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Sinopse

Em Deadpool & Wolverine, após descobrir que todos os seus amigos e sua própria realidade corre perigo de desaparecer, Deadpool decide ir atrás daquele que pode ser o único capaz de reverter essa situação: Wolverine. Formando uma aliança improvável, os dois precisarão lutar contra um inimigo em comum.

Crítica

Antes de mais nada, um pouco de bastidores. No final dos anos 1990, a editora de histórias em quadrinhos Marvel andava tão mal das pernas que se viu obrigada, para não fechar as portas, a vender (ou alugar por um período determinado) os direitos audiovisuais de alguns dos seus mais populares personagens para grandes estúdios de Hollywood. Como resultado, o público se deparou nos anos seguintes com o Hulk (2003) da Universal e o Homem-Aranha (2002) da Sony, por exemplo. Mas foi a Fox que fez a festa neste sentido, comandando adaptações como Blade: O Caçador de Vampiros (1998), Quarteto Fantástico (2005) e X-Men (2000). Entre estes últimos, os mutantes alunos do professor Xavier, estava um tagarela desbocado chamado Deadpool. Uma década depois, porém, a situação da Marvel havia se invertido a tal ponto que lhe foi possível se firmar como um player na meca do cinema mundial, a partir de Homem de Ferro (2008). Mas como recuperar estes personagens que haviam aberto a mão anos antes? Foi preciso tempo e paciência e, aos poucos, um a um acabou voltando a casa. E quando se cansaram de esperar, a Disney, que há pouco havia adquirido a Marvel, foi lá e fez o que melhor sabe fazer: se apropriou do talento dos outros, comprando a Fox – e tudo que estava sob o guarda-chuva desta. Como os X-Men. E Deadpool. É por isso que Deadpool & Wolverine é, mais do que uma introdução destes personagens ao Universo Cinematográfico Marvel: na realidade trata-se de uma carta de adeus ao legado da 20th Century Fox. Uma brincadeira barulhenta e exagerada, com momentos divertidíssimos, mas outros nem tanto.

É importante estar situado quanto a essas idas e vindas ocorridas na virada do século para entender a avalanche de referências e participações especiais que pipocam a todo instante na tela do longa dirigido por Shawn Levy, trazido para o universo dos super-heróis após duas bem-sucedidas parcerias com Ryan Reynolds: Free Guy: Assumindo o Controle (2021) e O Projeto Adam (2022). Sua função por aqui é simples: proporcionar os cenários mais mirabolantes possíveis para que o mercenário de boca suja interpretado por Reynolds em Deadpool (2016) e em Deadpool 2 (2018) siga exercendo sua veia histriônica e imprevisível, agora tendo ao seu lado o antagonista perfeito, aquele com quem vem flertando desde sua primeira aparição nas telas: Wolverine. Porém, se este havia sido dado como morto em Logan (2017) – e com a confirmação de ninguém menos do que Hugh Jackman, que declarou na época ter se aposentado do personagem – a máxima que afirma que, ao menos em Hollywood, o “para sempre” dura apenas até o próximo tilintar das bilheterias mais uma vez se comprovou, e eis que sua decisão foi revertida e a dupla, enfim, confirmada. E o que entregam é exatamente o que se poderia esperar.

Esse resultado, que combina selvageria descontrolada com altas doses de ironia e sarcasmo (de um) com mau-humor e falta de paciência (do outro), se ocupa basicamente em trilhar por terreno conhecido, ousando apenas dentro da medida do esperado. O argumento, como geralmente acontece nas produções do gênero, é pífio: a partir de um conceito de linhas temporais paralelas que vem sendo explorado na série Loki (2021-2023), Deadpool descobre que a sua realidade está prestes a ser exterminada, e todos aqueles que conhece – e ama – irão desaparecer. E tudo isso por qual motivo? Devido à morte daquele que é considerado um “âncora” desse universo, Wolverine. Portanto, é como somar um mais um: basta substituir o morto por uma das suas versões alternativas e tudo voltará ao seu devido lugar. Nesse meio tempo, porém, a dupla acabará relegada a um lugar perdido de tudo e todos, chamado o “Vazio”. A desculpa perfeita para recuperar todos aqueles que um dia já foram importantes, mas que acabaram descartados com o passar dos anos.

Apesar das idas e vindas narrativas, entre tempos e espaços distintos, é estarrecedor o quão linear e didático um filme como Deadpool & Wolverine consegue ser. Não há absolutamente nada profundo ou intrincado no que propõe, jogando em casa apenas para os confirmados. Reynolds, que passa a maior parte do tempo escondido por detrás de uma máscara, é hábil na comédia física, abusando das expressões corporais – muitas potencializadas por efeitos digitais – e nos diálogos rápidos, incorporando o cinéfilo mais radical (ou, neste caso, o fã raiz das hq’s), reagindo tal qual esse se comportaria diante de cada revelação, aparição ou flerte com este público, como o uso de um uniforme original, de uma máscara específica ou a demonstração de um poder em particular. Mas o que cada uma destas inserções tem a propor ao conjunto? Pouco – para não dizer nada. Figuras que poderiam ser melhor exploradas, como a vilã Cassandra Nova (Emma Corrin, confirmando em vislumbres um potencial que justificaria uma atenção demorada), servem apenas para tornar os dois protagonistas mais próximos. Tudo aqui existe em função da dupla. Já o resto, sem exceção, está a serviço deles – para o (pouco) bem e (muito) mal que isso possa significar.

Há, no entanto, que se flexibilizar essa régua de exigências. Afinal, este é o terceiro de uma trilogia (no caso de Reynolds) e nada menos do que a décima vez (entre projetos oficiais e cameos não creditados) que Jackman usa as garras afiadas que lhe fizeram famoso. Portanto, frente a esse contexto, é de se imaginar que o propósito almejado – ser um fan service de qualidade, que proporciona aquilo que há muito era esperado, ao mesmo tempo em que prepara caminho para novas possibilidades – se cumpre dentro dos limites. Deadpool & Wolverine entretém enquanto se desenrola, e quanto menos se souber a respeito, melhor será a experiência daquele que por aqui decidir se aventurar. Mas que não se espere por algo revolucionário: a ordem do dia é justamente o contrário. E tal como uma prece (Madonna, ok?) que se encarrega de atender aos pedidos dos seus devotos mais fiéis, a Marvel também está preocupada em não apenas honrar os tropeços do passado – pois, afinal, mesmo deles foi possível se aprender algo – como ainda abrir portas prestes a serem exploradas em um futuro próximo. Num negócio tão milionário quanto esse, galinha que segue pondo ovos de ouro nunca será abandonada. E essa, enfim, é a maior das verdades.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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