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Crítica


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Sinopse

O sucesso da rede de lojas Sexy Delícia faz com que Alice rode o mundo, visitando os mais diversos países em uma correria interminável. Sem tempo para se dedicar à família, quem assume a casa é o marido, João, que cuida também dos dois filhos. Cansada de tanta agitação, Alice decide se aposentar e entregar o comando dos negócios à mãe, Marion. Porém, o surgimento de Leona, uma jovem competidora, faz com que mude seus planos.

Crítica

Em De Pernas pro Ar 3, Alice Segretto (Ingrid Guimarães) é uma bem-sucedida empresária que roda o mundo para administrar a sua marca de produtos eróticos. A crise existencial se instaura, inapelavelmente, quando ela entende que, em virtude da itinerância constante, está perdendo momentos valiosos, sobretudo os relacionados aos dois filhos. Isso é agravado pelo distanciamento, também, do marido João Luiz (Bruno Garcia). Contrariando a própria natureza de workaholic inveterada, Alice decide dar uma guinada no seu cotidiano, se aposentando dos negócios, assumindo uma posição doméstica, sendo presente efetivamente. O longa-metragem dirigido por Júlia Rezende está mais para uma comédia romântica, especialmente pela forma como se debruça sobre a crise matrimonial aparentemente insolúvel que afasta progressivamente a protagonista de seu cônjuge descontente. O prazer feminino, resultado dos artefatos criados e comercializados pela Sexy Delícia, não é o único elemento que surge a fim de alinhar o filme à nossa contemporaneidade.

O amor pelo trabalho, algo retratado do ponto de vista prioritariamente masculino no cinema –reflexo do posicionamento social quanto ao tópico –, aqui ganha uma pegada feminina, embora a realizadora não se aprofunde na observação dessa bem-vinda inversão. A rotina caseira rapidamente entedia Alice, não porque as questões filiais e maritais a desinteressem de todo, mas porque a satisfação profissional é parte do seu prazer, cujo equilíbrio é a busca essencial de todo o longa-metragem. Em De Pernas pro Ar 3 também a desgastada rivalidade feminina alimenta durante um bom tempo as tensões dispostas consecutivamente. Leona (Samya Pascotto) é subestimada pela empresária renomada quando lhe apresenta uma novidade eletrônica voltada igualmente ao prazer das mulheres, passando a ser vista como ameaça ao engatar o namoro com Paulinho (Eduardo Melo), filho dessa empreendedora gradativamente mais afetada pela distância da labuta. O ciúme materno é misturado com a inveja do êxito alheio, trazendo à tona uma face menos cordata da famosa.

De Pernas pro Ar 3 passa por vários assuntos relevantes, burilando-os sem tanto esmero, instilando graça ocasionalmente, porém felizmente não levando a comédia às raias do pastelão. Júlia Rezende aproveita deixas para falar de feminilidade atual, fazendo de Leona mais que um contraponto jovial e cheio de energia de Alice, uma vez estabelecida como sua óbvia projeção de outrora. Narciso desaprova o que vê no espelho. Não à toa, lá pelas tantas, Pedrinho passa a ter as mesmas queixas do pai, principalmente ligadas à obsessão das empresária por sua ocupação profissional, o que gera a tendência a uma negligência sentimental. Embora não investigue as instâncias acessadas com consistência ou privilégio às nuances, que haja uma fórmula regulando tudo, o filme alia bom humor e perspicácia para construir um painel satisfatório da mulher atual, ainda que passe longe de colocar a diversidade nesse molho. Estamos no âmbito das endinheiradas ou das prestes a ficarem ricas, ou seja, onde dificuldades financeiras não fazem parte de uma equação, no entanto, bem resolvida.

A ótima montagem paralela das conversas entre Alice/João Luiz e Leona/Pedrinho escancara a correlação. Nesse emaranhado de assuntos, o prazer fica ligeiramente relegado ao segundo plano. A despeito da discussão em torno de "consolos” e parceiros inanimados, o que verdadeiramente importa em De Pernas pro Ar 3 é o trajeto. Alice passa a entender que não precisa abdicar de um amor para cultivar outro, mas que a realização (idealizada) está no encontro do meio termo. Este leva em consideração não apenas as necessidades individuais, mas tampouco as diminui como algo vital. No que tange às piadas, as que funcionam bem são as óbvias, as de pessoas se divertindo a beça com a realidade virtual que simula a efetivação dos fetiches. No mais, a fragilidade da “jogada” que visa manter a Sexy Delícia no topo, débil por conta da novidade requentada, além da óbvia inclinação ao final feliz não desgastam o conjunto ao ponto de torna-lo irrelevante.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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