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Crítica
A Saga 365 Dias é um fenômeno de popularidade. Sustentados por um superficial discurso erótico, seus filmes apresentam fiapos de trama para preencher timidamente as lacunas entre cenas de sexo tórridas que mais parecem exercícios de malabarismo de corpos considerados ideais. Além disso, a ambientação no universo da máfia permite a criadores associarem excitação e perigo, além de reforçarem estereótipos ao enxergar como estimulante o restrito universo endinheirado. Pode-se dizer que as narrativas se aproximam de uma ideia de conto de fadas, pois nelas os conflitos servem apenas como pequenos obstáculos em meio à celebração de pessoas milionárias com bens materiais em abundância, donas de índices de gordura ínfimos e que fazem do ato sexual uma demonstração de pretensa perfeição. Desejo Proibido é dirigido por Tomasz Mandes, um dos comandantes das produções da Saga 365 Dias, e estrelado por Simone Susinna, o italiano bonitão que revira a cabeça da protagonista feminina dessas obras que esquentaram audiências mundo afora. E, verdade seja dita, desta vez o realizador até tenta estender o conteúdo e a importância dos dilemas emocionais/psicológicos que afetam os personagens de uma ciranda amorosa. Não que o resultado seja bom, mas ao menos ele busca não rechear as tomadas com a demonstração de que todos estão sempre dispostos a transar.
A protagonista de Desejo Proibido é Olga (Magdalena Boczarska), a típica personagem compreendida como “fechada para balanço” em termos amorosos, mas atravessada por uma daquelas paixões avassaladoras. Promotora de justiça, ela é cortejada por Max (Susinna), bonitão que lhe oferece café a fim de se aproximar. Adiante, ela se depara com esse sujeito apolíneo no fórum, testemunhando a favor de um homem acusado de algo (nunca sabemos o motivo do processo). O que uma pessoa minimamente sensata faria? Desconfiaria de que uma coisa tem a ver com a outra e armaria um circuito interno de defesa – ainda mais alguém tão cartesiano como Olga. Mas, o roteiro a cargo de Tomasz Mandes e Mojca Tirs simplesmente passa por cima da lógica com um objetivo: mostrar que Max é tão bonito e irresistível, ao ponto de Olga não conseguir erguer as suas barreiras contra o amor. Os dois acabam se aproximando, trocando mensagens frequentes e engatando um relacionamento quente, inicialmente marcado por sequências de sexo tão cosméticas e “limpinhas”, que soam como comerciais de camisinha ou de lingerie, aliás, bem ao gosto dos exemplares da Saga 365 Dias. O cineasta parece não conseguir conceber uma sequência erótica sem que ela lembre uma peça publicitária, vide o jogo de luz cafona milimetricamente pensado e uma música genérica embalando a coreografia.
Ao longo da trama, surgem contratempos que fariam salivar os adeptos do melodrama. Material bom, não fosse a manutenção do teor erótico desprovido de tesão em Desejo Proibido. O primeiro desses componentes melodramáticos é a diferença de idade entre os pombinhos (ela é 15 anos mais velha); depois, o fato de ela trabalhar no caso em que ele figura como uma testemunha-chave; mais adiante, a tensão ocasionada pelo ressurgimento de Maya (Katarzyna Sawczuk), filha amargurada de Olga com quem Max teve recentemente um breve caso. Nas mãos de um cineasta com intenções de trabalhar adequadamente esses nós e essas condições, o conjunto de problemas poderia ser encarado como motivador de muitas trovoadas. O que um Douglas Sirk, um Rainer Werner Fassbinder e mesmo um Pedro Almodóvar não fariam com um material desses, inclusive do ponto de vista estético...No entanto, além de estar anos-luz de distância dos colegas citados em matéria de talento, Tomasz Mandes está estritamente interessado nessas circunstâncias e sentimentos à flor da pele como pilares para sustentar o conto de fadas em que um bonitão atlético cai perdidamente de amores por uma mulher mais velha. Os dilemas profissionais de Olga nunca têm importância, a dúvida de Max é destroçada pelo amor que ele expressa com as suas caras e bocas, e a oposição de Maya é uma membrana.
Não há substância nas motivações dos personagens de Desejo Proibido. Todos são basicamente cascas, reproduções de arquétipos sem personalidade própria: a desgostosa com a vida, que reaprende a amar; o rapaz que precisa brigar por sua felicidade; a jovem megera que no fundo ataca por ser uma espécie de animal ferido; o melhor amigo que parece um anjo de tanta bondade e disponibilidade; a mãe/avó que ensaia ser uma figura autoritária; e o parceiro de viagem (obcecado pela possibilidade de vir ao Brasil) que se torna vingativo ao ser contrariado. Aliás, sobre Kamil (Sebastian Fabijanski), esse colega de Max, o roteiro não tem coragem de desenvolver, nem que seja alguns passos a mais, a sua possível paixão homossexual. Tudo fica num nível covarde subentendido, “passível de interpretações”, não por atenção à complexidade humana, mas por receio de precisar elaborar melhor essa questão. Nos 120 minutos desse longa-metragem polonês, a seriedade supostamente presente em toda a ciranda de amores e desamores sucumbe diante de uma estética que a anula, vide as refrações na imagem, a trilha sonora atenuante, as coreografias sexuais capturadas em câmera lenta e a pouca disposição de ir além da superfície. Em comparação aos exemplares da Saga 365 Dias ao menos aqui não temos um esgotamento sexual (que anula o tesão). Há a tentativa de “contar uma história”, ainda que certos vícios estilísticos e de discurso permaneçam, como a valorização de um mundo burguês.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Marcelo Müller | 3 |
Francisco Carbone | 2 |
Alysson Oliveira | 1 |
MÉDIA | 2 |
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