Crítica
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Crítica
Diversidade é fundamental para a saúde de qualquer cinematografia. Há quem diga que no Brasil são produzidos apenas dois tipos de obra: comédias de forte apelo popular ou os chamados “filmes-cabeça”. Essa simplificação tola é um dos tantos estereótipos que recaem sobre a nossa rica atividade audiovisual. Dito isso, Depois do Universo é uma tentativa de pegar carona num lucrativo filão do recente cinema adolescente norte-americano: o dos jovens amantes lindos que precisam lidar com algo potencialmente trágico. Nos últimos anos, assistimos a várias histórias de garotos e garotas enfrentando condições críticas de saúde ou portando doenças terminais. A situação é propícia para injetar carga dramática em relações transformadoras ameaçados pelos mistérios de um universo aleatório, talvez pelas linhas tortas das divindades imaginadas ou, simplesmente, como é o caso aqui, por aquilo escrito nas estrelas. Portanto, de um lado, é bem-vinda essa tentativa brasileira de contemplar um público (o adolescente) que consome ao ponto de ser tratado como fatia prioritária da audiência por Hollywood. Mas, do outro, é perceptível a adesão praticamente irrestrita aos códigos simplistas de um cinema (o estadunidense) considerado por muitos uma espécie de colonizador cultural. O cineasta Diego Freitas conta a história nos moldes norte-americanos e com senso estratégico de apelo global.
Antes de observarmos os aspectos da trama propriamente dita, é preciso alongar-se um pouco nessa leitura conjectural. Sim, pois Depois do Universo não apenas repete os códigos do cinema que evidentemente utiliza como referência, como também se encaixa competentemente num tipo de demanda exponenciada ultimamente pela Netflix (não à toa, a sua casa). A gigante do streaming tem apostado pesado nessas dramédias agridoces protagonizadas por gente linda, nas quais o sexo praticamente inexiste por conta do protagonismo da idealização excessiva do amor romântico. Desse modo, o filme de Diego Freitas se equipara, em estratégia narrativa, a exemplares de muito sucesso, tais como A Barraca do Beijo (2018). A protagonista da produção brasileira (com cara e jeitão de by Netflix) é Nina (Giulia Be), artista que mora com o avô e sonha em ser pianista clássica profissional. Ela enfrenta as barreiras impostas pela lúpus, uma doença autoimune que compromete seus rins. Pessimista, Nina encontra esperança na figura luminosa de Gabriel (Henrique Zaga), residente de medicina caracterizado pelo trato humanista com os pacientes que faz questão de animá-la durante as longas sessões de hemodiálise. Antes desse encontro definidor acontecer, eles tinham se topado numa circunstância qualquer, um tanto absurda por envolver pianos na estação de trem e ciclistas descontrolados. A mensagem é clara.
E essa mensagem é: o amor está fadado a acontecer, pois é obra do destino que Gabriel cruze o caminho de Nina para transformá-lo. O desenvolvimento desse elo afetivo é bastante previsível, tanto que comentá-lo aqui não significa prejuízo a quem ainda não assistiu ao filme. Desde o começo fica evidente que Diego Freitas tem grande apreço por fórmulas e convenções. Como convém aos romances açucarados, Gabriel é o protótipo do cavalheiro romântico que funciona como uma escora emocional constante à fragilizada Nina. Eles se aproximam, sentem afinidade mútua, começam a passar tempo juntos, entendem-se apaixonados um pelo outro e finalmente se envolvem antes que diversos problemas surjam no horizonte para impedir (será?) o final feliz. Diego conduz essa história com segurança, ao menos demonstrando domínio dos lugares-comuns desse tipo de produção ao reproduzi-los competentemente sem ferir as suscetibilidades de seu cânone. Mas, sem ao menos um importante ímpeto de transgressão. É o tipo de filme que já vimos inúmeras vezes, mas poucas delas com personagens falando o nosso português. Do ponto de vista meramente industrial, pode-se louvar a mimese de elementos e abordagens que nos colocariam dentro de uma tendência comercial altamente lucrativa. Mas, não seria isso uma manifestação de conformidade diante das imposições de valores e padrões dominantes?
Depois do Universo apresenta uma estética de conto de fadas, vide a paleta repleta de cores agradáveis, alusões aos astros confabulando para o amor vencer a dor e dois protagonistas que parecem versões contemporâneas de Romeu e Julieta – mas passados pelos filtros contumazes dessas produções Netflix recentes para consumo global. Giulia Be e Henrique Zaga se saem bem dentro dos papeis e da pegada que lhe são propostos. Eles têm carisma e funcionam como casal teen pelo qual somos levados a torcer. Além disso, contam com o luxo de um elenco de apoio com Othon Bastos, Rita Assemany e João Miguel – embora este esteja claramente deslocado como o protótipo de vilão que amolece diante das belezas do amor juvenil. No fim das contas, a essência do filme é uma variação do tema “donzela em perigo”, com Nina sendo a mulher que somente encontra felicidade ao ganhar suporte do rapaz com pinta de provedor perfeito – um discurso anacrônico, portanto. As crises entre os pombinhos belíssimos são sempre motivadas por elementos/influências externos, quando muito engatilhadas por incertezas próprias da “inocência” dos jovens descobrindo o amor e a dor ao mesmo tempo. Nesse conto de fadas, os protagonistas não possuem defeitos e contradições. A idealização romântica é mesmo o tom principal dessa produção aferrada às convenções, vide a existência do “amigo gay”, figura clichê nas comédias românticas como suporte feminino, aqui somente deslocado ao polo masculino, sem com isso gerar rupturas ou algo que diminua a sensação de “mais do mesmo” envernizado.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 4 |
Cecilia Barroso | 2 |
Robledo Milani | 3 |
MÉDIA | 3 |
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