadoras de bebê.

Exceto por este posicionamento específico, De Peito Aberto parte para um panorama bastante amplo sobre as agruras da maternidade. Questiona-se a solidão durante a gestação, a pressão psicológica na mãe para seguir exemplos alheios, o desconforto diante do processo natural de amamentar o filho em público. Ao apresentar uma sucessão de mães com seus filhos – a maioria delas de classe média-alta, dispondo de amplos recursos para cuidar dos bebês – o documentário se preocupa mais em estabelecer um mosaico de exemplos do que em estruturar uma narrativa coesa, do início ao fim. Em outras palavras, estas mães funcionam de modo equivalente umas às outras – ouve-se apenas aquelas em defesa do parto natural, alimentação natural, e de que “o corpo sabe” o que faz – ao invés de apresentarem uma argumentação dialética ou uma investigação aprofundada.

O maior desconforto diante do projeto nasce de sua semelhança com o formato das reportagens televisivas. A decisão de colocar estas mães discursando diretamente para a câmera, ao vivo, em paralelo com imagens supostamente espontâneas com uma câmera próxima demais para passar despercebida, somada à trilha sonora constante de cordas dedilhadas, fornece a impressão de um especial televisivo de poucas ambições propriamente cinematográficas. Na maior parte das cenas, o som está competentemente captado, mas durante as entrevistas de Jack Newman e Laura Gutman, por exemplo, a captação de som se torna bastante amadora. Em muitas entrevistas, a luz natural compõe bem os cenários, mas em outros momentos, a câmera na mão treme demais dentro dos cômodos, a montagem recorta a imagem de entrevistados em enquadramentos pouco favoráveis para imprimir variedade e a edição sonora se torna desigual.

Ao menos, o documentário consegue fugir do óbvio ao analisar o papel das relações de raça nas pressões sobre o corpo feminino, evocando o passado de escravidão como trauma determinante nas desigualdades que afetam até hoje as mulheres negras. Enquanto isso, discute-se temas variados como a amamentação cruzada, o papel do homem na criação, a influência de avós e outros familiares, o excesso ou falta de leite etc. De Peito Aberto busca sobretudo evocar estas questões com respeito, expondo o seio sem o olhar tipicamente erotizado que se espera da nudez feminina em relação à masculina. As mulheres expõem seus corpos, seus seios e a sua história com um bem-vindo despojamento, sem serem julgadas por suas decisões. A evidente empatia pela diversidade de formas de maternidade se traduz no olhar amistoso e na estética solar do filme que poderia, no entanto, demonstrar ambições mais profundas em suas imagens e mesmo sua investigação empírica.

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Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de Cinema.
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